São Paulo, quinta-feira, 11 de junho de 2009

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Irã vive fim de campanha agressiva que rachou país

Conservadora zona rural está com Ahmadinejad; capital prefere reformista Mousavi

Presidente, conhecido por negar Holocausto, acusa rivais de usarem "táticas de Hitler" contra ele; primeiro turno acontece amanhã


RAUL JUSTE LORES
ENVIADO ESPECIAL A TEERÃ

Na campanha mais agressiva e disputada da história do Irã, que culmina com o primeiro turno da eleição presidencial amanhã, o presidente Mahmoud Ahmadinejad acusou ontem seus adversários de usar "táticas de Hitler" e ameaçou colocá-los na cadeia "por ofender o presidente".
"Esses insultos e acusações contra o governo são um retorno aos métodos de Hitler, de repetir mentiras até que se acredite nelas", disse o presidente.
"Quem insulta o presidente deve ser punido, e a punição é cadeia", discursou em comício na frente da Universidade Sharif, em Teerã.
Seu principal rival, o ex-primeiro-ministro Mir Hossein Mousavi, um reformista moderado, disse que o país sofre de inflação alta e desemprego e que o presidente não soube investir nem poupar os recursos da época em que o petróleo tinha cotações muito mais altas. Mousavi acusou ainda o rival de "isolar o Irã e colocar a perder nossa dignidade internacional" ao negar o Holocausto.
Ahmadinejad diz que a inflação está em 14%, enquanto Mousavi usa números do Banco Central, que apontam para 23,6%. A apresentação de cifras conflitantes foi a marca dos debates na TV entre os presidenciáveis na semana passada.
O atual presidente ganhou 20 minutos da TV estatal para se defender das acusações. No início da semana, a campanha de Mousavi acusou a mídia do governo de dar mais espaço a Ahmadinejad.

Revolução de veludo
Em outro round, na semana passada, Ahmadinejad acusou o ex-presidente Hashemi Rafsanjani (1989-1997) e seu filho de "corrupção e enriquecimento com a polícia". Rafsanjani pediu anteontem que o supremo líder político e religioso do país, o aiatolá Ali Khamenei, que está acima do cargo de presidente, "tome as medidas necessárias para acabar com esse motim e com esse incêndio de que já se vê a fumaça".
A violência verbal repercutiu em Qom, a cidade sagrada dos aiatolás, maior centro religioso do país. Catorze clérigos lançaram manifesto dizendo que estão "profundamente preocupados" pela agressividade da campanha eleitoral.
Já um diretor da Guarda Revolucionária, a principal força de segurança do país, disse que a oposição de Mousavi pretende fazer uma "revolução de veludo" no Irã -o termo remete ao pacífico golpe que derrubou a ditadura comunista na antiga Tchecoslováquia.
"Mas uma revolução de veludo não terá sucesso no Irã", disse ontem Yadollah Javani, diretor do escritório político da Guarda.

País dividido
A vitória de Ahmadinejad era dada como certa até o mês passado. Antes dele, todos os presidentes da República Islâmica do Irã tiveram um segundo mandato, e ele tem a simpatia do líder supremo Khamenei.
A apatia entre jovens e mulheres, descrentes de qualquer mudança até o começo formal da campanha, em maio, também ajudava o conservador.
A divisão entre revolucionários islâmicos, aiatolás e os pobres de um lado, e das classes média e alta, comerciantes, mulheres e jovens urbanos de outro era uma marca da política recente iraniana.
Ao acusar Rafsanjani e outros ex-presidentes de corrupção, Ahmadinejad rachou a velha guarda. A economia em desaceleração também não o ajuda. O PIB cresceu 8% em 2007 e 4,5% em 2008, mas não deve passar de 3% neste ano.
As chances de Ahmadinejad se concentram em sua performance no interior. Se na metrópole Teerã, de 14 milhões de habitantes, Mousavi parece levar vantagem, no interior, mais pobre e mais religioso, Ahmadinejad é favorito.
Nos últimos dois anos, Ahmadinejad fez comícios para multidões no interior, onde distribuía dinheiro vivo e empréstimos a recém-casados e aos excluídos iranianos, um programa assistencial que chegou a 5,5 milhões de iranianos.
Sua linguagem simples e religiosa e seus trajes modestos também ajudaram a transformá-lo em herói no campo, onde mora 30% da população.
Com quatro candidatos (os outros dois são um clérigo reformista e um conservador que é ex-líder da Guarda Revolucionária), é possível que haja segundo turno, no dia 19, se nenhum dos candidatos tiver mais de 50% dos votos.


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