São Paulo, quinta-feira, 13 de maio de 2004

Próximo Texto | Índice

IRAQUE OCUPADO

Republicano diz que imagens "vão além" do que já foi divulgado; Rumsfeld defende algumas técnicas usadas

Novas fotos de tortura chocam senadores

DA REDAÇÃO

Imagens inéditas de tortura e humilhação sexual de iraquianos por militares americanos mostradas ontem no Senado dos EUA chocaram vários congressistas ao exibir cenas que, segundo o líder republicano (governista) na casa, vão "muito além nas situações" expostas em imagens divulgadas nas últimas duas semanas pela imprensa. As cenas, disseram senadores, reforçam a necessidade de punir os responsáveis.
Pouco antes da sessão que gerou críticas contundentes e preocupação entre os legisladores, o secretário da Defesa, Donald Rumsfeld, defendeu parte das técnicas de coação empregadas na prisão bagdali de Abu Ghraib, rechaçando afirmações de que elas violassem as Convenções de Genebra, que garantem tratamento humano a prisioneiros de guerra.
Rumsfeld não fez menção à tortura nem ao constrangimento sexual que chocaram os congressistas, abusos pelos quais ele já havia assumido a responsabilidade, em última instância, por ser o último na cadeia de comando antes do presidente George W. Bush. Mas disse, a um comitê do Senado, que técnicas como a supressão do sono, alterações alimentares e a manutenção de prisioneiros em posições de estresse foram aprovadas por advogados do Pentágono e condizem com as convenções.
Em resposta, o senador democrata Richard Durbin afirmou que essas técnicas "vão muito além" das Convenções de Genebra (1949). O artigo 26 da Terceira Convenção, por exemplo, determina que "rações diárias de comida devem ser providenciadas em quantidade, qualidade e variedade suficiente para manter os prisioneiros com boa saúde" e que "medidas disciplinares coletivas envolvendo alimentação são proibidas". Já o artigo 89 permite a supressão de privilégios garantidos pelas convenções no caso de sanção disciplinar, mas enfatiza que "em nenhum caso as punições devem ser desumanas, brutais ou perigosas à saúde do prisioneiro".

"Descida ao inferno"
Numa sessão que durou cerca de três horas -com 45 minutos dedicados à exibição de slides- deputados tiveram acesso a mais de mil imagens de prisioneiros iraquianos em Abu Ghraib. Segundo a TV CNN, cerca de 400 retratam abusos ou tortura.
Caberá ao governo decidir se as imagens serão divulgadas.
"Eu diria que, pelo menos para mim, o que vimos é aterrador. É consistente com as fotos vistas na imprensa até agora, mas vai além em vários aspectos em termos das atividades retratadas", disse o senador Bill Frist, líder republicano.
"Há cenas horríveis. Eu me senti descendo ao inferno, e, infelizmente, isso é nossa criação", disse Durbin. "Quando você começa a pensar no sadismo, na violência, na humilhação sexual, você desiste, não dá para agüentar."
Um exemplo é uma foto que, segundo fontes da CNN no Pentágono, mostra prisioneiros sodomizados com lâmpadas químicas -tortura citada no relatório investigativo do general Antonio Taguba. Na semana passada, Rumsfeld, que já tivera acesso às fotos tiradas pelos próprios encarregados da prisão, já dissera que as novas imagens mostrariam "coisa muito pior".
O Departamento da Defesa está conduzindo uma extensa investigação sobre a tortura no Iraque, enquanto o Congresso tem realizado sucessivas audiências sobre o caso com membros do governo e oficiais militares. Democratas pedem a renúncia de Rumsfeld, homem forte do governo Bush.
"Eles [os responsáveis] devem ser indiciados criminalmente", disse a senadora democrata Dianne Feinstein. Mais dois militares foram indiciados. Os sargentos Javal Davis, 26, e Ivan "Chip" Frederick 2º serão submetidos a corte marcial, mas a data não foi marcada. Até agora, nove militares já foram indiciados.
A general Janis Karpinski, comandante da brigada responsável por Abu Ghraib quando os abusos ocorreram, afirmou que foi contra ceder o controle da prisão a oficiais de inteligência, mas foi desautorizada.
Segundo o general Taguba, nenhum comandante deu ordem de tortura, embora tenha havido "falhas de comando". Mas, segundo o jornal "The Washington Post", Karpinski coloca no centro das decisões que deram margem aos abusos o general Ricardo Sanchez, chefe das tropas no Iraque, e o general Geoffrey Miller, o novo responsável pelas prisões no Iraque e ex-responsável por Guantánamo -a prisão em Cuba onde os EUA mantêm suspeitos de terrorismo e onde, segundo Rumsfeld, não são aplicadas as Convenções de Genebra.
Segundo a general, Miller lhe disse, em um encontro antes de assumir, que queria tornar Abu Ghraib "igual a Guantánamo".
Taguba confirmou que Karpinski protestou, mas enfatizou que ela manteve a autoridade sobre parte dos guardas, o que a torna imputável.
Também a recruta que se tornou o maior símbolo do escândalo ao ser fotografada maltratando prisioneiros, Lynndie England, afirmou ontem que agiu sob ordens e que as fotos em que aparece seriam usadas como instrumento de pressão psicológica. England, 21, será submetida à corte marcial e poderá ser condenada a 15 anos de prisão.


Com agências internacionais

Próximo Texto: Frases
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.