São Paulo, terça-feira, 14 de setembro de 2004

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RÚSSIA

Presidente ordena reforma radical no sistema político, supostamente para combater o terrorismo tchetcheno, mas atrai críticas

Putin quer centralizar poder após tragédia

DA REUTERS

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, ordenou ontem mudanças radicais no sistema político russo, visando a combater o terrorismo. Imediatamente, atraiu fortes críticas segundo as quais está usando o trágico desfecho do seqüestro ocorrido numa escola de Beslan, no sul do país, para reforçar seu poder.
Falando dez dias após a morte de mais de 300 reféns, incluindo mais de uma centena de crianças, na escola de Beslan, na Ossétia do Norte, Putin disse a autoridades russas que quer uma nova lei eleitoral, buscando limitar o número de partidos políticos e controlar a nomeação de líderes regionais.
Putin disse ainda que essas mudanças são vitais para garantir a autoridade do Estado após a tragédia de Beslan, ocorrida depois que terroristas islâmicos tchetchenos fizeram mais de mil reféns numa escola na cidade.
"O combate ao terrorismo deve tornar-se uma tarefa nacional", declarou Putin durante um encontro entre o primeiro escalão do governo e os governadores das 89 regiões russas.
De acordo com seus críticos, as mudanças propostas provam que Putin, um ex-espião da KGB que já silenciou a maior parte da imprensa independente e transformou o Parlamento em títere do Kremlin, busca minar os progressos democráticos feitos desde o colapso da URSS, em 1991.
"Os últimos vestígios do sistema de controles e de equilíbrio entre os diferentes Poderes, que tem servido para impedir a concentração do poder nas mãos de poucas pessoas, estão sendo abolidos", afirmou o partido oposicionista Yabloko, em nota divulgada à imprensa.
O liberal Vladimir Rizhkov, um dos poucos deputados independentes na Duma -a Câmara Baixa do Parlamento (controlada pelo partido pró-Kremlin Rússia Unida)-, expressou indignação.
"Imagine que, depois do 11 de Setembro, visando prender Osama bin Laden, George W. Bush [presidente dos EUA] propusesse não permitir mais a realização de eleições para governadores, buscando apontá-los diretamente de Washington", afirmou Rizhkov.
Putin, 51, que foi reeleito com grande vantagem sobre seus oponentes em março último, sustenta que uma reforma do sistema político é necessária para enfrentar a ameaça terrorista que paira sobre a Rússia.
Para ele, a Duma deveria ser composta exclusivamente por deputados provenientes das listas partidárias. Na prática, isso poria fim ao sistema de voto distrital misto. A fácil vitória do partido Rússia Unida na última eleição legislativa ocorreu após uma dura campanha do Kremlin contra partidos liberais e comunistas.
"Tentando defender os interesses do Estado e fortalecer o sistema político nacional, creio que seja necessário que a Duma seja formada apenas com base no sistema proporcional de listas partidárias", afirmou Putin.
"As principais autoridades dos membros da Federação deverão ser nomeadas pelo chefe de Estado e confirmadas pelo Legislativo local", acrescentou o presidente.
Seus oponentes disseram que as alterações no sistema eleitoral só servirão para que o Kremlin consolide seu controle sobre a sociedade russa, não tendo nenhum efeito concreto no que se refere ao combate ao terrorismo.
"A vontade de uma só pessoa será imposta a toda a sociedade. O que ele pretende é usurpar o poder", afirmou Gennady Zyuganov, líder do Partido Comunista.


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