São Paulo, domingo, 12 de agosto de 2007

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Consumo de leite na China afeta tradição européia

Franceses reclamam do preço de queijos e iogurtes; aumento atinge toda a UE

Pouco rentável no passado, leite virou bom negócio para os produtores europeus, mas os consumidores sentem os efeitos no bolso

CÍNTIA CARDOSO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE PARIS

A recente mudança dos hábitos alimentares dos chineses provocou uma guinada nos preços do leite e de produtos lácteos na União Européia. Mas a novidade, uma boa notícia para os pecuaristas europeus, já inquieta os consumidores.
Impulsionada pelo vigoroso crescimento econômico, a China vê explodir a demanda do consumo de proteínas e de leite, artigos raros nas mesas chinesas até os anos 90. "Tenho o sonho de fornecer a cada chinês, especialmente às crianças, doses diárias de leite", declarou recentemente Wen Jiabao, primeiro-ministro da China.
O apetite voraz por esse tipo de alimento na China foi responsável pelo crescimento de 13,46% no consumo do produto no ano passado -e nenhum mercado no mundo tem um dinamismo tão grande e tanta influência nas exportações da União Européia, o maior produtor mundial de leite.
"Essa alta dos preços do leite está alinhada a uma alta generalizada dos preços das commodities. O leite está no topo da cadeia da pecuária, logo os aumentos de grãos e de outros produtos para a alimentação animal têm um impacto direto nos preços do setor leiteiro", diz Kona Haque, economista-chefe da Economist Intelligence Unit. Por trás da explosão das cotações de commodities está a demanda chinesa. As importações da Índia e da Rússia também têm sido relevantes.
Os altos preços fizeram ainda outros mercados tradicionais da Europa, como o Oriente Médio e o norte da África, aumentarem suas importações. Temerosos de altas ainda mais expressivas, muitos desses países têm antecipado as compras de laticínios da UE.
Além disso, o cenário internacional parece apontar para a manutenção da alta dos preços dos laticínios. Na avaliação da economista da EIU, a expansão da conversão de pastagens em áreas para o cultivo de cana, soja e milho para a produção de biocombustíveis em diversos países deve manter a cotação dos grãos em alta pelos próximos anos. A cadeia do leite deve acompanhar a tendência.
Até no Brasil o produto está ficando mais caro, embora aqui a alta seja causada principalmente pelo aumento da demanda interna.

Camembert mais caro
Os consumidores europeus já sentem no bolso os impactos. A Danone, maior companhia mundial de laticínios, a Nestlé e a Unilever começaram a aumentar os preços dos produtos no mês passado. A decisão provoca chiadeira na França, onde queijos e iogurtes são itens básicos de alimentação.
"Falta 1 bilhão de litros de leite para atender à demanda do mercado da UE", argumenta o presidente da Alta (Associação da Transformação Leiteira), associação sediada na França, Olivier Picot.
Além de fatores externos, a carência se deve também a um forte crescimento interno do consumo de queijos e de outros derivados de leite nos últimos quatro anos.
E, como se não bastasse, a produção leiteira européia tem encolhido. A safra 2006-2007 registrou os volumes mais baixos dos últimos 15 anos. Na França, os pecuaristas vinham preferindo se dedicar à pecuária de corte, até então mais rentável. Na Alemanha, maior produtor de leite da UE, os produtores trocaram a atividade pecuária pelo cultivo de cereais.
Hoje os preços do leite vivem um boom, mas entre 2003 e 2006 a atividade viu as cotações internacionais despencarem, o que afugentou muitos produtores. Analistas do setor estimam que há, na França, um déficit de pelo menos 100 mil vacas leiteiras.
E, embora a alta de preços beneficie os produtores de leite, nem todos estão entusiasmados: "Esse aquecimento pode causar problemas para os empresários da indústria agroalimentar", pondera Eric Alain, do Ministério da Agricultura e da Pesca francês.


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