|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Cinco anos depois, EUA estão mais fracos e sós
Guerra no Iraque foi maior razão da perda de influência do país após o 11 de Setembro
NA MANHÃ DE 11 DE SETEMBRO DE 2001, o
mundo assistiu ao maior ataque sofrido pelos
Estados Unidos em seu próprio solo. A ação
terrorista matou ao menos 2.973 pessoas, derrubou os prédios-símbolo da cidade mais rica do país e teve
como autores 19 extremistas armados de bilhetes aéreos só
de ida, estiletes baratos e determinação suicida. Aos cinco
anos do evento, que serão completados amanhã, a Folha ouviu dezenas de analistas, e as conclusões parecem mais diluídas e menos peremptórias que as feitas no calor da tragédia.
Há um consenso, porém: meia década depois, a percepção é a
de que os EUA estão mais fracos. Resume o historiador britânico Eric Hobsbawm: "Politicamente, estão mais fracos. Economicamente, não estão mais fortes. E descobriram que seu
poderio militar é incapaz de resolver todos os problemas".
Marty Lederhandler-11.set.2001/Associated Press
|
|
Vista do Empire State Building com as Torres Gêmeas do WTC exalando fumaça após ataque; pesquisa aponta que um terço dos americanos acredita que Casa Branca esteja "envolvida" nos atentados do 11 de Setembro, que mataram quase 3.000 pessoas
SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON
No dia 12 de setembro de
2001, acadêmicos, personalidades e experts de todas as nacionalidades, escolas e tendências
arriscavam seus primeiros
prognósticos. A "quente", tudo
parecia mais definitivo: era o
começo do século 21. Era o fim
do Império Americano. O início da Guerra Oriente-Ocidente. A falência da aviação comercial como negócio. Houve mesmo quem decretasse, sem ironia, a morte da ironia.
Cinco anos depois, enquanto
Hobsbawm aponta os limites
do poderio norte-americano,
outro historiador, o escocês
Niall Ferguson, de Harvard, especialista na cronologia de impérios, detecta seus "freios".
"Publicamente, os líderes norte-americanos negam que tenham um destino imperial.
Mas os EUA são um império
-jovem, com freios domésticos, mas império". Diferentemente do que ocorreu com impérios anteriores e mais longevos, porém, os "freios" definem
o americano.
Déficit recorde
São três, segundo Ferguson:
escassez de soldados, déficit orçamentário e déficit de atenção
do público. No auge da insurgência no que viria a ser o moderno Iraque, nos anos 1920,
havia um soldado britânico para 24 iraquianos; hoje, há um
soldado norte-americano para
210 iraquianos. Nestes cinco
anos, o país gastou US$ 400 bilhões (ou meio PIB brasileiro)
com a chamada "guerra ao terror", o que ajudou a levar o país
ao maior déficit de sua história
recente. E a opinião pública
moderna tem uma "vida útil"
de cerca de 18 meses: a mesma
maioria que apoiava a intervenção no Iraque em abril de 2003
hoje acha a guerra um desastre.
Outra constante nas respostas: o ataque terrorista colocou
a nu a política externa norte-americana, que vinha sendo
gestada há pelo menos duas décadas e da qual o presidente
George W. Bush se tornou apenas a face mais evidente. Para
Neil MacFarlane, de Oxford, "a
principal mudança é o enfraquecimento das leis internacionais sobre o uso da força".
"Desde que os EUA desenvolveram o conceito de defesa
preventiva, a principal potência do mundo quer o direito de
atacar quem quiser caso se sinta ameaçada", acredita. Ou, como define mais diplomaticamente Rubens Barbosa, que era
embaixador do Brasil em Washington no dia 11 de Setembro,
"no contexto externo, emerge
uma nova agenda mundial,
com conseqüências na área política, diplomática e também
militar".
Joseph Nye, professor de relações internacionais da Universidade Harvard, vê no desequilíbrio dos EUA ao usar seus
recursos a origem de seu enfraquecimento global. "Os EUA
estão mais fracos porque colocaram ênfase demais no chamado "hard power" (poder militar) e reduziram sua atração em
"soft power" (diplomacia e comércio)", diz Nye.
O enfraquecimento do país
não resulta num fortalecimento de seus inimigos, por paradoxal que pareça. Vários analistas apontam a ação de 11 de Setembro como uma estratégia
equivocada da Al Qaeda, grupo
terrorista que seria quase dizimado nos anos seguintes pelas
forças americanas, embora seu
líder, Osama bin Laden, continue vivo, solto e atuante.
"Mas a Al Qaeda se beneficiou ao fazer o mundo perceber
a agressividade da política externa de Bush entre os muçulmanos, especialmente na
Guerra do Iraque, mas também
nas ações de Israel nos territórios palestinos e, mais recentemente, no Líbano", acredita
Juan Cole, professor de história da Universidade de Michigan e criador do blog liberal Informed Comment. "Isso ajudou a recrutar uma nova geração de radicais."
Maior erro
A Guerra do Iraque. Se fossem instados a apontar um
grande equívoco cometido pelos EUA nesse período, a invasão daquele país seria o vencedor inconteste. "É o fato histórico mais importante", decreta
Melani McAlister, da Universidade Georgetown. "O Iraque é
um fracasso público que encoraja os inimigos."
A intervenção no Iraque é
significativa da "fraqueza" norte-americana, diz Maria Regina
Soares de Lima, professora de
relações internacionais da PUC
do Rio. "Na sociedade de massas e da democratização, o custo da conquista estrangeira é
muito alto, não bastam a força e
a tecnologia militar."
Com a "guerra errada" (sendo a "guerra certa" a do Afeganistão, que derrubou o Taleban, que dava guarida à Al Qaeda), os EUA sacaram cedo demais o cheque de solidariedade
global que conseguiram logo
após o 11 de Setembro. "Você
imagina alguém levando flores
às embaixadas americanas em
algum lugar do mundo hoje?",
pergunta Mary Dudziak, organizadora do livro "September
11th in History - a Watershed
Moment?" (11 de Setembro na
história - um divisor de águas?).
Ou, como coloca David Simpson, autor de "9/11 - The Culture of Commemoration" (11/9, a
cultura da comemoração), "os
EUA destruíram a boa vontade
do mundo ao usar o desastre
como pretexto para invadir o
Iraque. Os episódios de tortura
apenas confirmam o fim do papel dos EUA como líder mundial baseado apenas na superioridade moral."
O tamanho do equívoco pode
ser medido em números. Como
resultado dos ataques daquele
dia às torres gêmeas, perderam
a vida 2.973 pessoas de 23 nacionalidades, brasileira inclusive. Até ontem, 2.659 soldados
das Forças Armadas norte-americana haviam morrido em
ação no Iraque. O número de
mortos deve ser igualado até o
fim do ano.
Com a EQUIPE DE MUNDO
Texto Anterior: Iraque sob tutela: Maliki faz primeira visita oficial ao Irã Próximo Texto: EUA perdem poder Índice
|