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ARTIGO
Os ataques da Al Qaeda no contexto histórico
France Presse
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Bin Laden no Afeganistão em 1989; colapso soviético foi crucial no processo que culmina no 11/ 9 |
RAMI G. KHOURI
Ouvimos nesta semana como
o mundo mudou desde o 11 de
Setembro: o terrorismo é pior;
o combate a grupos terroristas
é mais eficiente; o militarismo
liderado pelos EUA gera uma
contra-ofensiva antiamericana; liberdade e democracia são
promovidas no exterior enquanto seus valores erodem
nos EUA e no Reino Unido. Não
são abordagens analíticas úteis.
Os eventos desta semana deveriam nos lembrar de manter o
discernimento entre o trauma
profundo de um país e as tendências de real significado global e histórico a todos os países.
Ao marcarmos o 11 de Setembro, deveríamos nos ater a uma
questão simples mas crucial:
foi o terrorismo estilo Al Qaeda
que gerou o militarismo anglo-americano ou foi o unilateralismo anglo-americano que alimentou política e psicologicamente a Al Qaeda e sua visão
distorcida do mundo?
É preciso ir além do 11 de Setembro como evento bárbaro e
isolado, cujos responsáveis devem ser combatidos a todo custo, e analisá-lo como parte de
um processo maior num contexto histórico complexo.
Colapso soviético
Há um antigo ciclo de tensão,
ataque, raiva e vingança entre
terroristas estilo Al Qaeda e
elementos ocidentais que remonta ao início dos anos 90.
É por isso que uma data muito mais significativa em termos
de transformação da história é
o colapso da União Soviética e
seu império em 1989-1990.
Esse triunfo do capitalismo
ocidental, da liberdade, da democracia e do militarismo contribuiu para três aspectos representativos no Oriento Médio sob os quais o 11 de Setembro é analisado de forma mais
acurada: 1) a região segue fechada à mudança democrática,
permitindo a regimes autocráticos se fortalecerem; 2) o fim
da Guerra Fria rompeu laços
ideológicos que mantinham a
região congelada e permitiu a
regimes e grupos não-estatais
tentar novas aventuras (Iraque
no Kuwait, Síria fora do Líbano,
EUA e Reino Unido no Iraque);
3) a visão anglo-americana-israelense do mundo, que se
apóia na força das armas, dominou a política para o Oriente
Médio, chegando à era atual de
mudanças induzidas de regime.
Desde os anos 90, a região está atolada num legado de extremismo local e global, terror e
violência militar. Os políticos
anglo-americano-israelenses
enquadram de forma simplista
a trajetória de violência como
uma guerra justa contra o terror gerada pelo hediondo crime
do 11 de Setembro. A realidade
não é tão simples. Na verdade, o
11 de Setembro foi um ato particular desumano e criminoso de
uma cadeia de ataques antiamericanos por um pequeno
grupo de terroristas cuja paixão
não ressoa profundamente na
opinião pública árabe.
Para entender o 11 de Setembro, devemos começar por volta de 1990; traçar a trajetória
destes pequenos e isolados grupos criminosos terroristas; entender por que eles não têm
apelo ao público árabe como o
Hamas, o Hizbollah e a Irmandade Muçulmana; ver a interação simbiótica entre suas ações
e o militarismo anglo-americano-israelense na região; seguir
a longa história dos países e sistemas políticos no Oriente Médio que continuam pressionados por causa de uma cruel
combinação de seu próprio extremismo e a crônica interferência militar estrangeira.
A Al Qaeda foi difundida por
esse legado e contribuiu para
piorá-lo nos últimos anos, em
parte por meio da dinâmica que
envolve o 11 de Setembro. Hoje
temos quatro marcas da doença moderna do militarismo: o 11
de Setembro, a Guerra do Iraque e as guerras israelenses em
Gaza e no Líbano.
Se esses temas correlatos não
são entendidos como um processo histórico único, não serão
entendidos de verdade. Nesse
caso, tudo que vivenciaremos
nesta semana será uma overdose de entretenimento analítico
e emocional -até sermos sacudidos pelo próximo ataque, a
próxima guerra ou a próxima
mudança de regime.
RAMI G. KHOURI é diretor do Instituto Issam
Fares na Universidade Americana de Beirute e
editor licenciado do jornal Daily Star, de Beirute
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