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Analistas veem limitação em gestões do Brasil na região
Para diplomatas e observadores, Itamaraty não consegue exercer influência no Oriente Médio
Chanceler Amorim começa hoje giro pela região para apresentar propostas, mas especialistas apontam falta de neutralidade do governo
DA REPORTAGEM LOCAL
O esforço do governo brasileiro para tentar mediar a crise
em Gaza esbarra no alcance
geopolítico limitado do Brasil e
na falta de isenção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tido como pró-árabe, segundo
diplomatas e analistas consultados pela Folha.
A posição brasileira está cristalizada na proposta de organizar e eventualmente sediar
uma conferência na qual os
EUA -cujo alinhamento a Israel o Brasil considera contraproducente- não teriam o papel de principal mediador.
O Planalto alega a necessidade de "arejar" as conversas de
paz, com a inclusão de novos
negociadores "mais neutros".
O chanceler Celso Amorim
foi encarregado de dar vida ao
projeto. Ele está em giro por Síria, Israel, Cisjordânia e Jordânia para detalhar o plano brasileiro, que inclui ainda um cessar-fogo e o envio de monitores
à fronteira Egito-Gaza, ideias já
contempladas nas gestões em
andamento -com aval do governo americano.
O Brasil se diz credenciado
para mediar a crise e cita como
prova a participação, a convite
dos EUA e com o aval de Israel,
na Cúpula de Annapolis (EUA),
em 2007. A reunião tentou relançar o diálogo entre israelenses e palestinos.
Prevalece no Itamaraty o
sentimento de que uma atuação altiva e madura reforça a
candidatura do Brasil a um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU.
Mas, segundo veteranos diplomatas brasileiros, a ideia de
um encontro mundial sob os
auspícios do Brasil é absurda.
"É uma sugestão que tira
nossa credibilidade internacional. Nosso cacife aumentou
nos últimos anos, mas não o
bastante", afirma Marcos
Azambuja, ex-embaixador do
Brasil em Paris.
"É evidente que nosso poder
é limitado no Oriente Médio,
pois não fazemos parte do
Quarteto [para a mediação do
conflito israelo-palestino, que
inclui EUA, União Europeia,
Rússia e ONU]. Temos que ser
sóbrios", diz o diplomata.
Azambuja sugere que o Brasil, no melhor dos casos, poderia associar-se a projetos orquestrados por países com
maior inserção no Oriente Médio, como Egito e França.
Concorda Roberto Abdenur,
ex-embaixador em Washington. "É uma ilusão o Brasil
achar que pode ter alguma influência no Oriente Médio."
Neutralidade em xeque
O ex-chanceler Celso Lafer
aponta outro empecilho para as
gestões do Brasil: o suposto viés
pró-palestino do presidente
Lula e seus assessores.
Lafer lembra que os comunicados do Itamaraty sobre a
guerra "deploraram" os ataques israelenses a Gaza, que foram considerados pelo Brasil
uma "resposta desproporcional" ao foguetes do Hamas.
Em nota, o PT de Lula qualificou os ataques de Israel contra Gaza de "criminosos" e
comparou a ofensiva a uma
prática "nazista", causando indignação de entidades judaicas.
A neutralidade brasileira
também é questionada pelo
analista francês Bruno Tertrais, da Fundação pela Pesquisa Estratégica. "O Brasil me parece mais inclinado para os árabes, a exemplo do presidente
francês anterior, que também
buscava mediar o conflito sem
ser imparcial [Jacques Chirac
era tido como pró-árabe]."
O ex-embaixador Abdenur
afirma que o Brasil também
perde credenciais de interlocutor idôneo ao convidar o presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, que questiona o
Holocausto e a existência de Israel. Ahmadinejad deve visitar
Brasília nos próximos meses.
O governo israelense, que
historicamente rejeitou toda
mediação que não fosse americana, evita uma rejeição aberta
das propostas brasileiras, dizendo-se apenas "disposto a
ouvir toda proposta em busca
da paz", nas palavras de Raphael Singer, porta-voz da Embaixada de Israel em Brasília.
Em contraste, o entusiasmo
palestino é total. "Somos muito
gratos pela posição do Brasil e
apoiamos suas gestões", diz
Ibrahim Alzeben, embaixador
da Autoridade Nacional Palestina (ANP) no Brasil.
O cientista político Marcelo
Coutinho, do Observatório Sul-Americano, não vê problema
no fato de o Brasil emitir posições diplomáticas pronunciadas. Ele cita como êxito o apoio
de França, Rússia e China à
candidatura brasileira a um assento no CS da ONU. "O Brasil
é chamado a opinar sobre questões como Gaza, mas me parece
um exagero querer deslocar os
EUA das mediações", diz Coutinho.
(SAMY ADGHIRNI)
Leia perguntas e
respostas sobre a crise
www.folha.com.br/090092
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