São Paulo, quarta-feira, 12 de maio de 2010

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Conservador é o novo premiê do Reino Unido

David Cameron forma inédita coalizão com liberais-democratas e põe fim a 13 anos de governo do Partido Trabalhista

Aos 43, líder conservador será o mais jovem premiê britânico em dois séculos; sua principal missão será diminuir o deficit do país


John Stillwell/France Presse
O conservador David Cameron cumprimenta rainha Elizabeth 2ª

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A MADRI

Um arco-íris pendurado sobre o Green Park dava ainda mais cores a um raro pôr do sol luminoso na quase sempre cinzenta Londres. Como diz a lenda, na ponta dele, no Palácio de Buckingham, havia de fato um pote de ouro, pelo menos para qualquer político britânico: a rainha Elizabeth 2ª estava oferecendo, exatamente às 20h35 (16h35 em Brasília), o cargo de premiê a David Cameron, 43. A oferta foi feita momentos após a renúncia de Gordon Brown, que pôs fim a 13 anos de governo trabalhista, iniciado em 1997, com Tony Blair. O líder do Partido Conservador tornou-se, assim, o 12º premiê dos 57 anos de reinado de Elizabeth. E também o mais jovem desde lorde Livingstone, em 1812, alguns meses menos do que tinha Blair quando passou a ocupar o casarão número 10 de Downing Street, residência dos governantes britânicos. Mas, ao contrário de Blair, eleito com formidável maioria, Cameron só chegou ao cargo graças ao que ele próprio chamou, no discurso de apresentação como premiê, de "coalizão plena" com o Partido Liberal--Democrata. O Partido Conservador tem apenas 306 cadeiras em um Parlamento de 650. Com as 57 dos liberais, vai-se a 363, mais que a maioria absoluta de 326. Coalizões, comuns na Europa continental, só se formaram três vezes durante o século passado, no Reino Unido. A regra, nos últimos 30 anos, era um governo monocolor, o azul dos conservadores ou o vermelho dos trabalhistas. Trata-se, portanto, de navegar águas praticamente desconhecidas justamente no momento em que o governo terá que tomar "decisões difíceis", como Cameron assumiu no primeiro discurso no cargo. Decisões relacionadas, sempre de acordo com o novo premiê, ao deficit público na altura de 163 bilhões de libras (R$ 430 bilhões); à "reconstrução da confiança no sistema político", abalada por um escândalo sobre despesas dos parlamentares à custa do Tesouro; e aos "profundos problemas sociais".

Barganha
A "coalizão plena" significa que os dois partidos decidiram ficar atados um ao outro durante todo o período de quatro anos que dura um governo. Convém aos dois: aos liberais porque os conservadores poderiam, em dado momento, decidir convocar eleições antecipadas para tentar garantir uma maioria própria, sem reformar o sistema eleitoral, que prejudica os liberais. Aos conservadores, porque evita que os liberais os abandonem na hipótese de que as "decisões difíceis" sejam também impopulares, hipótese quase certa: cortar gastos e aumentar impostos não é exatamente o que o eleitorado aplaude. Nick Clegg, o líder liberal, parece, de todo modo, ter obtido algo menos duro do que o programa conservador previa: em vez de reduzir o imposto sobre heranças, que beneficiaria os mais ricos, haverá uma elevação (para 70 mil libras ou R$ 184 mil) do rendimento abaixo do qual não se cobrará imposto. Mas a filosofia do novo premiê, exposta no discurso que pode ser considerado de posse, é tipicamente conservadora: tira do governo o peso da mudança e joga-o para a sociedade. "Quero ajudar a tentar construir uma sociedade mais responsável, em que nós não perguntamos simplesmente quais são meus direitos mas quais são minhas responsabilidades, uma [sociedade] em que não perguntamos o que me devem mas o que mais eu posso dar."

Gabinete
Combina com essa ortodoxia o fato de que o novo ministro das Finanças será George Osborne, tido como um duro entre os conservadores. Também nas Relações Exteriores, o nome certo era o de William Hague, o que assegura que a posição do Reino Unido sobre a Europa continuará a ser hipercética, contrariando as simpatias que Clegg tem por uma maior aproximação. De todo modo, os liberais terão cinco postos ministeriais, inclusive o de vice-primeiro--ministro para o próprio Clegg. Para os trabalhistas, sobrou um epitáfio elegante, mas curto, de Cameron: disse que, no reinado trabalhista, o Reino Unido tornara-se "mais aberto internamente e com mais compaixão externamente".

Na despedida, Brown troca rudeza por emoção

www.folha.com.br/101319



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