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Túneis servem para passar de mercadorias variadas a noivas
DO ENVIADO A RAFAH
Diante do grande arco amarelo que demarca a fronteira do
Egito com a faixa de Gaza, Adel
anda impaciente de um lado
para o outro, com a inseparável
pasta de documentos debaixo
do braço. De vez em quando o
celular toca e um sorriso largo
se abre. "É Hanade", diz o técnico em eletrônica de 24 anos,
piscando o olho.
De acordo com os papéis que
Adel faz questão de mostrar,
Hanade, 16, é sua mulher desde
o ano passado, quando um
acerto comum entre famílias
árabes selou o matrimônio entre os dois primos de primeiro
grau. Desde então, ele tenta tirar Hanade de Gaza para morar
com ele em Sheikh Zweib, uma
aldeia poeirenta que fica a cerca de 20 km da fronteira.
Há algumas semanas, cansado de esperar pela aprovação
das autoridades egípcias e ansioso para finalmente ver a mulher de perto pela primeira vez,
tomou coragem e fez uma proposta ousada a Hanade: que
saísse de Gaza por um dos muitos túneis clandestinos construídos sob a fronteira.
"Ela até tentou, mas depois
de alguns metros ficou com
medo e voltou", conta Adel,
com olhar compreensivo. "Os
túneis são inseguros, muita
gente já morreu soterrada."
Além de constituírem um canal vital de ligação com o comércio exterior, as centenas de
passagens subterrâneas construídas para driblar o bloqueio
a Gaza se converteram também
em uma solução para reunir famílias, que se arriscam.
"Conheço dezenas de noivas
que passaram pelos túneis", diz
Auni, refugiado palestino nascido no Kuait que mora em
Montreal, no Canadá, país do
qual tem passaporte. Sentado
no meio-fio ao lado da fronteira, ele também esperava a mulher que jamais viu.
Novos-ricos
Segundo pesquisa informal
feita pela reportagem da Folha
na fronteira e nas cidades próximas, a passagem pelo túnel
custa em média US$ 500 (R$
800) por pessoa. Do lado egípcio, os donos dos túneis são em
sua maioria beduínos.
Com o aperto do bloqueio a
Gaza e a demanda crescente
dos 1,5 milhão de pessoas que
vivem no território palestino,
os túneis se tornaram uma indústria milionária, formando
uma classe de novos-ricos na
região desértica da fronteira.
Nem o projeto do governo
egípcio de construir um muro
subterrâneo para barrar o contrabando assusta o negócio.
"Não tem problema. Se o muro
tiver 20 metros nós cavamos
25", disse à Folha um "operador" de túneis beduíno.
(MN)
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