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São Paulo, quarta-feira, 14 de maio de 2003

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PREVIDÊNCIA

Transportes e serviços públicos pararam; governo quer unificar contribuições públicas e privadas em 40 anos

1,1 milhão de franceses contestam reforma

Claude Paris/Associated Press
Dezenas de milhares de franceses protestam em Marselha (sul)


FERNANDO EICHENBERG
FREE-LANCE PARA A FOLHA, DE PARIS

Cerca de 1,1 milhão de franceses, segundo a polícia, manifestaram ontem nas ruas de 115 cidades da França seu repúdio à política previdenciária do governo, um número elevado para 2 milhões nas estimativas dos organizadores.
"A ruas não governam o país", dissera o premiê Jean-Pierre Raffarin (centro-direita) às vésperas do dia nacional de greve convocado pelos principais sindicatos (CGT, CFDT, CFTC, FO, SUD) contra o projeto de reforma previdenciária. As ruas responderam à provocação e mostraram que, se não governam, sabem se mobilizar. As manifestações e paralisações superaram as expectativas, registrando um alcance sem precedentes desde a mobilização social promovida em dezembro de 1995 contra o malogrado projeto de alteração das regras das aposentadorias proposto pelo então premiê Alain Juppé, também de centro-direita.
Em Paris, os principais dirigentes sindicais lideraram uma passeata composta por 250 mil pessoas, segundo os sindicatos, e 75 mil, na avaliação da polícia. Na cidade de Marselha, 200 mil pessoas se manifestaram contra o governo, o dobro de participação em relação às passeatas de 1995.
As greves atingiram grande parte dos setores públicos do país. A maioria dos franceses enfrentou dificuldades para utilizar os transportes públicos. Na SNCF, que controla o sistema ferroviário, a paralisação chegou a 60%, provocando o cancelamento de mais de dois terços das viagens de trens nas principais linhas. O índice foi ainda maior na RATP, responsável pelo metrô e os ônibus de Paris: 90% dos condutores mantiveram os braços cruzados. A greve alcançou 90% dos funcionários nos hospitais públicos, 57% na France Télécom, 47% nos Correios e cerca de 70% no ensino público. Nos aeroportos, estima-se que cerca de 80% dos vôos tenham sido anulados. Em face da forte mobilização, o governo foi obrigado a mudar o tom de seu discurso. Da tribuna da Assembléia Nacional, o ministro do Trabalho, François Fillon, reconheceu "uma mobilização social importante" por parte da população e declarou estar "aberto à discussão": "Entendi duas mensagens nas ruas de nossas cidades hoje [ontem]. Aqueles que não querem a reforma previdenciária, nós não ouviremos. Com aqueles que desejam melhorar o projeto do governo, nós estamos prontos a conversar". O deputado Jean-Marc Ayrault, líder do Partido Socialista na Assembléia, advertiu: "Nós estamos nos preparando para a batalha parlamentar que se anuncia, e ela será dura".
Ontem, os franceses foram também privados dos jornais e das sacrossantas previsões meteorológicas, prejudicadas pela greve parcial no serviço nacional de meteorologia. Pode-se dizer com segurança, no entanto, que nos próximos dias o clima será bastante instável para o governo durante as negociações previstas com os sindicatos. No final da tarde de hoje, o ministro François Fillon receberá os líderes sindicais para discutir os pontos mais polêmicos de seu projeto. Mas ele deixou claro que o governo não abrirá mão do nódulo de sua reforma, ou seja, a harmonização do período de contribuições entre os setores público e privado até 2008. Hoje, no serviço público, as contribuições se limitam a 37,5 anos (contra 40 anos no sistema privado), e o cálculo da pensão alcança 75% do salário (contra 50% a 60% para os trabalhadores privados). O governo pretende unificar o tempo de contribuições em 40 anos.
Entusiasmados com o sucesso da "terça-feira negra", os sindicatos pretendem manter a mobilização e já conclamaram novos protestos para o próximo dia 19. A paralisação dos trens e do metrô parisiense poderá seguir hoje.


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