São Paulo, domingo, 13 de fevereiro de 2011

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Falta maturidade ao Brasil, dizem EUA

Telegramas obtidos pelo WikiLeaks mostram reação de americanos a campanha pelo Conselho de Segurança

Ex-embaixador sugeriu que compra de caças americanos poderia melhorar a relação entre os dois países

CLAUDIA ANTUNES
DO RIO

O Brasil ainda não é "maduro" o suficiente para ser um ator global. Precisa ser "encorajado" pelos EUA a assumir "responsabilidades", aprendendo a "confrontar" outros países se necessário.
Avaliações como essa de dezembro de 2009, em tom paternalista e às vezes irônico, predominam na reação de diplomatas americanos em Brasília à campanha brasileira por uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU.
É o que mostram telegramas enviados a Washington entre 2004 e fevereiro de 2010, obtidos pela organização WikiLeaks. A Folha teve acesso aos textos antes que eles fossem divulgados no site do grupo (www.wikileaks.ch).
O debate sobre a ampliação do CS, em tese responsável pela paz internacional, voltou à tona quando o presidente americano, Barack Obama, apoiou a candidatura da Índia, há dois meses. Obama virá ao Brasil nos dias 19 e 20 de março.
Os membros permanentes do órgão, com poder de veto, são os mesmos desde a criação da ONU, em 1945: EUA, Rússia, China, França e Reino Unido. A perspectiva brasileira de integrar essa cúpula já existia na época.
O tema marcou a relação entre os governos de Lula (2003-2010) e de George W. Bush (2001-2009) por dois motivos: o então secretário-geral da ONU, Kofi Annan, estabeleceu um grupo para tentar conciliar as propostas de reforma, e Lula fez dela uma prioridade.
Nos telegramas, o assunto é sempre abordado pelos brasileiros. O ex-chanceler Celso Amorim brinca com a fama que tinha, dizendo que não queria parecer "obcecado" com o CS.
Em 2005, um ano depois de o Brasil assumir o comando da força de paz no Haiti, um despacho relata o "desapontamento" de Amorim quando os americanos disseram que só aceitariam uma ampliação "modesta", com duas novas cadeiras (Bush apoiaria oficialmente apenas a candidatura do Japão).
Os EUA, que invadiram o Iraque sem autorização do CS, não queriam a reforma.
Preferiam contornar a ONU com a proposta de uma "parceria pela governança democrática".

"DESESPERO"
Apesar da "excelente" química entre Bush e Lula -que sugeriu ao americano deixar a reforma como "legado"-, são exatamente dessa época os informes mais críticos.
O ex-embaixador Clifford Sobel, um empresário republicano, diz que o Brasil buscou "desesperadamente" o apoio dos EUA, mas "fracassou em assumir o papel de liderança que o faria um candidato forte".
A presença do país no CS em 2004 e 2005, em uma das dez cadeiras rotativas, foi marcada por "cautela e equívoco", escreve Sobel.
Os americanos se irritam com a ideia brasileira de "imparcialidade", que impedia o alinhamento com os EUA contra países como Cuba e Venezuela. Para os diplomatas, o Brasil se esforçava para manter "relações amigáveis" com todos devido à candidatura ao CS.
Telegramas falam do fracasso brasileiro em garantir votos de africanos, de árabes e da China, que também joga contra a ampliação porque não quer a presença de Japão e Índia. Ironizam a "liderança natural" do Brasil na América Latina.
Em 2009, quando prepara reunião de Amorim com a secretária de Estado Hillary Clinton, um emissário do Itamaraty inclui a ONU entre os assuntos da pauta.
Sobel nota a falta de menção à concorrência para a compra dos caças da FAB.
"Uma oferta bem-sucedida da Boeing para vender os F-18 ao Brasil tem o potencial de fortalecer essa parceria de modo inédito", escreve.
O embaixador americano chama de "baleia branca" o submarino a propulsão nuclear brasileiro, e afirma que sua única função real será deixar o país mais perto das potências do CS, que contam com o artefato.


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