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Hizbollah toma parte ocidental de Beirute
Milícias xiitas controlam 11 bairros na capital, empurrando o país para beira de conflito civil
Pelo menos 19 morrem em confrontos que ameaçam contaminar região instável; governo está enfraquecido,
e Exército continua neutro
TARIQ SALEH
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE BEIRUTE
Milícias da oposição libanesa, liderada pelo grupo radical
xiita Hizbollah e apoiada pelo
Irã e pela Síria, tomaram ontem o lado oeste de Beirute,
empurrando o país para a beira
de um conflito civil no terceiro
dia de confrontos entre grupos
armados pró e antigoverno.
A capital e outras cidades
continuam tomadas por combates que já deixaram, até a
noite de ontem, ao menos 19
mortos e 30 feridos. As milícias
avançam para o porto, protegido pelo Exército.
A deterioração da situação
interna do Líbano ameaça desequilibrar o delicado balanço
de forças na região e envolver
em um conflito países vizinhos.
"O Oriente Médio ficará mais
perigoso com um Líbano em
guerra civil, isso é certeza", disse à Folha a socióloga e especialista em Ciência Política por
Harvard Sophie Saade. "Os
efeitos serão sentidos sobretudo na Síria e em Israel."
Damasco ocupou militarmente o Líbano até 2005, apóia
o Hizbollah e está intimamente
ligada à política libanesa. Já Israel, que travou guerra com o
grupo xiita por 33 dias em
2006, dificilmente ficaria de
braços cruzados ante o fortalecimento e avanço das milícias
para perto de sua fronteira.
Já são produto de uma batalha de duas agendas distintas
na região -uma americana-israelense, outra sírio-iraniana,
que aos poucos parece estar se
impondo- o conflito atual e o
enfraquecimento do governo
pró-Ocidente do premiê Fuad
Siniora, explica Saade.
Na capital libanesa, a oposição venceu batalhas e rapidamente controlou 11 bairros,
quase todo o lado muçulmano
no oeste de Beirute. As milícias
logo ergueram postos de checagem em ruas que levam à sede
do governo, que continua sob
proteção do Exército.
"A vitória rápida da oposição
nas ruas confirmou a fraqueza
do governo de Siniora e seus
aliados", avalia Saade, "dando
mais munição para o avanço do
Hizbollah e seus aliados".
Sitiado pelos milicianos em
sua casa, o líder sunita governista Saad Hariri - filho do ex-premiê Rafik Hariri, cujo assassinato, em 2005, foi a gênese da atual crise- pediu a volta
das negociações. O Hizbollah
rejeitou a proposta.
Tensão
O governo havia anunciado
segunda-feira que investigaria
uma rede de comunicações privada do Hizbollah que, alega,
viola a soberania do Estado libanês. A medida provocou a ira
do grupo, que salientou que a
rede era parte de sua estrutura
militar e que elementos do governo trabalhavam como "espiões para EUA e Israel".
Quarta-feira, sindicatos pró-oposição realizaram uma greve
geral por aumento de salários.
Os protestos logo se tornaram
confrontos violentos, colocando militantes pró e antigoverno
em batalhas nas ruas da capital.
A oposição exige a renúncia de
Siniora, apoiado pelos EUA e
outros países ocidentais.
A oposição fechou a TV Futuro, o jornal "Al Mustaqbal" e a
rádio Al Sharq, ligados a Hariri,
quando militantes atacaram os
prédios das empresas com fuzis
e lança-granadas. Uma fumaça
preta podia ser vista do prédio
do jornal em chamas.
O Exército libanês adotou a
neutralidade, garantindo apenas a segurança de civis e prédios governamentais. Na manhã de ontem, o governo estudava a possibilidade de declarar
estado de emergência, rapidamente rejeitada pelo comando
do Exército, pois obrigaria a
instituição a interceder no conflito -o que poderia levar à sua
desintegração devido a lealdades sectárias dos soldados.
O governo acusa o Hizbollah
e seus aliados de tentativa de
golpe de Estado, e o movimento
14 de Março, que forma a base
governista, declarou que continua apoiando o premiê Siniora.
Beirute permanece sob alta
tensão, e grande grande das
ruas está vazia. Muitos moradores de áreas turbulentas já
deixaram a capital.
Outros combates ganharam
força em Trípoli (norte), em
Aley e Khalde (cercanias da capital) e em cidades no vale do
Bekaa (leste). Nas montanhas
de Chouf, nos arredores de Beirute, as milícias drusas, do líder
Walid Jumblatt, entraram, pela
primeira vez, em confrontos
com milicianos do Hizbollah.
Algumas estradas foram reabertas no interior, mas a rodovia que leva à fronteira com a
Síria continua fechada, assim
como o aeroporto de Beirute.
O Líbano vive uma crise política há mais de um ano e está
sem presidente desde novembro, quando o pró-Síria Emile
Lahoud deixou o cargo. Desde
então, governistas e oposição
não chegam a um acordo para
eleger seu substituto.
Para analistas, sem que aliados árabes, como Egito e Arábia
Saudita, exerçam influência na
solução da crise, o governo caminha para o colapso.
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