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IRAQUE SOB TUTELA
Clérigo Moqtada al Sadr se refugia em templo; invasão é condenada por xiitas dentro e fora do país
EUA invadem Najaf, cidade sagrada xiita
DA REDAÇÃO
Em uma decisão drástica protelada por mais de quatro meses,
cerca de 2.000 marines e 1.800 policiais e membros da Guarda Nacional iraquiana resguardados
por tanques e aviões invadiram
ontem o centro de Najaf, a cidade
sagrada xiita que, desde o último
dia 5, é o maior foco de tensão e
violência do Iraque.
A insurgência reagiu com granadas-foguetes e morteiros, e novos combates ocorreram em um
cemitério na periferia, que já havia sido atacado nesta semana pelos EUA. Na terça-feira, os militares americanos haviam exortado
os civis a deixarem a cidade.
O alvo do ataque é o clérigo xiita
Moqtada al Sadr, contra quem pesa uma ordem de prisão sob acusação de envolvimento no assassinato de um clérigo rival em 2003.
Marines cercaram e invadiram
a casa do líder radical que, segundo testemunhas, está entrincheirado com centenas de seguidores
na mesquita do imã Ali. O templo
é o mais importante do xiismo e
abriga o mausoléu do precursor
dessa corrente islâmica.
A entrada do santuário foi bloqueada pelos marines, e explosões e tiros ressoaram durante todo o dia nas imediações. Mas os
americanos evitam atingi-lo, temendo provocar um levante de
proporção nacional no país majoritariamente xiita.
A ação militar provocou reações
adversas e condenações em meio
aos governos região. "Os invasores americanos provaram que
não se pautam por nenhum princípio ético, e suas recentes atrocidades são injustificáveis", declarou o porta-voz da Chancelaria
iraniana, Hamid Reza Asefi.
O mais proeminente clérigo xiita do Iraque, grão-aiatolá Ali al
Sistani, cujas declarações moderadas costumam contrastar com
as de Al Sadr, também exortou os
americanos a preservarem a cidade. "Pedimos que o solo sagrado e
os locais sagrados sejam respeitados", disse ele, que está em Londres para tratamento cardíaco,
por meio de um assessor.
No Líbano, o principal líder xiita, grão-aiatolá Mohammad Hussein Fadlallah, disse que deve ser
feito "todo o possível" para expulsar as forças americanas do Iraque e criticou o governo interino
iraquiano. "Esse governo deveria
ter lidado com o problema usando as forças iraquianas. Deixar
que as forças de ocupação controlem locais sagrados e bombardeiem a esmo não resolve nenhum problema", escreveu o clérigo em um comunicado.
A violência na cidade sagrada
ecoou em outros bastiões xiitas,
como o bairro de Sadr City, em
Bagdá. Em Kut (sul), pelo menos
72 pessoas morreram nos confrontos entre o Exército Mehdi e
as forças americanas e um subseqüente ataque de aviões dos EUA,
segundo dados do Ministério da
Saúde. Na capital, os confrontos
deixaram 25 mortos. Também
houve protestos em Basra, onde
mais de 5.000 simpatizantes do
clérigo foram às ruas.
US$ 60 milhões
O premiê interino do Iraque,
Iyad Allawi, exortou os rebeldes a
deixarem o templo do imã Ali e
largarem as armas. Segundo Allawi, a atual onda de violência custou aos combalidos cofres do país
nos últimos dias US$ 60 milhões.
Al Sadr, 31, mantém uma milícia particular, o Exército Mehdi,
que em abril protagonizou um levante no qual mais de 20 soldados
americanos foram mortos. À rebelião, seguiram-se sucessivas
ações americanas e confrontos
que, segundo o comando dos
EUA, deixaram mais de 300 rebeldes mortos até o anúncio de uma
trégua, em junho.
Os combates nas cercanias de
Najaf recrudesceram na semana
passada, após dois meses de trégua. A retomada do conflito ocorreu com um ataque da insurgência contra uma delegacia, mas os
dois lados ainda trocam acusações pelo rompimento do acordo
de cessar-fogo.
Desde então, confrontos entre o
Exército Mehdi e as forças americanas eclodiram em pelo menos
sete cidades do predominantemente xiita sul do Iraque, impondo um novo -e gigantesco-
obstáculo ao governo interino e à
Força Multinacional liderada pelos EUA, que apesar da devolução
oficial da soberania segue no país.
Segundo o Ministério da Saúde
do Iraque, só nos últimos dois
dias, pelo menos 172 iraquianos
morreram e 643 foram feridos
nos diferentes focos de violência
no país. Os números, no entanto,
não incluem as baixas em Najaf,
sobre as quais não há ainda nenhum comunicado oficial.
Os EUA afirmam que as forças
iraquianas têm participado ativamente da ofensiva, embora testemunhas afirmem que a maior
parte dos ataques e combates tem
sido executada pelos americanos.
Conferência Nacional
Paralelamente, segue a onda de
seqüestros de estrangeiros, que
desde abril já somou mais de 80
reféns. Um grupo desconhecido
anunciou a captura de três caminhoneiros árabes -um sírio e
dois libaneses- que levavam
equipamentos às forças dos EUA.
Apesar da violência, as autoridades iraquianas mantiveram para este fim de semana a Conferência Nacional, um encontro que
deve reunir cerca de mil representantes da sociedade iraquiana para escolher os membros da Assembléia Nacional interina, encarregada de redigir uma nova
Constituição para o país e monitorar o atual governo.
Por sua vez, o Conselho de Segurança da ONU aprovou por
unanimidade a extensão em um
ano do mandado da entidade no
país, que prevê um "papel crucial" para a missão do organismo,
reduzida ante a violência e alvo de
dois atentados em 2003. O foco é a
organização de eleições e a assistência humanitária.
Com agências internacionais
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