|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Teste é novo golpe na não-proliferação
Regime internacional de controle dos armamentos nucleares vem dando sinais de fragilidade nos últimos dez anos
EUA criaram programa de modernização de seu arsenal e se negam a ratificar tratado amplo de banimento de testes
QUENTIN PEEL E
DANIEL DOMBEY
DO "FINANCIAL TIMES"
O anúncio feito pela Coréia
do Norte de que detonou uma
explosão nuclear subterrânea
intensificou o receio de que seja iniciada uma nova corrida armamentista no Leste Asiático e
desferiu um golpe potencialmente devastador contra as esperanças de que seja possível
prevenir uma nova rodada de
proliferação nuclear em todo o
planeta.
Está em jogo a sobrevivência
do sistema de controle de armas que há quase 40 anos restringe o número de Estados dotados de armas nucleares, mas
que nos últimos dez anos vem
parecendo mais e mais frágil.
A Agência Internacional de
Energia Atômica (AIEA), guardiã do Tratado de Não-Proliferação Nuclear, disse que o teste
equivale à "quebra de uma moratória global "de facto" sobre os
testes de explosões nucleares,
que vinha sendo observada há
quase uma década".
O teste norte-coreano representa o segundo e mais dramático revés sofrido recentemente pelos esforços internacionais para conter a proliferação,
após a recusa do Irã em suspender seus planos de enriquecimento de combustível nuclear.
Japão e Estados Unidos são
os membros da comunidade internacional a reagir de maneira
mais agressiva ao fato novo. A
reação do Japão pode determinar se a ação norte-coreana vai
ou não precipitar uma corrida
armamentista regional.
Mas, segundo Mark Fitzpatrick, especialista em não-proliferação no Instituto Internacional de Estudos Estragégicos,
em Londres, "o impacto maior
será sobre a não-proliferação
em âmbito mundial, sobre países que querem possuir o prestígio ou o efeito dissuasivo que
acreditam ser proporcionado
pelas armas nucleares".
As ameaças de proliferação
de armas nucleares vêm aumentando rapidamente no
Oriente Médio, e vários países
-incluindo Irã e Líbia- já fizeram negócios nucleares no
mercado negro com Pyongyang. A administração Bush
discorda com veemência da
afirmação de que as ambições
nucleares da Coréia do Norte
foram intensificadas em decorrência da invasão do Iraque em
2003. Mas o Oriente Médio volátil de hoje virou parte de um
mundo em que muitos países
parecem estar buscando a opção de desenvolver a capacidade nuclear armada.
A Turquia e o Egito anunciaram recentemente planos para
construir usinas nucleares.
Apesar dos desmentidos oficiais, a visão que se tem é que
ambos estão mantendo abertas
suas opções nucleares.
"Existe um componente estratégico no programa egípcio
de energia nuclear, como existe
na ampliação da capacidade
nuclear da Turquia", disse Fitzpatrick, que descreveu o fato
como "cerca de proteção nuclear para o caso de o Irã adquirir armas nucleares".
O regime de não-proliferação
teve falhas desde o início: Israel, país nuclearizado de fato
há 30 anos, nunca assinou o
tratado, como tampouco o fizeram a Índia e o Paquistão. Apesar disso, o TNP ajudou -até
agora- a prevenir o que o presidente americano John Kennedy temia quando, em 1963,
falou de "um mundo em que 15,
20 ou 25 nações possam ter essas armas".
Nos últimos dez anos, porém,
as divergências vêm se ampliando: Índia e Paquistão realizaram testes nucleares importantes em 1998, sem sofrerem conseqüências de longo
prazo em termos de sanções. A
própria Coréia do Norte anunciou sua retirada do TNP em
2003. Os EUA criaram programas para estudar a modernização de seu arsenal nuclear. Mohammed El Baradei, diretor-geral da AIEA, culpa as superpotências por não terem agido
mais em prol do desarmamento nos últimos anos.
Ontem, El Baradei reforçou
seu chamado por uma proibição universal e legalmente
obrigatória dos testes nucleares, por meio do Tratado
Abrangente de Proibição de
Testes Nucleares, que os EUA
vêm se negando a ratificar. El
Baradei e Kofi Annan, o secretário-geral da ONU, também
defendem a adoção de um tratado que reduza a quantidade
de material que pode ser empregado para armas nucleares.
Texto Anterior: Perfil: Excentricidade disfarça hábil estrategista Próximo Texto: Com bomba norte-coreana, Irã deve aproveitar desvio de foco Índice
|