São Paulo, quarta-feira, 12 de setembro de 2001

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

TERRORISTA

Suspeito de ter organizado ação vale US$ 5 mi para os EUA

Osama bin Laden está escondido no Afeganistão, com apoio do Taleban

Saudita é responsável por atentado com 224 mortes e 5.000 feridos em 98

Associated Press
O terrorista saudita Osama bin Laden, que é herdeiro de um rico empresário da construção civil, em seu refúgio, no Afeganistão


JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

O personagem é misterioso, mesmo quanto a detalhes biográficos e atributos físicos que constam de uma ficha em que o governo norte-americano oferece US$ 5 milhões para quem localizá-lo e permitir sua captura.
Osama bin Laden nasceu na Arábia Saudita "em torno" de 1957. Teria 1,94 m ou mais que isso. Pesaria de 62 a 71 quilos.
Seus cabelos são castanhos escuros. Com sua barba em geral desalinhada, olhos opacos e raríssimos sorrisos, ele costuma se vestir com simplicidade e andar com um cajado numa das mãos.
Se não fosse o "inimigo público número um" e pudesse circular pelas ruas comerciais das grandes cidades da Europa e dos Estados Unidos, ninguém, ao vê-lo, diria se tratar do herdeiro de US$ 300 milhões e de um fanático engajado desde 1982 na chamada guerra santa islâmica.
O homem que pode estar por detrás da maior e mais sangrenta operação terrorista da história ocidental é também um hábil semeador de falsas pistas sobre sua história e seu paradeiro.
Um único exemplo. Um jornal italiano publicou há dois anos que Bin Laden foi hóspede de um campo de treinamento de combatentes financiado pela CIA -central de inteligência norte-americana- nas imediações de Istambul, na Turquia.
O que até faria sentido, já que Washington auxiliou indiretamente os inimigos das tropas de ocupação soviética que permaneceram até 1989 no Afeganistão. Foi, no entanto, no próprio Afeganistão que Bin Laden se iniciou nas artes da guerra, conforme se documentou posteriormente.
Ou ainda: ele nunca se refugiu em Londres ou na Suíça ao precisar abandonar o Sudão, em 1996, segundo versão fornecida na época por "fontes diplomáticas" anônimas. Mais uma vez, foi no Afeganistão que encontrou refúgio.
O terrorista responsável pelas bombas que em abril de 1998 destruíram as embaixadas norte-americanas no Quênia e na Tanzânia, com um saldo de 224 mortes e 5.000 feridos, é o sétimo filho de Mohammed Awad bin Laden, que morreu em 1970 e foi o maior e mais rico empresário da construção civil da Arábia Saudita.
Mohammed, imigrante iemenita, chegou nos anos 50 a dispor de uma fortuna maior que a da família real saudita, fazendo empréstimos aos cofres públicos e recebendo, em troca, o monopólio dos contratos em seu setor.
Osama, ainda menino, entrou em contato com doutores respeitáveis da religião islâmica porque seu pai anualmente hospedava centenas de romeiros que visitavam os lugares santos.
A religiosidade ganhou sua primeira tradução política quando, no fim dos anos 70, Bin Laden, casado desde os 13 anos com uma parente síria e estudante em administração pública na Universidade Rei Abdul-Aziz, foi convidado por amigos que conheceu na Fraternidade Islâmica, uma confraria estudantil, a visitar campos em que voluntários afegãos e de outras origens árabes treinavam para combater o regime pró-soviético de Cabul.
Tornou-se, pela mesma causa, um coletor de fundos junto a seus irmãos e outros milionários sauditas. A partir de 1982, se engaja como combatente eventual. Dois anos depois, monta um centro afegão de acolhimento a voluntários vindos de outros países.
O engajamento se aprofunda em 1986. Bin Laden passa a comandar suas próprias tropas, embrião dos cerca de 10 mil partidários que os serviços ocidentais de inteligência hoje atribuem a ele. Entre seus subordinados (ou mercenários), militares formados na Síria e Egito e jovens sunitas engajados na causa teocrática. Participou ao todo de cinco grandes batalhas, antes da retirada soviética, em 1989.
O colapso da ex-URSS torna o Afeganistão uma causa menos importante para os governos ocidentais com os quais o trono saudita mantém tradicional afinidade. Foi então inevitável que Bin Laden entrasse em conflito com o país em que nasceu.
Proibido de início de fazer proselitismo e, em seguida, com seu passaporte confiscado, mobiliza seus irmãos, amigos da família real, e obtém uma autorização para "tratar de negócios" no Sudão, cujo governo islâmico não lhe seria potencialmente hostil.
Mas se torna aos poucos um hóspede incômodo. "Chocado" com a participação norte-americana na Guerra do Golfo e tendo aderido ao antiamericanismo gerado pela postura dos Estados Unidos no Oriente Médio, seu inimigo é agora a única superpotência do planeta.
A Arábia Saudita tenta sequestrá-lo. Seria o primeiro dos cerca de 40 atentados malsucedidos ou abortados, preparados contra sua pessoa. Esse gato de sete vidas se torna gradativamente um mito internacional, com o óbvio auxílio de Washington, que não desconhece a dimensão didática da personalização do inimigo.
Sem a nacionalidade saudita, que perdeu em 1994, provável mentor da explosão de um carro-bomba em Riad, no ano seguinte, Bin Laden se torna o objeto de negociações entre os governos sudanês e norte-americano, que exige sua imediata extradição.
Ele então se refugia em 1996 novamente em território afegão, de onde não teria mais saído e onde também contaria com a simpatia quase irrestrita do Taleban, movimento islâmico fanático que aos poucos assume o controle de quase todo o país.
Bin Laden está por detrás do atentado na base militar norte-americana de Khobar, em território saudita, que matou 19 militares e feriu outros 400.
Em seu refúgio afegão, dá em 1997 entrevista à CNN. A imagem que fornece é de um fanático primário, para quem o mundo se divide com nitidez entre o bem e o mal, situando-se no segundo pólo os EUA e Israel.
Saltando do islamismo árabe ao pan-islamismo, auxilia os rebeldes da Tchetchênia ou qualquer movimento que precise de dinheiro. Não gasta propriamente a herança do pai. É ainda um coletor de fundo de simpatizantes para sua sangrenta causa, que, desde 1998, se exprime por meio de uma chamada Frente Internacional.

Leia mais sobre os atentados nos EUA na Folha Online


Texto Anterior: Carro-bomba atingiu torres do WTC em 93
Próximo Texto: Muçulmanos americanos criticam mortes
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.