São Paulo, domingo, 10 de agosto de 2008

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ARTIGO

Ante derrota, Kremlin limita ação

MARY DEJEVSKY
DO "INDEPENDENT"

A eclosão de hostilidades entre Rússia e Geórgia na minúscula região da Ossétia do Sul parece ter surgido do nada. Mas a perspectiva de uma guerra entre os dois é temida há anos.
A Revolução Rosa, que levou Mikhail Saakashvili ao poder na Geórgia em 2003, reabriu o tema da integridade territorial. Temendo que a Geórgia tentasse se impor à força, a Ossétia do Sul e a Abkházia declararam independência unilateralmente.
Sem reconhecimento externo, os separatistas se voltaram para a Rússia em busca de apoio moral, que veio na forma de "soldados de manutenção da paz" na região. Seu propósito declarado era proteger russos étnicos, muitos dos quais têm cidadania russa, ante o temor de assimilação pela Geórgia.
Esses encraves têm sido fonte de irritação perpétua para o governo georgiano. Mas o mesmo pode ser dito da posição pró-Ocidente flagrante de Tbilisi ante a Rússia, que o acusa de proteger separatistas tchetchenos. Os últimos meses testemunharam uma escalada retórica, juntamente com escaramuças esporádicas envolvendo mísseis e vôos não autorizados.
Seria fácil interpretar o conflito que eclodiu anteontem como obra da Rússia grande e má, ressentida da independência da Geórgia e de sua crescente aproximação do Ocidente.
Mas o que é certo e o que é errado se confunde, em muito porque a Rússia reconhece a Geórgia como Estado independente, com direito à integridade territorial. Tampouco há dúvida de que o confronto tenha sido deflagrado pela Geórgia, cujas forças entraram na Ossétia do Sul para reintegrá-la.
O momento, para o propósito da Geórgia, era perfeito. A atenção do mundo estava voltada para a Olimpíada de Pequim, onde o atual premiê e ex-presidente russo Vladimir Putin, que detém o poder de fato, era convidado de honra. Seu sucessor, Dmitri Medvedev, estava no comando, mas sua autoridade ainda não havia sido testada.
Se a Geórgia esperava uma vitória rápida e precisa para recuperar o que vê como território perdido, pode ter errado feio. As circunstâncias que tornavam o momento propício também o faziam arriscado.
Muitos russos vêem na Geórgia, com seu Exército equipado e treinado pelos EUA, nada além de um procurador da intenção americana de assegurar rotas energéticas. Eles não estão dispostos a ver seu país humilhado por "esnobes do sul".
Entre eles, Medvedev e Putin têm seu trabalho limitado. Espalhar o conflito além da Ossétia do Sul -por exemplo, atacando Tbilisi- arriscaria inflamar as chamas da guerra e perder a vantagem moral que Moscou pode ter. Bater em retirada, entretanto, faria da Ossétia do Sul a mais recente de uma série de perdas amargas.
Moscou não tem conseguido deter os planos dos EUA para instalar um escudo antimísseis em sua fronteira e pôde apenas assistir ao consenso ocidental que trouxe à luz um Kosovo independente, contra a vontade dos irmãos eslavos na Sérvia. Com os russos étnicos na Geórgia sitiados, o Kremlin se vê diante do risco de nova derrota.

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especial sobre a Ossétia do Sul


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