|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
entrevista
"Ser árabe em Israel não é contradição"
DA REDAÇÃO
Ser árabe e israelense não
é uma contradição, afirma o
deputado trabalhista Raleb
Majadele, que no mês passado tornou-se o primeiro árabe muçulmano a integrar o
gabinete de Israel.
Embora crises de identidade não o assombrem, Majadele, que deverá assumir a
pasta da Cultura, Ciência e
Esporte, admite que os cidadãos árabes de Israel sofrem
injustiças e diz que usará o
cargo para tentar corrigir as
distorções.
Leia a seguir os principais
trechos da entrevista concedida por ele à Folha, por telefone, de seu gabinete em
Jerusalém.
FOLHA - Sua nomeação foi cercada de enorme polêmica, com
críticas tanto dos colegas árabes
no Parlamento como da direita.
Assumir dessa forma aumenta o
desafio?
RALEB MAJADELE - A função da
oposição é criticar o governo.
Mas a nomeação do primeiro
ministro árabe muçulmano
em Israel, após 58 anos, tem
um significado histórico. É
um avanço irreversível, principalmente por ocorrer num
momento difícil para o país.
O desafio é promover a coexistência dentro de Israel e a
igualdade de direitos dos cidadãos árabes israelenses.
FOLHA - Como o sr. vencerá a
desconfiança de judeus e árabes?
MAJADELE - A desconfiança
também existiu quando eu
exerci outros cargos do Estado, como membro da Comissão de Interior e Meio Ambiente do Parlamento. Minha permanência na vida pública é a comprovação de que
a coexistência é possível e da
disposição do governo de
melhorar a vida dos cidadãos
árabes.
Nosso objetivo é corrigir as
distorções e as desigualdades
sofridas pelos árabes em Israel. Também é do interesse
dos judeus que a parcela árabe, que perfaz 20% da população, tenha melhor qualidade de vida.
FOLHA - Qual será a prioridade
de um árabe na chefia do Ministério da Cultura de Israel?
MAJADELE - Seja judeu ou
árabe, o ministro da Cultura
tem a mesma responsabilidade. No meu caso, a diferença é que, além dos assuntos
relacionados à toda a população, também quero dar atenção especial ao sistema de
cotas, de forma a melhorar o
status da população árabe e
corrigir as desigualdades.
FOLHA - O sr. vê problema em
fazer parte do mesmo gabinete
de um ultradireitista, o ministro
Avigdor Lieberman?
MAJADELE - É um problema,
sem dúvida. A ideologia de
Lieberman nega os direitos
de existência dos cidadãos
árabes de Israel. Ele quer
transferir a população árabe,
algo com o qual nós e a maioria dos israelenses jamais poderemos concordar. Lieberman entrou no governo depois do Partido Trabalhista,
que é o principal parceiro da
coalizão, com base em princípios que negam a ideologia
segregacionista dele. Mas
Lieberman não é problema
só nosso. É um problema de
toda a sociedade israelense.
FOLHA - Que papel os árabes israelenses podem desempenhar
no processo de paz, sem serem
chamados de traidores por nenhum dos lados?
MAJADELE - Nossa ambição é
ajudar no avanço do processo de paz. Um governo que
não tiver um programa para
obter a paz não tem o direito
de existir. A paz é a melhor
garantia de segurança e prosperidade para os cidadãos de
Israel, tanto árabes como judeus.
Como cidadão israelense e
parte do povo palestino, acho
que posso ajudar. Não temos
alternativa: passamos por
seis guerras e não conseguimos solucionar o conflito.
Queremos voltar ao período
dos acordos de Oslo [1993-1995], quando houve prosperidade e estabilidade, e possibilitar a criação de um Estado palestino ao lado de Israel
para garantir um futuro melhor a nossos filhos.
FOLHA - O sr. não teme ser chamado de traidor?
MAJADELE - Não. Os israelenses sabem que a contribuição
dos árabes para a paz com os
palestinos e para a igualdade
pode ser grande. O próprio
[Iasser] Arafat disse que os
árabes de Israel têm um papel estratégico no processo
de paz. Somos ao mesmo
tempo palestinos e israelenses, o que facilita a construção da ponte.
Os israelenses entendem
que, embora seja ministro do
Estado de Israel, também
sou um cidadão árabe que
tem uma herança cultural
própria, da qual não pretendo abrir mão. Ser árabe e israelense não é uma contradição.
Texto Anterior: Frase Próximo Texto: Polícia prende 70 em protestos contra obra Índice
|