São Paulo, segunda-feira, 10 de novembro de 2008

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ARTIGO

Cuba na pauta do novo presidente

NEWTON CARLOS
ESPECIAL PARA A FOLHA

EM ARTIGO no "Washington Post", ainda na campanha eleitoral, Jorge Mas Santos deu apoio a Barack Obama, depois de recebê-lo calorosamente na Cuban American National Foundation, em Miami. A maioria dos hispânicos da Flórida acompanhou-o nas urnas em seu voto no candidato democrata.
O gesto de Santos seria impensável até há pouco tempo.
Ele herdou do pai, Jorge Mas Canosa, morto em 1997, a presidência da entidade. Embora tenha o selo de não partidária, ela sempre funcionou como um "grupo de pressão" anti-regime cubano vinculado estreitamente aos republicanos mais à direita.
Um de seus inspiradores foi Richard Allen, assessor de segurança nacional do governo de Ronald Reagan (1981-1989). Com posições de truculência e intolerância, como se fosse herdeiro dos que tentaram invadir Cuba em 1961, o grupo de Canosa conseguiu inclusive impor-se como um dos formuladores "de fato", por baixo do pano, da agenda cubana do Departamento de Estado norte-americano. O objetivo maior foi sempre manter intacto o embargo econômico já velho de 46 anos, e, com isso derrubar o regime castrista em Cuba -o que nunca aconteceu. Há inclusive registros mais ou menos recentes de manifestações de mãos duras.
Já com o filho de Canosa no comando, a fundação perfilou-se com Bush, em 2004, na imposição de restrições a viagens de familiares a Cuba e remessas de dinheiro, golpe que estrangulou orçamentos domésticos na ilha.
A guinada conduzida por Santos, em oposição à velha-guarda antes liderada por seu pai, provocou um racha. Ela pode ser produto de mero oportunismo. Tem vigor, no entanto, porque se apóia em novas realidades. "São uns dinossauros", foi uma das expressões colhidas numa comunidade, a cubano-americana, que muda de perfil, em dissonância com aqueles que tinham como prioridade absoluta a liquidação do castrismo.
Entre 1991 e hoje, aumentou de 40% para 65%, a parcela favorável a que os EUA iniciem um diálogo com o regime cubano, segundo a Universidade Internacional da Flórida. Supõe-se que o percentual favorável a uma "acomodação" continue aumentando. Acabar com o regime comunista ficou em sexto lugar entre as preocupações colhidas por pesquisadores democratas num distrito de Miami repleto de cubanos.
Sair do Iraque ocupou um nada honroso primeiro lugar.
Os cubano-americanos estão hoje mais preocupados com questões internas, como aumento do desemprego, colapso das hipotecas, cobertura médica etc. Essa mudança de perfil provocará revisões na agenda cubana do Departamento de Estado? Ou iremos presenciar pura mudança de estilo?
Obama disse que abolirá algumas das medidas mais draconianas aplicadas por Bush. Seriam liberadas as viagens de familiares a Cuba e as remessas de dinheiro. De acordo com registros da "Latin News", o presidente eleito dos Estados Unidos prometeu inclusive engajar-se em "diplomacia direta" com Cuba e até "potencialmente" encontrar-se com Raúl Castro, o que seria, segundo a publicação londrina, uma virada "sísmica".
Mas as precondições são tais que inviabilizam essa possibilidade. A União Européia acaba de reativar seu diálogo político com Cuba, e talvez Obama se alinhe por aí. Não há perspectiva, no entanto, de desmontagem, pelo menos de imediato, do embargo econômico.
Em Cuba, a oposição interna, liderada por Oswaldo Payá, ganhador de prêmio do Parlamento Europeu, movimenta-se para reativar o Projeto Varela.
Segue ao pé da letra a lei cubana que exige 10 mil assinaturas para petições de referendos à Assembléia Nacional do Poder Popular. O projeto coloca sob referendo a permanência do próprio regime comunista, com a alegação de "imobilismo" por parte dos Castro. A última iniciativa do gênero, com 25 mil assinaturas, resultou na prisão de 75 dissidentes, inclusive Payá.


O jornalista NEWTON CARLOS é especialista em assuntos internacionais


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