São Paulo, sexta-feira, 13 de junho de 2008

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Presos de Guantánamo terão proteção legal

Em decisão histórica por 5 votos a 4, Suprema Corte determina que suspeitos de terrorismo podem recorrer à Justiça civil americana

Bush diz que respeita, mas não concorda com parecer; grupos de direitos humanos e ONU apóiam a disposição da mais alta Corte dos EUA


DA REDAÇÃO

A política antiterrorismo de George W. Bush sofreu ontem severo golpe com a decisão da Suprema Corte de permitir que prisioneiros de Guantánamo recorram aos tribunais civis dos EUA para fazer valer direitos que lhes foram negados.
Em apertada votação de 5 a 4, prevaleceu a posição do relator, Anthony Kennedy, de que "as leis e a Constituição devem prevalecer em períodos extraordinários". A seu ver, as normas militares em vigor são "inadequadas", ao qualificarem os supostos terroristas de "combatentes inimigos ilegais", sem que possam recorrer ao habeas corpus ou a procedimentos de defesa que beneficiam réus de tribunais civis.
O presidente Bush, que estava em Roma, disse que obedeceria à decisão -"o que não significa que tenha que concordar com ela"- e declarou ter afinidades com os juízes que votaram contra o relator. "Estudaremos o caso para saber se há necessidade de novas leis para proteger o povo americano."
A Suprema Corte por duas vezes contestara o limbo jurídico em que os detentos estavam submersos em Guantánamo -para o Pentágono, nessa base militar dos EUA em Cuba eles não estavam sob jurisdição das leis americanas, e o status especial lhes tira do escopo da legislação internacional, como as convenções de Genebra sobre os direitos dos prisioneiros de guerra. Mas Bush, então com maioria no Congresso, criou em 2006 legislação para contornar as limitações criadas.
Embora a decisão de ontem esteja ainda sujeita a ambigüidades que os juízes federais deverão esclarecer -eles se reunirão para analisar as 90 páginas do voto de Anthony Kennedy- a votação de ontem na Suprema Corte foi mais longe ao negar a Guantánamo, com quase 300 prisioneiros, o princípio da extraterritorialidade.
Parte dos prisioneiros, capturada no Afeganistão em 2001, não tem culpa ou acusação formalizada. O Pentágono diz ter informações para a abertura de processos contra 80 deles. Algumas das confissões foram obtidas por meio de técnicas coercitivas como a simulação de afogamento -que o Pentágono não considera tortura, mas muitos americanos sim.

"EUA mais vulneráveis"
O voto mais eloqüente contra o relator partiu ontem do conservador Antonin Scalia. Disse que seu país, em guerra contra o radicalismo islâmico, ficará mais vulnerável, o que "quase certamente provocará a morte de mais americanos".
Teve apoio de três juízes conservadores. Com o relator, conservador moderado que acabou por reverter a maioria, votaram os quatro juízes liberais.
O virtual candidato republicano à Casa Branca, John McCain, disse que é preciso respeitar a decisão dos juízes e lembrou que defende o fechamento da prisão.
Seu virtual adversário democrata, Barack Obama, afirmou que a Suprema Corte rejeitou a tentativa de Bush de criar "um buraco negro em Guantánamo". Disse que a decisão volta a dar credibilidade jurídica aos EUA e supera a falsa oposição entre combater o terrorismo e respeitar o habeas corpus.
Brian Mizer, advogado de Salim Ahmed Hamdan, ex-motorista de Osama bin Laden, disse que se baseará na decisão da Suprema Corte para anular o indiciamento de seu cliente.
Para a Anistia Internacional, a decisão põe fim "ao hábito do governo Bush de atirar alguém na prisão e jogar fora a chave". A União Americana pelas Liberdades Civis disse que a Suprema Corte iniciou o desmantelamento dos processos militares, baseados na coação física.
A comissária da ONU para direitos humanos, Louise Arbour, disse que os prisioneiros de Guantánamo, "depois de mais de seis anos", têm o direito a um processo civil.


Com agências internacionais


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