São Paulo, sexta-feira, 13 de outubro de 2000

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Iasser Arafat afirma que os atos israelenses são 'declaração de guerra'
Israel ataca palestinos após linchamento de soldados

France Presse
Palestinos reúnem-se nas ruínas da delegacia que foi atingida por mísseis disparados por helicópteros de Israel; momentos antes do ataque, dois soldados israelenses que estavam detidos no local foram linchados


PAULO DANIEL FARAH
ENVIADO ESPECIAL A RAMALLAH

Helicópteros israelenses bombardearam ontem cidades palestinas em Gaza e Cisjordânia, atingindo alvos próximos de prédios usados pelo líder palestino Iasser Arafat, depois que uma multidão linchou pelo menos dois soldados israelenses que haviam sido presos por policiais palestinos em Ramallah (Cisjordânia).
Pelo menos 36 palestinos ficaram feridos nos ataques.
O aumento de intensidade dos conflitos torna ainda mais improvável uma retomada do processo de paz num futuro próximo. Foram os maiores ataques israelenses contra centros palestinos desde o início do processo, em 1993.
Arafat afirmou que as ações de ontem são "uma declaração de guerra", e outros líderes palestinos pediram ação da comunidade internacional para impedir a "continuação do massacre".
O premiê israelense, Ehud Barak, disse à rede de TV CNN que não abandonou o processo de paz. "Faremos a paz com os palestinos. Não perderemos nunca a esperança", disse ele. "Israel não faz provocações. Respondemos a elas e continuaremos a fazê-lo."
Líderes de Israel declararam que a ação era uma resposta limitada ao "crime horrendo" do linchamento dos soldados.
Barak disse que seu país não poderia permitir que tal ato ficasse sem uma resposta.
O vice-premiê israelense, Binyamin Ben Eliezer, afirmou depois que um terceiro soldado havia sido capturado e morto.
"A ação é um aviso para que a Autoridade Nacional Palestina não confunda a moderação de Israel e o seu desejo de paz e segurança", disse Barak em nota.
Arafat afirmou, durante uma visita a feridos pelos ataques em Gaza, que os palestinos permaneceriam fortes e "continuariam sua marcha em direção a Jerusalém, a capital do Estado palestino independente".
"Não há dúvida de que o processo de paz, em sua presente forma, não parece ter a menor chance. Se quisermos retomar as negociações, teremos de fazê-lo por outros meios", declarou o ministro interino das Relações Exteriores de Israel, Shlomo Ben Ami.
Ele disse que as conversações eram definitivamente a única opção. "No final das contas, mesmo que se chegue a uma confrontação -não importa quão dura e aguda- , nós todos entendemos que não haverá uma alternativa ao retorno à mesa de negociação."

ONU
O ministro palestino do Planejamento, Nabil Shaath, pediu que o Conselho de Segurança da ONU realize uma reunião urgente "para conter os confrontos e as agressões contra a população".
Israel disse que avisou aos palestinos com antecedência que prédios iria atacar, para minimizar o número de vítimas. Diplomata palestina em Paris confirmou a informação.
Barak disse que a escolha dos alvos nos ataques de ontem serviria para mostrar aos palestinos que "Israel sabe" onde estariam os "instigadores da violência" dos últimos dias.
A rádio Voz da Palestina, em Ramallah, atingida ontem, estaria, segundo Israel, incitando a população a atos de violência contra as forças israelenses.
Barak disse que barcos da polícia palestina em Gaza, também atacados, armazenavam armas e que outro prédio atacado na cidade servia de sede para milícia palestina responsabilizada por ataques com armas de fogo contra Israel.
Um porta voz do Exército israelense declarou que a multidão havia mutilado os soldados num "crime horrendo". "O que ocorreu ontem foi algo que requer resposta imediata e severa. É por isso que usamos os helicópteros para atacar os alvos, para enviar uma mensagem clara a Arafat e aos demais líderes da Autoridade Palestina: não brinquem conosco."
Pelo menos 97 pessoas foram mortas nos distúrbios que atingem, há duas semanas, os territórios palestinos e Israel. Do total de mortos, apenas sete não são palestinos ou árabes israelenses.
A violência eclodiu após a visita, em 28 de setembro, do líder conservador Ariel Sharon (do Likud, maior partido da oposição israelense) à Esplanada das Mesquitas (Jerusalém Oriental), sagrada para muçulmanos e judeus.
Resolução do Conselho de Segurança condenou Israel pelo "uso excessivo" de força na repressão aos ataques palestinos.
A escalada no conflito ontem ocorreu após dois dias de perda de intensidade nos choques, após frenéticas negociações intermediadas por enviados internacionais, entre os quais o secretário-geral da ONU, Kofi Annan, há vários dias na região.
O ataque israelense em Ramallah interrompeu o fornecimento de energia para 18 mil habitantes da cidade.
O Exército israelense posicionou tanques ao redor dos grandes centros palestinos.
Israel informou que seus dois soldados foram mortos depois de se perderem em Ramallah em seu caminho para a base e serem levados para a delegacia palestina que depois foi bombardeada.
A multidão invadiu a delegacia e espancou os soldados, detidos por suspeita de espionagem.
Um assessor de Arafat disse que os policiais tentaram proteger os presos, Por esse motivo, 13 deles teriam sido feridos.
"O ataque é um pequeno sinal para que a liderança palestina veja que o Exército de Israel não ficará sentado enquanto atos de violência são cometidos", afirmava o comunicado do Exército.
Danny Yatom, assessor de Barak, disse: "O principal objetivo era mostrar que as regras do jogo mudaram completamente após o linchamento em Ramallah".
Autoridades palestinas acusaram Israel de dar início a uma guerra em grande escala e pediram intervenção internacional.
O negociador palestino Saeb Erekat afirmou: "O que estamos testemunhando é uma guerra declarada contra o povo palestino. Pedimos à comunidade internacional intervenção imediata".
O recrudescimento da situação no Oriente Médio se impôs sobre os esforços liderados pela ONU para reduzir as tensões.
O secretário-geral da organização, que viajara para Beirute para discutir o destino dos três soldados israelenses capturados por guerrilheiros do Hizbollah no sábado, disse que esperava que as negociações sobrevivessem aos últimos choques.
Barak disse que espera formar um governo de união nacional com o Likud de Sharon ainda esta semana para unir o país durante a crise.


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