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Irã se abre a diálogo "respeitoso" com EUA
Em festejo de 30 anos de revolução, Ahmadinejad diz que está pronto a "manter conversações baseadas no respeito mútuo"
Slogans contra EUA são raros em multidão que foi à festa; em largas avenidas, famílias compram balões do Mickey e fazem piquenique
RAUL JUSTE LORES
ENVIADO ESPECIAL A TEERÃ
Na sua resposta mais explícita aos acenos de Barack Obama,
o presidente ultraconservador
do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, abriu ontem as portas para
a retomada do diálogo com os
Estados Unidos: "Nossa nação
está pronta para manter conversações baseadas no respeito
mútuo e sob uma atmosfera
equilibrada".
A declaração foi feita diante
de dezenas de milhares de pessoas, na celebração dos 30 anos
da vitória da Revolução Islâmica, que em 1979 colocou os aiatolás no poder e derrubou a
monarquia que era aliada de
Washington. Os dois países
cortaram relações desde então.
Um dia antes, Obama havia
repetido em entrevista coletiva
o que vem dizendo desde a
campanha à Presidência americana -que procura oportunidades para retomar o diálogo
com o regime iraniano.
No discurso que serviu como
recado aos EUA, Ahmadinejad
disse que, "se você quer lutar
contra o terrorismo, venha e
coopere com a nação iraniana,
que é a maior vítima do terrorismo. Se você quer confrontar
as armas nucleares, você precisa ficar ao lado do Irã".
Diante da multidão, o presidente iraniano disse que o Irã é
uma superpotência, usando como exemplo o lançamento do
primeiro satélite produzido no
país ao espaço, no último dia 3.
Um modelo do satélite e do
foguete que o lançou estavam
em exibição no meio da manifestação.
Em campanha
Ahmadinejad tenta a reeleição em junho, e sua mudança
de tom foi interpretada no Irã
como adaptação à nova liderança americana. Com o ex-presidente George W. Bush,
Ahmadinejad usava uma retórica ainda mais agressiva que a
do republicano, que listou o Irã
entre os componentes do "eixo
do mal".
Na eleição presidencial, Ahmadinejad é desafiado pelo seu
antecessor, Mohammad Khatami, que presidiu o país entre
1997 e 2005. Reformista, ele relaxou a perseguição a dissidentes e a política de costumes no
país, que voltaram a ser mais
estritas sob Ahmadinejad.
Khatami anunciou sua vontade de concorrer às eleições de
junho - e sofreu assédio dos ultraconservadores durante a
manifestação de ontem, aos
gritos de "morte a Khatami,
não queremos um governo
americano".
Independentemente de
quem ganhe a eleição, quem
realmente dá as cartas na política iraniana continuará sendo
o líder supremo religioso, o aiatolá Ali Khamenei, que controla as Forças Armadas e o Poder
Judiciário.
Paz e piquenique
Apesar de alguns protestarem contra Khatami, foi o tom
conciliador adotado ontem por
Ahmadinejad que predominou
entre a multidão que lotava a
praça da Liberdade e as avenidas vizinhas.
Ao contrário das cenas comuns de cantos de guerra e punhos cerrados ao alto constantemente exibidas pela tevê, a
maioria do público estava mais
interessada em balançar bandeirinhas do Irã e cantar slogans de orgulho pela revolução.
Tirando o grupo coreografado, majoritariamente masculino, que ficou diante do palco
presidencial e gritava sem parar, a maioria parecia só querer
aproveitar o feriado e ver as
evoluções de paraquedistas.
Observadores locais, testemunhas de várias paradas do
gênero, confirmaram à Folha
que o clima deste ano era mais
pacífico. Poucas bandeiras
americanas e israelenses foram
queimadas. Gritos de "morte
aos Estados Unidos" e "morte a
Israel" foram exceção entre os
poucos exaltados.
A multidão aproveitou as
avenidas e ruas largas cortadas
ao trânsito, em um clima parecido ao de um feriado comum.
Famílias inteiras se aboletaram em praças e faziam piqueniques em meio à marcha.
Muitos estavam com sua melhor roupa de feriado e se distraíam com seus filhos pequenos. No país onde a lei proíbe
música e "produtos culturais
ocidentais", camelôs vendiam
bonecos do Homem-Aranha
sem problemas, assim como
balões para as crianças com as
orelhas do Mickey.
Nesses congestionamentos,
um carro com cinco rapazes
barbudos buzinou e começou a
assobiar ao se aproximar de um
carro com duas jovens. Os cinco aplaudiram a beleza das vizinhas de engarrafamento. Se
não estivessem com véu cobrindo o cabelo, a cena poderia
ter acontecido no Brasil.
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