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IRAQUE SOB TUTELA
Candidatos ligados aos EUA, a clérigos xiitas e a militares disputam voto de iraquianos
Saddam e EUA polarizam campanha
ESPECIAL PARA A FOLHA, DE BAGDÁ
"Eu disse em outubro e repito
agora: não vou votar sob ocupação. Este é um plano dos americanos que beneficia os xiitas, e o governo é cúmplice", afirma o sunita Ahmed, de 23 anos, reiterando
sua decisão com veemência e dedo em riste. "Se eu pudesse, mataria Ibrahim al Jafaari com minhas
próprias mãos. Ele é um colaboracionista."
Atual premiê do Iraque, o xiita
Al Jafaari é candidato nas eleições
com a chapa 555, de seu partido
Al Dawa, que faz parte da Aliança
Unificada Iraquiana.
O Al Dawa goza de certo prestígio em função da resistência que
fez a Saddam Hussein [1979-2003]. Seus partidários afirmam
que, de 1982 a 1984, 77 mil membros do partido foram assassinados pelo regime do ex-ditador.
O aprofundamento do sectarismo entre a minoria suinta e a
maioria xiita e seus aliados curdos, os atentados em grande escala, assassinatos e seqüestros de
candidatos, além da intervenção
externa, são algumas das características que marcam o terceiro encontro em 11 meses que os iraquianos terão com as urnas, desta
vez para escolher uma Assembléia Nacional que legislará por
quatro anos. Ao todo, 231 partidos disputam os 275 assentos.
Mas a reaparição de Saddam
Hussein no primeiro julgamento
ao qual é submetido -adiado até
21 de dezembro depois que o ex-presidente mandou os membros
do Tribunal Especial "ao inferno"- é outra das causas da polarização da sociedade iraquiana,
que afeta diretamente o clima
pré-eleitoral, marcado pelo aumento da violência.
As fórmulas das eleições de janeiro, para uma assembléia provisória, e do referendo de outubro, que aprovou a nova Constituição do país, se repetem. O Conselho dos Ulemás, organização
político-religiosa que representa
os árabes sunitas, anunciou que
vai boicotar as eleições parlamentares, embora tenha assegurado
que não obrigará nenhum iraquiano a apoiar sua decisão.
Mortes e seqüestros
A eleição começa amanhã, com
o voto dos militares, doentes hospitalizados e presos. Na terça e
quarta-feira vão votar os iraquianos registrados no exterior, e, na
quinta-feira, a votação se estende
para todo o território nacional.
Diferentemente da primeira
eleição, porém, neste terceiro momento do processo democrático
imposto pela agenda dos EUA os
candidatos estão se dando a conhecer publicamente. Isso tem
um preço: pelo menos sete candidatos foram assassinados nos últimos dias, outros foram seqüestrados e ainda outros retiraram
suas candidaturas.
Mas homens como o xiita Ahmed Chalabi -uma das fontes da
CIA sobre a suposta existência de
armas de destruição em massa no
Iraque, usadas como justificativa
pelos EUA para invadir o país
mas nunca encontradas - prometem "um Iraque unido", com a
chapa 569.
"Chalabi é um sem-vergonha. É
graças a ele que estamos sob ocupação, sem trabalho, sem segurança, sem água e sem luz", diz
Sahar, iraquiana de 43 anos que
vive no bairro Al Baya, no oeste da
capital, enquanto faz compras no
mercado popular. Ela revela que
vai votar na coalizão sunita encabeçada por Saleeh al Matlek.
O xiita Iyad Allawi, o ex-premiê
interino nomeado pelo administrador norte-americano Paul Bremer durante a ocupação oficial do
país, encerrada em junho de 2004,
garante ser "um homem para este
tempo e um homem para o futuro". Ele lidera a chapa 731 e aparece sorridente na foto de campanha, convidando os iraquianos a
votarem nele.
Allawi seria o grande favorito
do presidente dos EUA, George
W. Bush. Isso porque, supõe, ele
seria muito mais cooperativo com
o governo norte-americano e com
o uso do "poder aéreo", o próximo passo da Estratégia para a Vitória no Iraque anunciada por
Bush na semana passada.
Se os resultados da eleição não
lhe forem favoráveis, existe a possibilidade de uma grande fraude
contra os aliados xiitas. "Voto em
Allawi porque prefiro um governo laico e porque ele lutou contra
Saddam", observa Adnin, 20
anos, estudante de línguas na
Universidade de Bagdá.
Os Soldados do Partido Islâmico, com suas vestimentas que os
identificam como integrantes da
hierarquia eclesiástica xiita, também integram a chapa 555.
Depois de três meses de silêncio,
o grão-aiatolá Ali al Sistani reapareceu publicamente para pedir a
seus seguidores que participem
das eleições e que votem na coalizão xiita, para "preservar o Iraque" e "proteger os iraquianos".
"Vamos votar em quem Sistani
manda. Ele é um homem sábio e
respeitado. Confiamos nele", diz
Haquim.
Outros, no entanto, declaram
que a única pessoa em quem votariam não é candidato: Saddam
Hussein.
(KAREN MARÓN)
Tradução de Clara Allain
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