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CRÍTICA
Fora do poder, ex-presidente finalmente mostra humildade
CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
DE SÃO PAULO
Numa entrevista coletiva
no início de 2005, alguém
perguntou ao presidente
George W. Bush qual tinha sido o seu maior erro no primeiro mandato.
Ele olhou para o teto, com
expressão indagadora, por
uns dez segundos e respondeu, assertivo: "Não consigo
pensar em nenhum".
Talvez o tempo fora do poder lhe tenha ensinado alguma lição de humildade.
Ou seus sempre eficientes
assessores de relações públicas o tenham aconselhado a
escrever como se a tivesse
aprendido.
O fato é que "Decision
Points", sua autobiografia
talvez precoce (ele tem apenas 64 anos), lançada ontem
nos EUA, traz inúmeras expressões de autocrítica.
"Eu fui pego desprevenido
[pela crise financeira], achava que qualquer problema
sério de crédito seria contido
pelas agências reguladoras
ou de classificação de risco.
Eu me senti como o capitão
de um navio naufragando."
Sobre a invasão do Iraque,
a mais polêmica de suas decisões, diz que não se arrepende, mas que ficou surpreso
ao constatar que sua principal justificativa (a posse de
armas de destruição em massa pelo regime de Saddam
Hussein) não existia:
"Ninguém ficou mais chocado e bravo com isso do que
eu. Sentia enjoo toda vez que
pensava nisso. Ainda sinto".
No caso das providências
para ajudar as vítimas do furacão Katrina, diz que"deveria ter reconhecido as deficiências antes e intervindo
mais rapidamente".
O livro é escrito na linguagem rastaquera que distinguiu a retórica desse político,
nunca notabilizado pela sofisticação do pensamento.
Os fatos são descritos de
modo simplório, sem nada
que sugira ter resultado de
algum esforço de introspecção por parte do autor.
Mas é magnificamente
bem ilustrado, com ótimas
fotos, quase todas do fotógrafo oficial da Casa Branca,
Eric Draper.
Bush não demonstra nenhum respeito pela liturgia
do cargo que ocupou. Fala
com naturalidade desconcertante sobre um de seus hábitos após ter deixado a Casa
Branca (apanhar o cocô de
seu cachorro) e sobre o modo
heterodoxo com que tomou
decisões importantes antes
dela (como opor-se ao aborto
após sua mãe trazer para casa o feto que havia perdido
por causas naturais e o mostrar ao filho adolescente).
No fim, o ex-presidente diz
que se satisfaz com a convicção de que sempre fez o que
acreditava ser a coisa certa.
Usa o lugar-comum de que
a história julgará o seu governo, mas, no melhor estilo
Luís 15 ("après mois, le déluge"), afirma que não se importa muito com isso:
"Qualquer que venha a ser
o veredicto sobre minha Presidência, sinto-me confortável pelo fato de que não estarei por aqui para ouvi-lo".
Esse homem é visto favoravelmente por 49% dos
americanos, segundo pesquisa do Instituto Gallup no
mês passado, e recebeu US$
7 milhões de adiantamento
pelos direitos do livro, que teve uma primeira tiragem de
1,5 milhão de cópias (fora as
centenas de milhares vendidas eletronicamente).
DECISION POINTS
AUTOR George W. Bush
EDITORA Crown
QUANTO US$ 18,90 pela Amazon,
mais frete (512 págs.)
AVALIAÇÃO regular
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