São Paulo, sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

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entrevista

Embaixador culpa Ocidente por violência

SAMY ADGHIRNI
DA REPORTAGEM LOCAL

Muhammad Haroon Shaukat, 55, representante do ditador paquistanês Pervez Musharraf em Brasília, diz ter inveja do Brasil. "Os problemas daqui são irrelevantes comparados aos nossos", afirmou o embaixador, ao final de uma entrevista à Folha, no escritório comercial do Paquistão em São Paulo, que visitou na última segunda-feira.
Shaukat responsabilizou a Al Qaeda pelos ataques em seu país e afirmou que o terrorismo moderno surgiu no final dos anos 80, quando o Ocidente abandonou os mujahedin (guereriros islãmicos) árabes que haviam derrotado os soviéticos no Afeganistão.

 

FOLHA - Por que o Paquistão tornou-se um dos lugares mais perigosos do mundo?
MUHAMMAD HAROON SHAUKAT -
As raízes do terrorismo que afeta o mundo estão na ocupação soviética do Afeganistão, nos anos 80. Naquela época, temíamos que o Paquistão se tornasse o próximo alvo da União Soviética. Por isso, decidimos nos aliar ao mundo livre. O Paquistão serviu como base para a entrega de armas e dinheiro da Europa e dos EUA aos mujahedin árabes. O problema é que, depois de derrotarem os soviéticos, esses guerrilheiros foram esquecidos pelo Ocidente. E nós, na região, acabamos tendo que enfrentar sozinhos transtornos econômicos e políticos.
O Afeganistão foi entregue ao Deus-dará e o Paquistão, submetido a sanções por causa de seu programa nuclear. Muitos desses mujahedin árabes acabaram se instalando em zonas tribais do Paquistão, alguns até se casaram com mulheres paquistanesas. A segunda geração de mujahedin vive até hoje naquelas regiões tribais. A Al Qaeda recrutou muita gente por lá.
Depois dos ataques do 11 de Setembro, o governo paquistanês mergulhou de cabeça na guerra ao terror. Desafio qualquer um a citar um país mais comprometido com essa causa do que o Paquistão. Hoje estamos pagando o preço por ter assegurado a liberdade do mundo livre. Temos nossa parcela de culpa, mas muitos dos problemas que nos afetam não foram criados por nós. O Ocidente é responsável por plantar as sementes daquilo que estamos vendo.

FOLHA - O que responde aos que acusam Musharraf de ter, no mínimo, negligenciado a segurança de Benazir Bhutto?
SHAUKAT -
Nenhuma liderança oposicionista paquistanesa jamais recebeu a mesma proteção que foi dada à ex-premiê. Mas houve uma seqüência infeliz de eventos. Depois de discursar numa área que havia sido totalmente vistoriada e num palanque à prova de balas, ela não resistiu à tentação de acenar para a multidão na hora de ir embora. O assassino sabia que aquele era o momento de atacar.

FOLHA - Musharraf chocou o mundo ao afirmar que ela é a única culpada pela própria morte.
SHAUKAT -
Se o presidente falou, então está falado. O governo havia providenciado todas as medidas de segurança necessárias. Mas, infelizmente, o pior aconteceu. Uma investigação está em andamento. Só quero deixar claro que estamos diante de um ataque terrorista com toda a cara da Al Qaeda, e não de uma discussão política.

FOLHA - Como reage às informações segundo as quais Benazir Bhutto teria avisado ao governo britânico que se sentia ameaçada pelos serviços secretos paquistaneses?
SHAUKAT -
Essas alegações estão sendo investigadas. Mas não há nenhum interesse por parte do governo em se envolver num ato desses. É inconcebível que um agente do Estado se exploda.

FOLHA - Musharraf é acusado de estar manipulando as instituições para ficar no poder.
SHAUKAT -
Como em qualquer campanha eleitoral, comentários irracionais sempre acabam surgindo. Nos Estados Unidos, republicanos e democratas andam dizendo coisas que não diriam em outra circunstância. Políticos têm visões divergentes, isso é o espírito da democracia. Em todo caso, desde que o presidente Musharraf assumiu o país, tivemos um período de progresso e prosperidade, e um crescimento de 7%. Nossa relação política está florescendo com o mundo inteiro. A imprensa é livre, assim como o Judiciário. O presidente entregou o cargo de Chefe das Forças Armadas, como prometido. Não tenho a menor dúvida de que ele buscará eleições justas e transparentes.


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