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ANÁLISE
Falta de tropas da coalizão agora afeta ordem nas cidades
RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL
O número de tropas terrestres
que os anglo-americanos enviaram ao Iraque está sendo suficiente para tomar o país, graças ao
enorme poder de fogo de que dispõem, notadamente em aviação.
Mas é claramente insuficiente para manter a "lei e a ordem".
Mesmo os críticos desse "modo
barato de fazer guerra", que foram ironizados pelo vice-presidente Dick Cheney como "generais embutidos nos estúdios de
TV", não duvidavam que os anglo-americanos venceriam.
Basicamente, esses "generais de
pijama" diziam que seria mais seguro ter mais tropas, pois a guerra
é o clássico domínio da confusão,
do imprevisível. Depender de situações "imponderáveis" -como a revolta da população iraquiana e a deserção do Exército-
seria algo arriscado.
O que falta hoje no Iraque ocupado pelos EUA é um bom número de unidades de polícia militar.
Essa "military police" americana
é o equivalente no Brasil da Polícia do Exército, e não das polícias
militares estaduais.
São tropas que servem na retaguarda, com a função tanto de
cuidar de prisioneiros, como de
manter a ordem entre a população civil e evitar abusos de soldados contra ela.
Toda cidade conquistada sofre
uma imediata quebra na ordem.
Essa situação fluida é aproveitada
pelos saqueadores ou pelos que
têm contas a ajustar. Saddam
Hussein distribuiu milhares de
armas entre a população. Essas
armas agora podem ser usadas
não contra os exércitos anglo-americanos, mas para o banditismo puro e simples.
Nos saques do passado, mesmo
na Europa da era do Iluminismo,
uma cidade sitiada que resistisse
poderia ser legitimamente saqueada depois de tomada. Os
americanos se limitam a catar
souvenires em Bagdá. Mas o caos
é o mesmo de sempre, e saqueadores sempre surgem quando as
condições permitem -algo que
já aconteceu até mesmo em cidades americanas em blecautes.
O secretário da Defesa Donald
Rumsfeld, apesar das suas recentes declarações cautelosas, também está exultante com a rápida
dissolução das Forças Armadas
do Iraque. Sua Marinha mal existia, sua Força Aérea não voou, seu
Exército em grande parte "voltou
com os pés" a caminho da retaguarda.
Mas a necessidade de proteger
extensas linhas de suprimento
impediu, por exemplo, que a 101ª
Divisão Aerotransportada, especializada em assalto aéreo, tivesse
missões à altura das suas capacidades.
O norte e o oeste do Iraque estão
sendo "tomados" por forças ridiculamente pequenas, que não têm
condições de policiar todas as rotas de fuga que certamente estão
sendo utilizadas pelos partidários
de Saddam para sair do país.
A fraqueza americana na região
curda poderia até mesmo servir
de incentivo aos turcos para realizarem uma intervenção preventiva, para "restabelecer a ordem". O
vácuo de poder existe. Resta saber
como agirão os atores políticos.
Ainda mais grave, a fraqueza
americana no terreno pode encorajar os mais fanáticos partidários
de Saddam a manter alguma resistência. O ex-ditador construiu
uma base de poder durante mais
de duas décadas. Afinal, ainda
existem centenas de milhares de
iraquianos que são partidários do
regime que está desabando.
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