São Paulo, terça-feira, 14 de abril de 2009

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ARTIGO

Entre persas, árabes e israelenses

ROULA KHALAF
DO "FINANCIAL TIMES"

A nova abordagem de Barack Obama em relação a Teerã começa a emergir -antes até de a revisão plena ser concluída-, e a mudança parece drástica. Considerem três recentes decisões: primeiro, o presidente dos EUA adotou um tom respeitoso, que sinaliza que a "mudança de regime" deixou de ser um objetivo dos EUA.
Segundo, ele deixou claro que quer o Irã envolvido em questões que sejam causa comum de preocupação, sobretudo no Afeganistão. No espírito dessa colaboração, Washington convidou funcionários de Teerã para a recente conferência sobre o Afeganistão em Haia. Terceiro, e principal, é a decisão dos EUA de se unirem às demais potências mundiais na oferta de retomar as negociações nucleares com o Irã -e, ao menos por enquanto, sem condicioná-la ao fim do enriquecimento de urânio por Teerã. Claro que o objetivo dos EUA ainda é o mesmo: Washington quer impedir Teerã de adquirir armas nucleares e usar seu poderio político e militar para solapar os interesses ocidentais. A meta final do Irã tampouco mudou: garantir a aceitação de seu programa nuclear e o status de potência regional. Mas, após 30 anos de hostilidade entre os dois países, não se deve subestimar tais passos.
Embora as reações de Teerã não sejam 100% encorajadoras, as decisões da Casa Branca tiveram impacto sutil: abrir o debate dentro do regime iraniano antes da eleição presidencial de junho e lançar pressão sobre Teerã por uma resposta à altura. Com o tempo, elas darão às forças moderadas no país munição para se fazer ouvir.

Outros atores
Neste primeiro estágio, porém, Washington tem dois outros atores a considerar enquanto se esforça para promover uma distensão com Teerã. O primeiro são seus aliados árabes, que temem a influência crescente do Irã no golfo Pérsico e a possibilidade de os iranianos interferirem em causas que consideram como suas, sobretudo o conflito árabe-israelense. Esses aliados presumem que melhores laços entre Washington e Teerã enfraqueceriam seus elos com os EUA. O relacionamento entre o Irã e o mundo árabe está piorando.
Em março, Marrocos cortou relações com Teerã, alegando que os iranianos buscam difundir o islã xiita entre a maioria muçulmana sunita do país. Mais bizarra é uma investigação do Egito sobre um grupo supostamente ligado ao Hizbollah, grupo libanês apoiado pelo Irã, e suspeito de planejar ataques contra seu território. Mas os países árabes podem ser convencidos dos méritos de um diálogo entre EUA e Irã.
Mais complicado é Israel, dono do único arsenal nuclear do Oriente Médio (não declarado), mas que ainda assim se sente vulnerável. Enquanto os EUA agem sob a suposição de que o Irã atua de forma racional, o novo governo israelense vê na liderança em Teerã um "culto messiânico apocalíptico", como disse o premiê Binyamin Netanyahu à revista "Atlantic".
Israel aposta que a aproximação com o Irã fracassará e que o mundo apoiará sanções econômicas muito mais punitivas ou uma ação militar para destruir instalações militares do rival. Assim, devemos esperar que, a cada passo, o governo Obama enfrente mais procrastinação de Teerã, impaciência de Israel e ansiedade entre os árabes.
Será preciso perseverar e enviar uma mensagem clara aos aliados árabes de que eles não devem temer a distensão dos EUA com o Irã, bem como uma severa advertência a Israel contra uma eventual aventura militar lançada isoladamente.


Tradução de PAULO MIGLIACCI


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