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Vencida a violência, pobreza mina o Haiti
Às vésperas do quinto aniversário de sua intervenção, ONU começa a planejar a retirada de suas tropas a partir de 2011
"Resolvemos a segurança e no dia seguinte os haitianos nos perguntaram: E agora? Como isso vai afetar minha família?", narra brasileiro
LUIS KAWAGUTI
EM PORTO PRÍNCIPE
Facções rebeldes controladas, índices de criminalidade
inferiores aos de cidades como
Rio e São Paulo, desemprego e
escassez de ajuda financeira internacional. Esse é o retrato do
Haiti quase cinco anos após a
chegada de militares a serviço
da ONU, que hoje estudam a retirada a partir de 2011.
A Folha esteve no Haiti e
constatou que as gangues chimères foram desbaratadas, e os
combates entre militares brasileiros das Nações Unidas e rebeldes -que ocorriam a cada
três dias em meados de 2005-
são parte do passado do país.
De acordo com a Minustah
(Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti), a
taxa de homicídios no país em
2008 foi de 5,09 para cada 100
mil habitantes. A taxa de São
Paulo referente ao mesmo ano
foi de 10,7 casos, e a do Rio, 35.
Para a Organização Mundial
da Saúde, a partir de 10 casos
por 100 mil habitantes, há "nível epidêmico de assassinatos".
Mais de 70% dos 2.848 crimes reportados à Minustah e à
PNH (Polícia Nacional do Haiti) no ano passado tiveram motivação patrimonial. As extorsões mediante sequestro, por
exemplo, que atingiram 160 casos só no mês de dezembro de
2005 -no auge dos confrontos- caíram para dez no mesmo período de 2008.
A ONU admite que há subnotificação de crimes, mas diz que
a violência já não tem a motivação política do período posterior à queda do ex-presidente
Jean Bertrand Aristide.
Mas, apesar da paz atual,
parte dos rebeldes continua
solta, e o armamento apreendido foi irrisório -o que indica
que armas ainda podem estar
escondidas.
"Temos de manter um patrulhamento forte e um bom sistema de inteligência para que os
[rebeldes] remanescentes não
tentem se reorganizar", diz o
general brasileiro Alberto dos
Santos Cruz, ex-comandante
das forças de paz.
Hora da virada
Com mais de 20 anos de carreira na ONU, o também brasileiro Luiz Carlos da Costa ocupa hoje o segundo mais importante cargo civil da Minustah
(representante adjunto do secretário-geral Ban Ki-moon).
Ele aponta que o Haiti vive
hoje um período decisivo, no
qual a capacidade de geração de
empregos será decisiva para
determinar a salvação do país
ou o fracasso da missão.
"Nós resolvemos o problema
da segurança e no dia seguinte
os haitianos nos perguntaram:
E agora? Como isso vai mudar o
dia a dia da minha família?"
A taxa de desemprego ultrapassa 60%, e metade da população tem menos de 18 anos de
idade. Além disso, uma crise de
alimentos e furacões causaram
prejuízos de US$ 1 bilhão.
Para tirar o país desse caos, o
governo haitiano elaborou um
plano de resgate de saúde, educação e infraestrutura ao custo
de US$ 900 milhões em ajuda
financeira internacional no período de dois anos. Os 20 países
doadores, porém, devem enviar
apenas US$ 324 milhões.
A esperança de gerar empregos recai agora sobre uma iniciativa norte-americana de
abolir pelos próximos nove
anos as taxas sobre todos os
produtos têxteis do Haiti que
entrarem nos Estados Unidos.
Plano de retirada
Nesse contexto, segundo
Costa, a ONU quer iniciar uma
retirada gradual dos 7.000 militares (1.200 deles brasileiros)
do país a partir do fim de 2011.
A expectativa é que, até lá, o
efetivo da polícia nacional cresça de 9.200 para 14 mil homens
-a quantidade mínima para
substituir as tropas internacionais. "Pelo menos 15% das funções de segurança do país já estão sendo desempenhadas hoje
pela polícia haitiana", diz.
O treinamento desse contingente é responsabilidade de
2.000 policiais da ONU, que já
cortaram cerca de mil integrantes corruptos dos quadros
iniciais da PNH.
O armamento e os equipamentos da polícia são doações
provenientes dos Estados Unidos e do Canadá.
Até 2011, os capacetes azuis
ainda farão a segurança das
próximas eleições presidenciais (novembro de 2010) e permanecerão no país por mais 12
meses, para garantir que o presidente eleito fique no poder.
"A partir de 2011 haverá uma
presença das Nações Unidas no
Haiti, mas com uma mudança
de perfil. Haverá uma redução
no número de tropas e talvez
seja mantido o número de policiais [da ONU]", diz Costa.
A retirada gradual, que não
tem prazo final, dependerá de
decisões conjuntas do governo
haitiano e do Conselho de Segurança da ONU. E ela só será
possível se a situação econômica do país melhorar.
Sheila Laplage, a porta-voz
da premiê Michele Pierre-Louis, disse à Folha que, por
enquanto, o governo do Haiti
não se manifestará sobre os
planos de retirada de tropas.
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