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análise
A mídia, o terror, Pedro e o lobo
LUCIANA COELHO
EDITORA-ADJUNTA DE MUNDO
Cabe à mídia parte do
pânico que se alastrou anteontem pelos EUA e pelo
Reino Unido e contaminou o resto do hemisfério.
A necessidade de alertar
o público para uma ameaça de segurança é inquestionável. Mas não deixa de
ser perturbador que noticiários e jornais se apóiem
mais em informações fragmentadas -sempre acompanhadas de superlativos
e comparações aterradoras- do que em fatos.
É um limiar delicado em
que transitamos nós, jornalistas, ao falar de terror.
Tanto que levou os britânicos "Financial Times",
"Guardian" e "Independent" a se questionarem,
em editoriais, se não haviam errado na extensão
da cobertura sobre o suposto plano de ataque
frustrado pela Scotland
Yard. Num contraste ilustrativo, nos EUA, "New
York Times" e "Washington Post" criticaram o uso
do fato por políticos, mas
não aludiram à sua pronta
aceitação da versão vinda
de Washington e Londres.
Se os conspiradores tinham como levar seu objetivo a cabo, se a ameaça era
iminente, em que ponto o
plano foi debelado -essas
são perguntas deixadas
para depois, muitas vezes
só respondidas ante um
vexame -como quando os
EUA anunciaram a descoberta de um plano para
atacar a Sears Tower (em
Chicago), em junho, e a
"ameaça" não passava de
um grupo de lunáticos
sem meios nem estratégia.
Indagada anteontem
pela Folha se não havia
exagero no alarde, a ombudsman do "Post", Deborah Howell, respondeu
que a cobertura, até aquele momento, lhe parecia
justificada. "Claro que
ainda é cedo para avaliar,
mas o público -certamente quem usa aviões-
quer saber tudo possível a
respeito", avaliou.
O "tudo possível" é o
ponto. Com pouco de concreto a dizer, a cobertura,
contam amigos nos EUA e
no Reino Unido, centrou-se em redundantes entrevistas com viajantes irritados, na repetição do comunicado da polícia britânica e em incontáveis análises de experts a partir de
fiapos de informação.
"Isso é uma característica do jornalismo moderno, com os canais de notícias 24 horas e a internet",
disse à Folha, por telefone, o professor de jornalismo Rosental Calmon Alves, da Universidade do
Texas. "Muitas vezes uma
cobertura intensiva não é
necessariamente [resultado de] má avaliação da informação, mas da falta de
tempo para avaliar."
Dan Georgakas, especialista em abordagem do
terrorismo pela mídia na
Universidade de Nova
York, diagnostica um abuso do termo "terrorista".
"Eu me oponho frontalmente a isso", afirmou à
Folha. "Juntar todos os
grupos e chamá-los de terroristas é confundir o público -e até os responsáveis pela segurança", diz.
O efeito do excesso,
crêem Alves e Georgakas,
pode ser um tiro pela culatra. Em vez de tornar os cidadãos mais alertas, a repetição de "ataques desbaratados" pode anestesiá-los, como se "ameaça terrorista" fosse só mais uma
dor-de-cabeça diária de
uma grande cidade.
Ou, como classifica editorial do "FT", uma pequena vitória dos terroristas,
que conseguiram parar a
vida de milhares manipulando o medo coletivo.
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