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SUCESSÃO NOS EUA / A HORA DA ESTRELA
Palin revigora comícios de McCain e ofusca candidato
Ao roubar a cena, vice converte soporíferos eventos republicanos em atos para turba eufórica
Para multidão que a espera, governadora conservadora é estrela principal, cortejada com gritos, palmas, cartazes e até pedidos de casamento
FERNANDO RODRIGUES
ENVIADO ESPECIAL A FAIRFAX
As caixas acústicas gigantes
tocam "The Eye of the Tiger" a
todo volume. É o sucesso pop
de 1982 da banda Survivor, tema de vários filmes da série
"Rocky, um lutador". John
McCain, ele próprio um sobrevivente político nesta eleição,
sobe ao palanque ao som dos
acordes épicos do início da música. Traz junto sua mulher,
Cindy, mais Sarah Palin e seu
marido, o silencioso Todd.
"Paramos de contar o público
quando passou de 20 mil", diz
um policial apressado durante
o evento. A mídia local estimou
em até 23 mil o número de presentes na última quarta-feira
no parque Van Dycke, em Fairfax, cidade no norte do Estado
da Virgínia até pouco tempo
um reduto no qual quem avançava eram os democratas.
O candidato republicano a
presidente tem visto um espetáculo do crescimento nos seus
comícios. Já havia reunido 10
mil pessoas em Colorado
Springs (no Colorado), na semana retrasada. No último dia
9, foram outras 7.000 em Lancaster (Pensilvânia). Os 23 mil
da Virgínia estabeleceram um
recorde para uma campanha
acostumada a um clima tendendo à narcolepsia, dada a falta de entusiasmo quando o senador de 72 anos aparecia em
frente aos militantes.
O comício de Fairfax foi outra história. O clima ajudou,
com uma quarta-feira ensolarada e céu azul, típico desta
época do ano na região. O evento começaria às 11h, mas às
8h30 já havia filas de quase um
quilômetro para entrar.
Fila para entrar num parque? Comício de candidato a
presidente nos EUA é assim. A
polícia é paranóica por causa do
farto histórico de políticos assassinados no país. O parque
Van Dycke foi totalmente cercado. Todo o público passou
por detectores de metal. Havia
12 máquinas disponíveis, iguais
às dos aeroportos. O evento seria inicialmente em um ginásio
escolar, mas democratas locais
(oposição) encrencaram porque seria no horário das aulas.
"Lá cabiam só pouco mais de
6.000. Fizeram-nos um favor.
Agora mais pessoas puderam
vir. Este já é o maior comício da
campanha de McCain", disse à
Folha o prefeito de Fairfax,
Rob Lederer, republicano.
O comício era para o candidato a presidente pelo Partido
Republicano, mas a maioria na
platéia queria mesmo ver de
perto a candidata a vice, Sarah
Palin. "Sarahcuda", "Sarah,
quer casar comigo?", "Eu também sou uma mãe do hockey",
"Palin Power", "Clube do batom da América" e "Democratas com Palin" eram alguns dos
cartazes artesanais levados por
militantes sentados na grama.
Durante os discursos, não
importava quem falava. A platéia quase sempre interrompia
com os gritos de "Sa-rah, Sa-rah, Sa-rah". Quando chegou
sua vez, McCain se rendeu. Começou a balançar os braços como se fosse um maestro regendo uma orquestra de fãs de sua
candidata a vice. Ele sabe quem
é a estrela da campanha agora.
Fator Édipo
A governadora do Alasca tem
44 anos, cinco filhos, é conservadora no grau máximo e, como explicou o estudante de segundo ano da universidade
Georgetown, Paul Courtney,
19, "ela é muito bonita e mais
jovem do que a minha mãe".
Cheio de acne no rosto, ele faz
parte do grupo "College Republicans", de universitários partidários da legenda de McCain
e do atual presidente dos EUA,
George W. Bush.
Com uma camiseta vermelha
(a cor dos republicanos) estampando à la Che Guevara uma silhueta em preto de Ronald Reagan, um outro "college republican", Alex George, também 19,
não continha o entusiasmo. "O
comício foi muito melhor do
que eu esperava. Ela [Palin] é
melhor pessoalmente". George
ajudou a recrutar no mês passado "quase 300 calouros", todos dispostos a trabalhar como
voluntários na campanha republicana a partir de Georgetown,
tradicional universidade de
Washington, vizinha a Fairfax.
O comício republicano é
pragmático, como o partido.
Não há, como no Brasil, uma
lista infindável de gente se esgoelando ao microfone. Os políticos escalados têm missões
específicas. Falaram, por
exemplo, duas democratas que
votavam em Hillary Clinton,
(derrotada por Barack Obama
na disputa pela candidatura).
Orson Swindle, um veterano
de guerra amigo de McCain, fez
um discurso utilitário. "Meu
pedido é incomum. Liguem os
seus celulares. Isso mesmo, liguem os telefones. Enquanto
aguardamos John McCain, peguem esses papéis que vocês
receberam na entrada. Em cada
folheto há números de telefones de eleitores diferentes desta área. Façam uma ou duas ligações agora e tentem conseguir mais um voto. Somos milhares aqui. Se todos fizerem
um telefonema, podemos dobrar nosso número", disse ele.
Nem todos atenderam à solicitação. Mas fez-se silêncio por
algum tempo e via-se muitos
militantes apertando as teclas
de seus celulares.
Pouco antes da chegada de
McCain e Palin, o deputado federal republicano da região,
Tom Davis, contou uma anedota para distrair a platéia e reforçar o estigma de gastadores dos
democratas. "Sabem como nossos adversários tratam as coisas
em Washington? Se algo se move, criam um imposto em cima.
Se continuar a se mover, inventam uma regulamentação. Se
parar, propõem subsídios."
Para terminar as apresentações, surgiu no palco Fred
Thompson. Ex-senador pelo
Tennessee de 66 anos, ator popular de uma série de TV, ele é
uma espécie de Tarcísio Meira
dos republicanos. Canastrão,
soube como levar o público
quase ao delírio declamando
um exagero: "[Sarah Palin] tem
a mais formidável história de
sucesso na política americana".
McCain e Palin fizeram discursos lidos no teleprompter.
Tudo foi extraído de suas falas
na convenção republicana, de
uma semana antes. Patriotismo, serviço à nação, menos impostos e "mudança real" para
Washington, seqüestrando e
ampliando o slogan de Obama.
Nacionalismo
Para dar mais naturalidade,
Palin aponta em algum momento para o público e diz estar
feliz com o cartaz de um veterano de guerra (não há como errar: sempre há um veterano na
platéia republicana). A governadora do Alasca então apela
para o nacionalismo de seus
fãs. Diz estar para despachar
um de seus cinco filhos para
servir na Guerra do Iraque, o
que aconteceu na quinta-feira,
um simbólico 11 de setembro.
O "batomgate" também foi
um tema recorrente. Palin se
descreve como uma "hockey
mom", dedicada, que leva os filhos aos treinos. A diferença
entre uma "mãe do hockey" e
um pit-bull, diz, é o "batom".
Na semana passada, Obama
foi ao ataque. "Você pode passar batom num porco, mas ainda é um porco". É uma expressão comum nos EUA. Mas os
republicanos vibraram. Já haviam encaçapado o discurso de
mudança dos rivais. Agora, passaram a se portar como alvos de
sexismo, devolvendo na mesma
moeda décadas de acusações.
Ex-partidária de Hillary
Clinton e agora militante pela
chapa republicana, Lynette
Long viu na frase de Obama um
sinal de imaturidade, como se o
democrata fosse um menino
xingando meninas na escola.
"Não quero alguém da quinta
série dirigindo o meu país."
Depois de uma série de eventos como o de Fairfax, a chapa
republicana se dividiu. A candidata a vice foi para o Alasca por
alguns dias. McCain está sozinho até o início desta semana.
Terá de se virar e talvez se inspirar na letra da música que
seus marqueteiros escolheram
para tema de sua campanha.
Em "The Eye of the Tiger", o
Survivor canta um verso misturando cafonice a auto-ajuda:
"Eu fiz o que pude, agora estou
recuperado. Sou um homem
com seu desejo de sobreviver".
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