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IRAQUE NA MIRA
Organização obtém só um quarto do dinheiro necessário em caso de guerra; deslocados devem chegar a 3,5 milhões
ONU se diz despreparada para refugiados
FERNANDO CANZIAN
DE WASHINGTON
As Nações Unidas estão prevendo uma "catástrofe humana"
como consequência de um ataque
dos EUA contra o Iraque, com ou
sem o apoio de outros países-membros do Conselho de Segurança da organização.
A ONU e a Refugees Internacional, uma das mais conceituadas
organizações que tratam do assunto, estimam em 3,5 milhões o
número de refugiados que o conflito deve provocar.
Do total, cerca de 1,5 milhão poderá cruzar as fronteiras do Iraque em direção à Turquia e ao Irã,
principalmente.
A meta da ONU era arrecadar
US$ 60 milhões até o dia 15 de janeiro passado para atender a pelo
menos 600 mil pessoas que deixarem o país. Ontem, havia somente
US$ 16,6 milhões em caixa, o suficiente para pouco mais de um
quarto da meta almejada.
"Não temos a menor condição
de lidar com a tragédia que vai resultar dessa guerra. Estamos dizendo isso de modo consistente
desde outubro, sem obter resposta", disse à Folha Yusuf Hassan,
porta-voz do Alto Comissariado
da ONU para Refugiados.
Segundo ele, dos US$ 16,6 milhões arrecadados até agora, US$
15 milhões foram doados pelos
EUA. Como parece longe de um
fim a discussão sobre a participação ou não de outros países no
conflito, a ONU não espera novas
contribuições no curto prazo.
O resultado é que, mesmo que
entre mais dinheiro, o prazo para
o planejamento da ajuda humanitária já terá estourado.
Kenneth Bacon, presidente da
Refugees International e ex-porta-voz do Pentágono durante seis
anos do governo Bill Clinton, afirma que, embora "essa seja a guerra mais anunciada de todos os
tempos", não está havendo uma
discussão séria sobre ""os terríveis
custos humanitários que devem
resultar do conflito".
Segundo números apresentados por Bacon ontem à Folha, o
Irã está se preparando para receber cerca de 200 mil refugiados
em sua fronteira com a ajuda da
ONU. "O restante deve ficar sem
assistência. E estamos falando de
cerca de 3 milhões de pessoas
dentro e fora do país."
O Iraque tem hoje cerca de 23
milhões de habitantes.
Bacon qualifica de "imperdoável" a qualidade da discussão sobre o assunto até aqui. "Tivemos
todo o tempo do mundo e não fizemos nada. Só se fala na guerra,
com detalhes milimétricos", diz.
"Os grandes deslocamentos humanos serão inevitáveis."
Até antes do balanço negativo
na arrecadação de fundos, a ONU
vinha se comprometendo a cuidar de 600 mil refugiados, englobando nesse número somente as
pessoas que deixarem as fronteiras do Iraque em direção a outros
países.
As estimativas de Kenneth Bacon para os "refugiados internos", que devem fugir dos bombardeios em Bagdá e cidades
maiores, giram em torno de 900
mil a 1,1 milhão de pessoas.
Ontem, funcionários do Programa Mundial de Alimentação
da ONU informaram que já estão
estocando comida na Jordânia e
em outros países da região.
"A ONU está buscando uma solução pacífica para o conflito, mas
não podemos ignorar o fato de
que a guerra é iminente", disse
Maarten Roest, porta-voz do programa. "Estamos tentando estocar alimentos em toda a região.
Nossa projeção é que temos de estar prontos para atender a cerca
de 900 mil pessoas por um período de até dois meses e meio." Segundo cálculos do programa, é
necessária uma tonelada de comida para alimentar 60 pessoas por
um mês.
Bacon afirma que os EUA poderiam ser "mais responsáveis" na
discussão sobre o que fazer com o
Iraque e sua população após o
conflito. Na sua opinião, a qualidade do tratamento dado às vítimas da guerra vai determinar, em
boa medida, a aceitação das tropas americanas no Iraque.
Especialistas consultados em
Washington afirmam que não há,
até aqui, comissões organizadas
para discutir pontos cruciais do
Iraque pós-guerra.
"O que vai ser feito, por exemplo, do Exército e da polícia de
Saddam Hussein após o conflito?
Serão todos simplesmente presos?", questiona Bathsehba Crocker, do Council on Foreign Relations (conselho de relações internacionais).
Outra preocupação levantada é
como organizar um governo de
transição ocidental em uma sociedade eminentemente religiosa.
"O risco de conflitos é imenso.
Não temos também nenhuma
idéia do grau de comprometimento da sociedade iraquiana hoje com Saddam Hussein", diz
Crocker.
Para Bacon, os americanos estão agindo com um "otimismo
exagerado". "Parece que esperamos ser recebidos em Bagdá com
flores e chocolates", diz.
Com agências internacionais
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