São Paulo, quinta-feira, 13 de maio de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Filho do xá pede pressão brasileira ao Irã

Ex-príncipe herdeiro do país persa diz à Folha que regime só ganha tempo com mediação do Brasil na questão nuclear

Reza Pahlavi 2º afirma ser problemático não estarem programados encontros entre Lula e integrantes do bloco opositor iraniano


ANDREA MURTA
DE WASHINGTON

Décadas após ver seu pai derrubado pela Revolução Iraniana (1979), o ex-príncipe herdeiro do Irã, Reza Pahlavi 2º, 49, virou um dos mais bem conectados -e controversos- opositores do regime dos aiatolás. De Washington, onde vive sua família, ele enviou ontem um recado ao Brasil: "Se querem mediar um acordo nuclear com Teerã, tudo bem, mas não pensem que isso é suficiente".
Pahlavi 2º se referia à viagem, neste final de semana, do presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva ao Irã. Lula pretende articular um acordo de troca de material nuclear para evitar a imposição de novas sanções do Conselho de Segurança da ONU ao Irã por seu programa de enriquecimento de urânio.
Os EUA e as potências ocidentais creem que o programa iraniano visa a bomba -Teerã diz buscar energia. O ex-príncipe é cético quanto à chance de a proposta de mediação do Brasil gerar solução. Também afirma ser problemático não estarem programados encontros com membros da oposição: "O único caminho real é apoiar a sociedade civil".
Ele já dissera, em entrevista, que uma das melhores alternativas ao regime atual seria uma monarquia parlamentarista. Mas, à Folha, defendeu só um sistema democrático secular e disse que, enquanto está pronto para servir a seu país, não age por pretensões de poder futuro.
Atualmente, Pahlavi 2º divide seu tempo apoiando a dissidência entre os EUA e a Europa. Autor de três livros sobre o Irã, ele diz ser financiado por compatriotas opositores e por sua mãe, Farah, viúva do xá Reza Pahlavi.

 

FOLHA - O que acha da tentativa de mediação do Brasil com Teerã?
REZA PAHLAVI 2º
- Não tenho razão para crer que isso possa trazer uma reviravolta. Acho que é mais uma tática do regime de deixar o tempo passar. Se o Brasil falhar, amanhã o mediador será a Argentina, depois o Peru... é enrolação. Sou o primeiro a defender que o Irã tem direito à tecnologia nuclear para energia. Mas, se é esse o propósito, por que falta transparência? Estamos quase sob ameaça de ataque militar por causa da intransigência do regime.

FOLHA - O que acha que o Brasil deveria fazer?
PAHLAVI 2º
- Meu conselho é: não aposte todas fichas em uma coisa só. Se [o Brasil] quer dar ao processo de negociação mais uma chance, tudo bem, mas ao mesmo tempo aumente a pressão. De toda forma será necessário engajamento com a sociedade. O melhor investimento que você pode fazer é na democratização, que é a maior garantia contra [riscos da] proliferação nuclear. O mundo vai acabar percebendo que o problema está no regime em si.

FOLHA - Lula não planeja se encontrar com opositores...
PAHLAVI 2º
- Por duas razões: a) não vão deixar; e b) por agir no mesmo padrão de falar com o governo como se ele representasse todo o país. Governos estrangeiros são limitados no que podem fazer porque podem ser acusados de interferência. Mas há um limite para até onde o mundo pode se esconder por trás da realpolitik ou dos pretextos diplomáticos.

FOLHA - O Brasil crê que sanções só serviriam para endurecer o regime. O sr. concorda?
PAHLAVI 2º
- Sanções não podem ser o objetivo. Podemos discuti-las como meio para um fim. Se você aumenta as sanções sem chegar a forçar a queda do regime, está só prejudicando a população. Não adianta apertar mais um pouquinho. Quanto mais empobrecida a sociedade e a oposição, melhor para o governo.

FOLHA - Como o sr. propõe o engajamento com a população?
PAHLAVI 2º
- O "movimento verde" [do líder opositor reformista Mir Hossein Mousavi] precisa da chance de se reagrupar fora do Irã. Estou fazendo tudo o que posso para facilitar isso, porque o movimento não sobreviverá sem colegas ajudando do lado de fora. Até o ponto em que o regime esteja cedendo à pressão interna -eventualmente com greves trabalhistas generalizadas, particularmente no setor petrolífero- há muito o que fazer. Parte disso depende da cooperação da comunidade internacional. Não nos ajuda, por exemplo, quando empresas vendem tecnologia que ajuda o governo a monitorar comunicações, como a Siemens e a Nokia fazem. Por outro lado, pode-se ajudar o povo a burlar o monitoramento dando acesso livre à informação. Isso está ao alcance da comunidade internacional.

FOLHA - O sr. tem contato com Mousavi?
PAHLAVI 2º
- Bem, tenho tomado cuidado para não expor as pessoas. Claro, meus laços são bem disseminados, não apenas com a oposição, mas também dentro da estrutura do regime, na Guarda Revolucionária. É preciso dar aos elementos do regime que estão desiludidos esperança de reintegração. O princípio da anistia é um fator chave. Não posso ver um cenário de mudança não violenta sem a participação das forças coercitivas.

Correspondente narra o bastidor desta entrevista

www.folha.com.br/101324



Texto Anterior: Foco: Pelo Twitter, Hugo Chávez anuncia nacionalização de universidade privada
Próximo Texto: Frases
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.