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ENTREVISTA
Chanceler alemão vê oportunidade de reduzir benefícios sociais e trabalhistas para combater crise econômica
Reformas contam mais que rixa com Itália, diz Schröder
DO "FINANCIAL TIMES"
O chanceler (premiê) alemão,
Gerhard Schröder, sabe como encarar uma piada. Quando, no começo desta entrevista, recebeu de
presente uma garrafa de vinho
italiano como compensação por
abandonar seus planos de férias
na Itália, ele levou na brincadeira.
No entanto, a atitude dele com
relação à Itália continua a ser muito séria. Afinal, seus planos de férias cancelados surgiram depois
de uma série de comentários desfavoráveis aos alemães feitos por
políticos italianos, entre os quais o
premiê Silvio Berlusconi.
Ele insiste em que as relações bilaterais mais amplas não foram
prejudicadas, mas manteve sua
decisão, simbólica, quanto às férias. "Não se pode tratar a Alemanha como ela foi tratada", disse.
No começo da entrevista, de
uma hora de duração, concedida
na moderna e imensa Chancelaria
construída em frente ao Bundestag (Parlamento) histórico,
Schröder deixou claro que sua
agenda de reformas para a Alemanha, não a briga diplomática
com a Itália, é a sua prioridade.
"Existe agora um grau de abertura à reforma, na Alemanha, que
não se via há muitos anos. Isso é
muito animador. Devemos aproveitá-lo para implementar as medidas da Agenda 2010", disse ele,
referindo-se ao pacote de propostas de reformas que apresentou
em março. Quatro meses depois,
Schröder está satisfeito com o
progresso obtido, mas argumenta
que ainda resta muito trabalho.
"Tenho um período muito difícil pela frente, para realizar reformas na saúde, no mercado de trabalho e em outras áreas", disse o
chanceler social-democrata.
Até mesmo seus críticos mais
severos reconhecem que o chanceler e sua coalizão de social-democratas e verdes superaram
obstáculos significativos, especialmente a resistência interna à
reforma nos dois partidos.
Muitos economistas acreditam
que Schröder tinha pouca alternativa ao tipo de reforma estrutural que busca enxugar o inchado
aparato da seguridade social alemã, liberalizando o mercado de
trabalho. O desemprego, que caiu
ligeiramente nesta semana para
4,4 milhões de trabalhadores,
ajustado sazonalmente, segue em
nível alto, em termos históricos.
Estagnação
A economia alemã, a maior da
Europa, está em seu terceiro ano
de estagnação, e nenhum dos seis
principais institutos econômicos
alemães crê que o crescimento
deste ano atinja os 0,75% previstos pelo governo. Os custos trabalhistas não-salariais -como planos de saúde, pensões e apoio aos
desempregados- seguem 42%
superiores aos salários líquidos, o
que não estimula as empresas a
realizar novas contratações.
Imediatamente depois de reeleito, em setembro passado, o chanceler parecia pouco disposto a enfrentar os problemas estruturais
da Alemanha. Foi só no começo
deste ano, com o agravamento da
situação econômica, que ele decidiu agir.
Schröder diz que a Agenda 2010
representa a mais audaciosa reforma alemã em décadas. Líderes
empresariais, embora descrevam
as medidas como apenas um primeiro passo, tendem a concordar.
As regras tradicionalmente rígidas de proteção de empregos na
Alemanha serão afrouxadas. Benefícios aos desempregados serão
reduzidos. Cortes de gastos
abrangentes e medidas de aumento da eficiência no setor da
saúde também fazem parte dos
planos.
"Muitas pessoas acreditam que
essas medidas vão longe demais",
disse Schröder, ainda que a resistência inicial, em seu partido e no
movimento sindical, tenha diminuído um pouco. A derrota da
greve da união sindical IG Metall
em junho e a subseqüente crise na
liderança da poderosa organização também são sinais de uma
nova era no país. Um dos mais
fortes lobbies alemães, antes resistente às mudanças, pode agora
mudar de posição.
Apesar da convicção recém-encontrada pelo chanceler na busca
das reformas, entender por que
ele mudou de estratégia em março continua a ser um mistério.
Os críticos alegam que Schröder
sempre foi pragmático e duro em
termos políticos, pronto a mudar
de posição de acordo com as circunstâncias. Eles alegam que, em
março, ele percebeu que era necessário agir para salvar sua pele
política, depois que os social-democratas sofreram derrotas humilhantes em eleições regionais.
O chanceler, que diz que não
tem objeções a ser chamado de
camaleão político, oferece uma
explicação mais elaborada.
Momento certo
"Quando você deseja implementar reformas em uma sociedade próspera como a da Alemanha, é preciso não só saber o que
se quer, mas escolher o momento
certo para agir." O momento surge quando "você sente que existe
o apoio necessário, não só no Parlamento, mas na sociedade".
As pesquisas indicam que, na
sociedade tradicionalmente dirigida por consenso da Alemanha,
a disposição para mudar e aceitar
perdas aumentaram. Mas o chanceler não se dispõe a admitir que
as reformas deveriam ter começado mais cedo. E outras reformas
dolorosas se aproximam, especialmente a das aposentadorias.
"Isso não será possível sem um
fardo extra de custos sociais."
Ao final da entrevista, a atenção
retorna aos assuntos italianos. O
chanceler agradece o vinho, mas
revela um segredo. Prefere os vinhos franceses aos italianos.
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