São Paulo, sexta-feira, 10 de julho de 2009

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Obama quer que Brasil dê exemplo ao Irã

Americano diz a Lula que país pode usar fato de ter veto constitucional a bomba nuclear para pressionar Teerã a fazer o mesmo

Presidentes reiteram, em encontro na Itália, rechaço a golpe em Honduras e criam grupos de trabalho para reforçar parceria entre países

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A ÁQUILA (ITÁLIA)


O presidente Barack Obama sugeriu ontem a seu colega Luiz Inácio Lula da Silva que use o exemplo do Brasil, que até constitucionalmente declinou do uso militar da energia nuclear, para pressionar o Irã a fazer o mesmo.
Além do exemplo, Obama mencionou também que, "por causa da força e profundidade das relações comerciais [Brasil/Irã], o Brasil pode ter um impacto ao reiterar que o governo iraniano tem responsabilidades com a comunidade internacional no que se refere ao programa nuclear", conforme o relato da conversa entre os dois presidentes feito depois por Robert Gibbs, porta-voz da Casa Branca.
As sugestões de Obama são vistas pela delegação brasileira como uma clara indicação de que o presidente americano considera o Brasil um parceiro estratégico não apenas para assuntos regionais mas na cena internacional.
É verdade, a julgar pelo que diz Gibbs: primeiro, lembra que quem pediu o encontro de ontem foi Obama. Depois diz que os dois conversaram "cinco ou seis vezes" pelo telefone desde a posse de Obama, em janeiro, além dos encontros ao vivo.
Por fim, afirmou: "Obviamente, o presidente acredita que o Brasil pode ser um parceiro estratégico íntimo dos EUA em muitos temas [da agenda internacional]".
Pelo menos na versão de Marco Aurélio Garcia, assessor internacional de Lula, o tema da eleição iraniana não foi levantado durante o encontro, de cerca de meia hora. Nesse ponto, há diferença importante de enfoque não apenas entre Lula e Obama mas também entre Lula e líderes europeus, como o francês Nicolas Sarkozy e o britânico Gordon Brown.
Ambos os dirigentes europeus expressaram reservas em relação ao processo eleitoral iraniano, enquanto Lula o avalizou sem pensar duas vezes.
De todo modo, os EUA estão muito mais interessados em conseguir conter a suposta (ou real) ambição iraniana de ter a bomba atômica do que na eleição propriamente dita, porque sabem que o poder de fato não é do presidente Mahmoud Ahmadinejad, mas do líder supremo, Ali Khamenei.
Nesse ponto, não houve divergência, pois Lula reafirmou "a condenação de uma política nuclear para fins militares", na versão transmitida aos jornalistas por Marco Aurélio.

Honduras
Houve idêntica concordância em relação a Honduras, o que, aliás, é óbvio: ambos os países já haviam condenado o golpe que depôs o presidente Manuel Zelaya e já haviam atuado coordenadamente na Organização dos Estados Americanos, para suspender Honduras. No encontro de ontem, aliás, reafirmaram o papel central da OEA na crise.
Lula fez questão de elogiar o papel desempenhado pelos EUA no caso. "Pela primeira vez, todos os países americanos estiveram coordenados na condenação a um golpe", segundo o relato de Marco Aurélio.
Mais não avançaram porque, quando conversaram, nem havia amanhecido na Costa Rica, onde ocorreriam negociações entre o presidente deposto e os golpistas, mediadas pelo presidente costa-riquenho, Óscar Arias. De todo modo, para Brasil e EUA, o único caminho para resolver o conflito é a restituição do cargo a Zelaya.
Os dois presidentes, para reforçar a "parceria estratégica" mencionada pelo porta-voz Gibbs, decidiram criar grupos de trabalho setoriais para discutir um amplo leque de temas, desde relações internacionais a meio ambiente. Na verdade, é o relançamento de programa semelhante criado logo no início do governo Lula, quando George W. Bush era o presidente.
Houve algumas reuniões, inclusive de coordenação macroeconômica, mas os grupos foram murchando à medida que o governo americano se concentrava exclusivamente no que o presidente de então chamava de "guerra ao terror".
Mas os EUA não são os únicos parceiros com o qual o Brasil quer aprofundar mecanismos de coordenação. Outro é o G5 (México, África do Sul, China e Índia, além do próprio Brasil). Até agora, o G5 só se reúne na véspera do encontro anual do G8. Agora, haverá reuniões periódicas, ministeriais e de cúpula. A primeira será antes da cúpula do G20 em setembro.
Pela promessa de Nicolas Sarkozy a Lula, em encontro em Paris, na terça, o G5 passará a ter tratamento igual ao do G8 quando a França assumir a presidência do grupo em 2011. Hoje, o G5 é tratado como de segunda classe, na avaliação do chanceler Celso Amorim.


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