São Paulo, sexta-feira, 14 de janeiro de 2005

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AMÉRICA LATINA

Adolfo Scilingo, ex-oficial da Marinha, enfrenta julgamento por crimes na ditadura na Argentina

Espanha julga pela primeira vez ex-militar argentino

DA REDAÇÃO

Pela primeira vez, um ex-integrante da ditadura argentina enfrentará julgamento na Espanha por sua participação em crimes de genocídio, terrorismo e tortura durante o último regime militar da Argentina (1976-83).
O processo foi aberto pela Justiça da Espanha depois que o ex-oficial da Marinha Adolfo Scilingo, 58, confessou, em 1995, ter participado dos "vôos da morte", nos quais até 2.000 detidos na Esma (Escola Mecânica da Armada) foram jogados vivos ao mar. A confissão foi feita em entrevista ao jornal argentino "Página 12".
"Eles estavam inconscientes. Se abria a portinha [do avião], e eles eram jogados nus, um por um", explicou então Scilingo ao jornal.
Pela Esma, principal centro de repressão argentino, passaram 5.000 dos 30 mil desaparecidos durante a "guerra suja" -como ficou conhecida a campanha de detenção ilegal, tortura e assassinatos lançada pelos militares.
Segundo a agências de notícias France Presse, Scilingo enfrentará acusações de participação em 30 assassinatos, 93 maus-tratos, 255 casos de terrorismo e 286 episódios de tortura, pelos quais os advogados de acusação devem pedir pena de 6.626 anos de prisão. A sentença deve sair em março.
Scilingo faz parte de uma lista de mais de 120 militares e civis argentinos citados em processo aberto pelo juiz espanhol Baltasar Garzón em 1996 por violações de direitos humanos cometidas pela última ditadura argentina contra cidadãos espanhóis.
Em audiência perante o juiz, em 1997, o ex-militar voltou a confessar sua participação nos "vôos da morte", mas, dois anos depois, voltou atrás. Para evitar que fugisse, Garzón determinou a prisão do Scilingo em 2001. Ele está hoje na penitenciária de Alcalá-Meco, a 30 km a leste de Madri.

Julgamentos
Decisão histórica da Justiça da Espanha determinou, em 1998, que crimes contra a humanidade podem ser julgados no país mesmo se ocorridos em outros países.
No mesmo ano, o Reino Unido prendeu, a pedido do juiz Garzón, o ex-ditador chileno Augusto Pinochet por crimes cometidos por seu regime (1973-90). O general foi depois libertado sob a alegação de que estava muito doente para enfrentar julgamento.
Em 2003, Garzón ratificou pedido de prisão e extradição de 48 militares argentinos envolvidos na repressão, feito três anos antes. O novo pedido coincidiu com a anulação, por parte do governo do presidente argentino, Néstor Kirchner, das leis de Obediência Devida e Ponto Final, que anistiaram ex-repressores.
No entanto, a Espanha se negou a dar curso ao pedido argumentando que, com a anulação das leis, os ex-repressores poderiam ser julgados em seu próprio país.
A causa contra Scilingo foi mantida, porém, após a Justiça argentina e o Supremo Tribunal espanhol reconhecerem a competência de Garzón para julgar o ex-militar, alegando a inexistência de processo contra ele na Argentina.


Com agências internacionais

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