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São Paulo, sábado, 11 de outubro de 2003

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A VEZ DO ISLÃ

Ativista dos direitos humanos, Shirin Ebadi é a primeira muçulmana a levar o prêmio, ao qual o papa era favorito

Advogada iraniana ganha o Nobel da Paz

John Schults/Reuters
A iraniana Shirin Ebadi acena ao receber aplausos durante entrevista em Paris, após ter sido anunciada como vencedora do Nobel


DA REDAÇÃO

Num ano marcado pela guerra, a advogada iraniana e ativista pelos direitos humanos Shirin Ebadi, 56, tornou-se a primeira mulher muçulmana a vencer o Prêmio Nobel da Paz. O anúncio foi feito em Oslo às 11h de ontem (6h em Brasília) pelo presidente do Comitê do Nobel Norueguês, que atribui a honraria, Ole Danbolt Mjoes. O favorito ao prêmio, segundo analistas, era o papa João Paulo 2º.
A advogada -que foi uma das primeiras juízas iranianas e se destacou na defesa de réus políticos- recebeu a notícia meia hora antes do anúncio, em Paris, onde participava de uma conferência.
"Alguém ligou para mim de Oslo e disse que eu poderia ter ganhado o prêmio. Eu nem sabia que era candidata", disse Ebadi.
Usando um vestido preto, batom vermelho e sem o tradicional lenço na cabeça, Ebadi concedeu uma entrevista coletiva na capital francesa. Indagada se tinha alguma mensagem ao governo em Teerã, a advogada pediu a libertação de todos os prisioneiros políticos no país e defendeu a união na luta pelos direitos humanos.
"[O prêmio] pertence a todos os iranianos que trabalham pelos direitos humanos e pela democracia no Irã", declarou. "Não é porque você é um muçulmano que não pode respeitar os direitos humanos", acrescentou, dizendo-se "encorajada" pela vitória.
A iraniana é a 11ª mulher e a terceira pessoa de credo muçulmano a levar o prêmio, de US$ 1,3 milhão. A última vitória de uma mulher havia acontecido em 1997.
"Ebadi é uma muçulmana consciente. Ela não vê conflito entre o islã e os direitos humanos fundamentais", disse Mjoes ao fazer o anúncio. "É um prazer para o Comitê do Nobel Norueguês dar o prêmio a uma mulher que faz parte do mundo muçulmano."
O governo reformista iraniano aplaudiu a premiação, embora setores conservadores tenham criticado. "Em nome do governo da República Islâmica do Irã, eu congratulo a doutora Ebadi. Consideramos esse prêmio o resultado de suas qualificações", disse Abdollah Ramazanzadeh, porta-voz do governo. "As mulheres muçulmanas ganharam uma atmosfera positiva para suas atividades, e esperamos que sua opinião seja ouvida dentro e fora do Irã."
Já o editor do jornal conservador "Resalat", Amir Mohebian, refletiu a opinião dos conservadores, que têm imposto dificuldades às reformas propostas pelo presidente Mohamad Khatami. "Podemos estar contentes com o fato de uma iraniana vencer, mas acreditamos que o Prêmio Nobel da Paz esteja sendo usado com objetivos políticos", disse.
A Casa Branca felicitou Ebadi, chamando-a de "campeã dos direitos humanos". "Ela trabalhou incansavelmente e sofreu nas mãos do regime clerical para promover a democracia e os direitos humanos", disse um porta-voz.
O secretário-geral da ONU, Kofi Annan, a chamou de "corajosa". "Espero que esse prêmio dê mais poder às mulheres para falar e insistir em seus direitos", declarou.

Papa
Especialistas afirmaram que a oposição do papa ao controle de natalidade, ao homossexualismo e à ordenação de mulheres pode ter dificultado sua vitória, apesar de seu currículo de defesa da paz ter feito dele um forte candidato.
"O papa é um mensageiro da paz", disse o cardeal Angelo Sodano, principal assessor do pontífice. "Se uma organização quer reconhecer isso, tudo bem. O papa está acima dessas coisas. O reconhecimento humano pode ser reconfortante, mas não é necessário." Outro funcionário do Vaticano reclamou: "Achei que fosse um prêmio de paz, não de ética sexual".

Com agências internacionais

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