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entrevista
Embaixador culpa Ocidente por violência
SAMY ADGHIRNI
DA REPORTAGEM LOCAL
Muhammad Haroon
Shaukat, 55, representante
do ditador paquistanês Pervez Musharraf em Brasília,
diz ter inveja do Brasil. "Os
problemas daqui são irrelevantes comparados aos nossos", afirmou o embaixador,
ao final de uma entrevista à
Folha, no escritório comercial do Paquistão em São
Paulo, que visitou na última
segunda-feira.
Shaukat responsabilizou a
Al Qaeda pelos ataques em
seu país e afirmou que o terrorismo moderno surgiu no
final dos anos 80, quando o
Ocidente abandonou os mujahedin (guereriros islãmicos) árabes que haviam derrotado os soviéticos no Afeganistão.
FOLHA - Por que o Paquistão tornou-se um dos lugares mais perigosos do mundo?
MUHAMMAD HAROON SHAUKAT -
As raízes do terrorismo que
afeta o mundo estão na ocupação soviética do Afeganistão, nos anos 80. Naquela
época, temíamos que o Paquistão se tornasse o próximo alvo da União Soviética.
Por isso, decidimos nos aliar
ao mundo livre. O Paquistão
serviu como base para a entrega de armas e dinheiro da
Europa e dos EUA aos mujahedin árabes. O problema é
que, depois de derrotarem os
soviéticos, esses guerrilheiros foram esquecidos pelo
Ocidente. E nós, na região,
acabamos tendo que enfrentar sozinhos transtornos
econômicos e políticos.
O Afeganistão foi entregue
ao Deus-dará e o Paquistão,
submetido a sanções por
causa de seu programa nuclear. Muitos desses mujahedin árabes acabaram se instalando em zonas tribais do
Paquistão, alguns até se casaram com mulheres paquistanesas. A segunda geração de
mujahedin vive até hoje naquelas regiões tribais. A Al
Qaeda recrutou muita gente
por lá.
Depois dos ataques do 11
de Setembro, o governo paquistanês mergulhou de cabeça na guerra ao terror. Desafio qualquer um a citar um
país mais comprometido
com essa causa do que o Paquistão. Hoje estamos pagando o preço por ter assegurado a liberdade do mundo
livre. Temos nossa parcela de
culpa, mas muitos dos problemas que nos afetam não
foram criados por nós. O Ocidente é responsável por
plantar as sementes daquilo
que estamos vendo.
FOLHA - O que responde aos que
acusam Musharraf de ter, no mínimo, negligenciado a segurança
de Benazir Bhutto?
SHAUKAT - Nenhuma liderança oposicionista paquistanesa jamais recebeu a mesma proteção que foi dada à
ex-premiê. Mas houve uma
seqüência infeliz de eventos.
Depois de discursar numa
área que havia sido totalmente vistoriada e num palanque à prova de balas, ela
não resistiu à tentação de
acenar para a multidão na
hora de ir embora. O assassino sabia que aquele era o momento de atacar.
FOLHA - Musharraf chocou o
mundo ao afirmar que ela é a única culpada pela própria morte.
SHAUKAT - Se o presidente falou, então está falado. O governo havia providenciado
todas as medidas de segurança necessárias. Mas, infelizmente, o pior aconteceu.
Uma investigação está em
andamento. Só quero deixar
claro que estamos diante de
um ataque terrorista com toda a cara da Al Qaeda, e não
de uma discussão política.
FOLHA - Como reage às informações segundo as quais Benazir
Bhutto teria avisado ao governo
britânico que se sentia ameaçada
pelos serviços secretos paquistaneses?
SHAUKAT - Essas alegações
estão sendo investigadas.
Mas não há nenhum interesse por parte do governo em
se envolver num ato desses.
É inconcebível que um agente do Estado se exploda.
FOLHA - Musharraf é acusado
de estar manipulando as instituições para ficar no poder.
SHAUKAT - Como em qualquer campanha eleitoral, comentários irracionais sempre acabam surgindo. Nos
Estados Unidos, republicanos e democratas andam dizendo coisas que não diriam
em outra circunstância. Políticos têm visões divergentes,
isso é o espírito da democracia. Em todo caso, desde que
o presidente Musharraf assumiu o país, tivemos um período de progresso e prosperidade, e um crescimento de
7%. Nossa relação política
está florescendo com o mundo inteiro. A imprensa é livre, assim como o Judiciário.
O presidente entregou o cargo de Chefe das Forças Armadas, como prometido.
Não tenho a menor dúvida
de que ele buscará eleições
justas e transparentes.
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