São Paulo, quarta-feira, 11 de julho de 2007

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análise

Ditador pende entre EUA e religiosos

JO JOHNSON E FARHAN BOKHARI
DO "FINANCIAL TIMES"

A decisão do general Musharraf, do Paquistão, de agir contra os religiosos que ocupavam a Mesquita Vermelha tem ramificações que só se tornarão aparentes nas próximas semanas. É difícil determinar se o uso da força contra a mesquita representa uma virada na abordagem do governo para combater o extremismo violento. Caso isso se confirme, o apoio internacional ao general pode se consolidar, aliviando a pressão para que ele deixe a política e reinstitua a democracia em seu país.
Os EUA expressaram apoio público à invasão da mesquita. Desde os ataques do 11 de Setembro, o general Musharraf vem enfrentando críticas incessantes por não ter cumprido suas promessas de agir com dureza contra as madrassas que promovem o extremismo religioso. Ao longo dos seis últimos anos, surgiu um padrão: ele periodicamente se declara decidido a enfrentar o problema, mas em geral termina por violar suas promessas e opta por não agir. Os analistas atribuem isso à falta de legitimidade de seu governo e à sua dependência do apoio político de líderes religiosos conservadores.

Base de apoio
Mas políticos oposicionistas dizem que é otimismo exagerado, de parte do sempre iludido Ocidente, imaginar que a invasão e a ocupação da Mesquita Vermelha representem determinação, da parte do governo, em reprimir as madrassas renegadas. Os líderes religiosos encenaram seu desafio ao Estado em uma mesquita no coração da capital, a pouco mais de cinco minutos, a pé, da sede do serviço de informações paquistanês. "Como foi possível que eles trouxessem tantas armas, tanta munição? Houve conivência das agências de informações ou essa situação veio a se agravar como resultado de sua incompetência?", perguntou o senador Farhatullah Babar, porta-voz do Partido do Povo do Paquistão (PPP).
"Nem Musharraf nem o Exército podem enfrentar esse problema sozinhos. Combater os militantes requer que o governo permita que um processo democrático se enraíze no Paquistão, o que por sua vez geraria um amplo consenso nacional." Mas o esforço do general Musharraf para se manter no poder, depois de seu golpe de Estado, em 1999, gerou um relacionamento complexo entre o Exército e os líderes religiosos. Os seis principais partidos religiosos do país, organizados em uma frente conhecida como Muttahida Majlis el-Amal, opuseram-se a muitas das políticas de Musharraf. A frente denunciou o general por trair o Taleban, em 2001, e se opõe à presença de soldados americanos no Paquistão.
Mas, ao mesmo tempo, a Liga Muçulmana Paquistanesa (Quaid-e-Azam), o partido governista, depende dos partidos religiosos para manter sua base de apoio, em declínio, e para ajudá-lo a combater os principais partidos de oposição laicos, o PPP, de Bhenazir Bhutto, e a Liga Muçulmana do Paquistão-Nawaz (LMP-N), de Nawaz Sharif, derrubado do posto de premiê por Musharraf.
Ao recuar repetidamente de suas promessas de reformar o conteúdo jihadista no currículo das madrassas e estancar o influxo de dinheiro aos seminários radicais, o governo tornou mais ousadas as ações das forças sectárias e extremistas, contribuindo para a violência que vem abalando o país, argumenta o prestigioso International Crisis Group (ICG).

Opções do general
O general Musharraf agora dispõe de duas opções principais. Caso a operação contra a Mesquita Vermelha sirva como amostra de determinação de reprimir o extremismo religioso, ele poderia optar por abandonar os partidos religiosos conservadores, que vêm apoiando seu regime em troca da anuência do governo à "talebanização" da sociedade paquistanesa.
Em lugar disso, ele poderia procurar uma aliança política mais ampla com Bhutto ou Sharif. Os dois antigos premiês insistiriam, porém, em que ele deixasse o Exército como parte de qualquer acordo que resulte em apoio à reeleição de Musharraf.
Alternativamente, não seria impossível que o general Musharraf se sentisse tentado a usar a ameaça de uma crise iminente no cinturão das madrassas como pretexto para decretar um estado de emergência. "Caso isso aconteça", alerta Samina Ahmad, do ICG, "os paquistaneses poderiam passar a ver os EUA como empecilho à democracia, o que levaria Washington a perder os vestígios de credibilidade que lhe restam no país."


Tradução de PAULO MIGLIACCI


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