São Paulo, domingo, 11 de janeiro de 2004

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IRAQUE OCUPADO

Dirigentes iraquianos temem que, como prisioneiro de guerra, ditador não seja julgado por crimes políticos no país

Novo estatuto de Saddam gera confusão

DA REDAÇÃO

A decisão norte-americana de considerar Saddam Hussein como "prisioneiro de guerra", anunciada anteontem, criou ambiguidades jurídicas e repercutiu negativamente em Bagdá.
Lideranças locais expressaram o temor de que o ditador deposto não venha a ser julgado por crimes políticos cometidos no Iraque durante as mais de duas décadas em que esteve no poder.
Já a Cruz Vermelha Internacional anunciou ter entrado com uma petição formal para visitar Saddam, "diante da declaração do Pentágono de que Saddam é considerado prisioneiro de guerra".
"Segundo a Convenção de Genebra [lei internacional que define o que é um prisioneiro de guerra], o pessoal da Cruz Vermelha está autorizado a visitar o ex-presidente iraquiano", disse Muin Kassis, porta-voz da entidade no Iraque, em Amã (Jordânia).
Dara Nor al Din, que integra o comitê jurídico do Conselho de Governo Iraquiano nomeado pelos EUA, teme que Saddam não seja mais julgado por uma corte iraquiana, contrariando compromisso assumido anteriormente por Washington.
Para ele, a Convenção de Genebra permite que o ex-ditador seja julgado por crimes de guerra e contra a humanidade, mas não necessariamente pela morte e tortura de dissidentes políticos durante as perseguições realizadas durante seu governo.
"A decisão norte-americana é incorreta, porque cabe apenas aos iraquianos decidir sobre essa questão", disse Mahmoud Othman, outro membro do conselho.
O ministro da Justiça da administração civil iraquiana, Hashin Abdul Rahman, qualificou a decisão dos EUA de "mera opinião" e insistiu para que só os iraquianos determinem sob qual estatuto, em que tribunal e sob quais acusações Saddam será julgado.
A questão é controvertida. Para a Cruz Vermelha, a decisão anunciada na sexta pelo Pentágono dá ao ex-ditador algumas proteções jurídicas e abre a possibilidade de que ele seja julgado num tribunal de guerra, possivelmente de caráter internacional.
Ian Piper, porta-voz da entidade humanitária, disse que o plano norte-americano de levar Saddam a julgamento num tribunal iraquiano não contradiz a Convenção de Genebra. "Cabe à potência ocupante [do Iraque] e às autoridades que o detêm o estabelecimento dos procedimentos jurídicos", disse.
Para ele, "o estatuto de prisioneiro de guerra não dá a Saddam imunidade contra acusações de crimes contra a humanidade". Ele vê como "positiva" a definição do estatuto do ex-ditador.
Pela Convenção de Genebra, os EUA devem se submeter a certas regras de tratamento humanitário ao prisioneiro e devem permitir que ele seja visitado pela Cruz Vermelha. Apesar da entidade ter mantido contatos com esse objetivo, ainda não houve resposta por parte de Washington.
Ruth Wedgwood, especialista em Convenção de Genebra na Universidade Johns Hopkins, disse que, como prisioneiro de guerra, Saddam passa a ter direito a formas mais restritas de interrogatório. A convenção, diz ela, proíbe qualquer tipo de ameaça ao prisioneiro.

Cinco morrem em protestos
Tropas britânicas abriram fogo ontem contra manifestantes que jogavam pedras contra o prédio da administração da cidade de Amara (sul do país) num protesto pela falta de trabalho. Pelo menos cinco morreram.


Com agências internacionais


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