São Paulo, sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

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OPINIÃO

Liberdade de imprensa, sim; mas roubo de dados, não


GOVERNOS ESTÃO UTILIZANDO UM PRETEXTO CAPENGA PARA PERSEGUIR JULIAN ASSANGE, O FUNDADOR DO SITE WIKILEAKS


CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA

O caso WikiLeaks é talvez o mais acabado exemplo de respostas definitivas, porém contrapostas, para discutir o complexo tema da liberdade de expressão.
Primeira pergunta e primeira resposta: a mídia, incluindo aí a eletrônica ou seja o próprio site WikiLeaks, tem o direito de publicar documentos oficiais roubados? Sim, desde, é claro, que os documentos tenham interesse público. É inequivocamente o caso dos papéis do Departamento de Estado.
Afinal, o público tem todo o direito de saber o que seus governantes dizem e fazem, até porque agem em nome do país, que são todos e cada um de seus habitantes.
Essa resposta, de resto, já tramitou em julgado: a Corte Suprema deu aval ao mais famoso vazamento anterior, o dos chamados "Papéis do Pentágono", sobre a Guerra do Vietnã, que o "New York Times" publicou em 1971.
Segunda pergunta: os governos têm o direito de tentar perseguir quem roubou os papéis? Óbvio que sim. Roubo é roubo, ainda que o motivo eventualmente invocado para o roubo seja tão nobre quanto defender a transparência nas ações do governo, qualquer que seja o governo.
Pretender a impunidade para esse tipo de ação equivale a aceitar a impunidade também para quem rouba e vaza, por exemplo, os dados fiscais de qualquer contribuinte, seja qual for a razão invocada para o vazamento.
A partir daí, chega-se a um ponto bem mais difuso: perseguir o ladrão de dados justifica "matar o mensageiro", como Julian Assange, o fundador de WikiLeaks, diz estar ocorrendo? Claro que não.
Mas não é bem isso que os governos, especialmente o norte-americano, estão fazendo. Matar o mensageiro significaria proibir a difusão da mensagem, o que ninguém nem sequer se atreveu a sugerir ou tentar.
Seria censura e estaríamos de volta à primeira pergunta e à resposta a ela.
O que os governos estão fazendo é utilizar um pretexto capenga, o do suposto abuso sexual cometido por Assange, para perseguir o mensageiro de forma a evitar que futuras mensagens cheguem a ele e dele ao público.
Se fizessem a perseguição abertamente, sempre pelos meios legais, ficaria muito mais difícil falar em ameaça à liberdade de imprensa.
Afinal, ninguém com sentido comum nega que todos -governos ou cidadãos- têm o direito de recorrer à Justiça para coibir o que consideram abusos cometidos pelos meios de comunicação, pouco importa se os convencionais ou os novos meios eletrônicos, que, neste caso, se deram as mãos.


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