São Paulo, domingo, 12 de julho de 2009

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Islã inibe apoio do Ocidente, diz líder uigur

Acusada por Pequim de ter instigado a violência, Rebiya Kadeer cobra uma declaração mais forte dos EUA contra a repressão

Presidente do Congresso Mundial Uigur diz que China usa o combate internacional ao terror para endurecer tratamento dado à minoria

LUÍS FERRARI
EDITOR-ADJUNTO DE MUNDO

Apontada por autoridades de Pequim como a responsável pela onda de violência que atingiu a Província chinesa de Xinjiang, a ativista Rebiya Kadeer refuta as acusações e se posiciona como uma versão muçulmana do dalai-lama. Em entrevista à Folha, por e-mail, a presidente do Congresso Mundial Uigur, que vive exilada em Washington, aponta que é mais difícil para os islâmicos uigures angariarem simpatia ocidental contra a repressão chinesa do que foi para os tibetanos budistas em 2008.

 

FOLHA - Autoridades chinesas a acusam de ter instigado confrontos em Urumqi. Como responde a isso?
REBIYA KADEER - Não sou instigadora. É uma prática comum da China me acusar de qualquer coisa que acontece no Turquistão Oriental [como os uigures chamam Xinjiang] e acusar o dalai-lama por qualquer coisa que acontece no Tibete. A China sempre me acusa por seus próprios problemas.

FOLHA - Qual a origem das divergências entre os uigures e os han na China? Que fator pesa mais: econômico, étnico, religioso ou cultural?
KADEER - São todos, econômico, social, político, cultural, religioso e étnico.

FOLHA - Apoia um Estado independente para os uigures?
KADEER - A maioria dos uigures quer independência face à circunstância atual, pois eles não conseguem viver com liberdade na China. Eu luto pacificamente pelo direito dos uigures à autodeterminação.

FOLHA - Espera mais episódios de violência nos próximos dias, com o acréscimo do aparato de segurança chinês em Xinjiang?
KADEER - Espero que não aconteçam mais confrontos nos próximos dias nem no futuro. Mas o aumento das forças de segurança leva a um aumento na tensão regional.

FOLHA - Há algum tipo de negociação em curso entre lideranças uigures e han na China ou no exterior?
KADEER - Estamos abertos para negociações com a China, mas os líderes chineses não têm vontade política para resolver pacificamente a questão do Turquistão Oriental.

FOLHA - Como avalia a reação ocidental à situação em Xinjiang? Os posicionamentos pouco enfáticos de Barack Obama e Hillary Clinton, por exemplo, foram satisfatórios?
KADEER - Somos gratos ao apoio de todos os países do Ocidente e dos países islâmicos, especialmente a Turquia. Agradecemos a preocupação da Casa Branca e da secretária de Estado quanto à repressão no Turquistão Oriental. Mas gostaríamos que eles emitissem uma declaração mais forte de preocupação.

FOLHA - Aparentemente, a repressão no Tibete no ano passado teve mais repercussão internacional que a atual crise dos uigures. Concorda? Por quê? Há relação com religião?
KADEER - Sim. Há um fundo religioso, porque o budismo é considerado pacífico, e o islã, considerado violento até certo ponto. Desde o 11 de Setembro, é mais difícil conseguir apoio no Ocidente se você é muçulmano. Mas gradualmente temos conseguido mais atenção.

FOLHA - Os uigures em Xinjiang têm apoio de algum outro país?
KADEER - Temos um forte respaldo da Turquia e esperamos angariar mais apoio de outros países muçulmanos.

FOLHA - A "guerra ao terror" conduzida pelos EUA desde 2001 serviu de exemplo para uma perseguição mais severa dos uigures na China?
KADEER - Sim. Desde o 11 de Setembro, a China convenientemente usou a guerra global ao terrorismo para justificar suas sexagenárias políticas repressivas no Turquistão Oriental, considerando que os uigures são muçulmanos.

FOLHA - Chineses han alegam que os uigures deveriam ficar felizes na China, pois têm benefícios, como cotas e a isenção da política do filho único. É uma avaliação precisa? Como descreve as regras a que os uigures são submetidos na China?
KADEER - Não é uma descrição precisa. As políticas preferenciais chinesas só existem no papel, não na realidade. A China evoca tais políticas no papel para promover uma lavagem cerebral da população chinesa e inflamar o nacionalismo local contra o povo uigur.

FOLHA - Crê no número oficial de 184 mortos divulgado por Pequim?
KADEER - Relatos não confirmados que chegaram até nós indicam um número bem maior. E a maioria é de uigures.


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