São Paulo, terça-feira, 13 de abril de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Para militares e estrategistas americanos, atraso no calendário político pode incendiar ainda mais o país

Violência mostra fragilidade da transição

Antonio Scorza/France Presse
Soldado norte-americano passa por um outdoor com propaganda da Sony ao fazer sua patrulha em avenida do centro de Bagdá


THOM SHANKER
DO ""NEW YORK TIMES", EM WASHINGTON

Os estrategistas políticos do Pentágono e militares americanos no Iraque temem que, sem um processo político que leve à criação de um governo novo e popular, as ações militares conduzidas para restaurar a ordem em cidades sunitas e xiitas precisem ser repetidas nos próximos meses.
Eles acham que a transformação política no Iraque não está acompanhando a luta para restaurar a segurança em áreas que as tropas americanas já tinham capturado na invasão, um ano atrás.
Faltando menos de três meses para o dia 30 de junho, a data em que a força de ocupação liderada pelos EUA deve entregar a soberania a um governo iraquiano, o processo pelo qual a transição se dará continua incerto.
""Podemos derrotar esses sujeitos [os insurgentes]", disse um militar. ""Mas, se o lado político não nos acompanhar, vamos ter de fazer tudo de novo depois de 1º de julho, e em setembro outra vez, no ano seguinte e no outro."
Essas avaliações críticas destoam das descrições feitas pelo governo Bush de um movimento constante rumo à soberania no Iraque e também das declarações otimistas feitas por oficiais de alta patente e funcionários civis em Washington e Bagdá. Bush insiste em que a transferência terá lugar conforme o previsto.
Oficiais e funcionários em Washington e no Oriente Médio se mostraram críticos da liderança iraquiana emergente e até mesmo da população do Iraque, por não agirem mais prontamente para criar um país estável e democrático, após décadas de ditadura.
Eles observaram com atenção especial, e algum nervosismo, quando líderes do Conselho de Governo Iraquiano, indicado pelos EUA, tentaram negociar uma solução política para pôr fim ao levante em Fallujah. Vários membros do conselho expressaram sua oposição ao cerco americano.
O administrador civil americano do Iraque, Paul Bremer, disse à NBC: ""Sempre dissemos que há duas dimensões para enfrentar os problemas do Iraque. Uma delas, é claro, é a dimensão militar. Mas a outra consiste em criar uma perspectiva política para os iraquianos, passando cada vez mais responsabilidade para eles. Trabalhamos nisso há meses".
A tarefa militar atual consiste em combater guerrilheiros sunitas, milícias xiitas, terroristas estrangeiros, quadrilhas criminosas e, nas palavras de um funcionário do Pentágono, ""pessoas que simplesmente odeiam os EUA".
Essa missão, dizem os funcionários do Pentágono e oficiais militares, será difícil -um oficial descreveu as atuais operações de combate como ""escalar um vulcão em erupção".
Os comandantes dizem não duvidar de que vão conseguir cumprir a missão, em vista de sua força militar superior, desde que tenham apoio suficiente de Washington e da população americana. Mas também dizem que vêem nas violentas ruas do Iraque provas amplas de que os EUA ainda não ofereceram uma alternativa política suficientemente atraente para conquistar e manter o apoio público iraquiano real.
A tensão entre o ritmo das operações militares e dos avanços políticos é intensificada, naturalmente, em momentos de combate renovado. Mas algumas queixas nesse sentido já vinham sendo formuladas por funcionários do Pentágono e oficiais nos meses anteriores, relativas à lentidão e à centralização excessiva da burocracia da ocupação, em Bagdá, enquanto vários cargos importantes continuavam vagos devido à dificuldade de indicar pessoas no Iraque.
Alguns funcionários dizem temer que o tempo esteja se esgotando. O verdadeiro prazo final, diz um planejador do Pentágono, não é 30 de junho, quando a soberania deve ser transferida a um novo governo iraquiano ainda não foi escolhido, mas ""o momento em que o consentimento dos iraquianos vai acabar".

Tradução de Clara Allain


Texto Anterior: Iraquianos mudam de lado e combatem EUA
Próximo Texto: EUA limitam informação e criticam TVs árabes
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.