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Nobel da Paz vai para "banqueiro dos pobres"
Muhammad Yunus criou microcréditos que ajudaram milhões em Bangladesh
Sistema que especialistas chamam de revolucionário permite empréstimos de valores pequenos a pessoas sem avalista ou propriedade
RAUL JUSTE LORES
DA REPORTAGEM LOCAL
O prêmio Nobel da Paz foi
concedido ontem ao banqueiro
Muhammad Yunus, 65, de Bangladesh, e a seu Grameen Bank.
Yunus é conhecido como o
"banqueiro dos pobres", por ter
desenvolvido o sistema de microcréditos -empréstimos de
valores quase irrisórios que
ajudaram milhões de miseráveis em Bangladesh, que de outra forma não teriam acesso a
crédito no sistema bancário.
Sua escolha foi uma surpresa
por estar fora dos circuitos diplomáticos ou de resolução de
conflitos bélicos. "Uma paz duradoura não pode ser alcançada
ao menos que grandes parcelas
da população possam sair da
pobreza", declarou o comitê
que entrega o prêmio.
"Erradicar a pobreza pode
nos dar uma paz real", declarou
Yunus, que anunciou que doará
US$ 1,4 milhão do prêmio à
criação de um hospital de
olhos, entre outras obras humanitárias em seu país.
Economista que estudou nos
EUA, Yunus começou a emprestar dinheiro de seu próprio
bolso a pobres em Bangladesh
que não tinham acesso a linhas
de crédito convencionais.
Em 1976, ele emprestou o
equivalente a US$ 26 a 42 mulheres que faziam cadeiras de
bambu. O grupo pôde pagar
pouco depois o empréstimo,
que ajudou que elas comprassem mais matéria-prima.
Revolução financeira
Nos anos 80, com apoio governamental, ele criou o Grameen Bank. Mais de 6,5 milhões de pessoas contam com
empréstimos do banco, de US$
130 em média cada um, e a devolução chega a quase 99%.
Contra os prognósticos pessimistas, a inadimplência é mínima. Cerca de 90% do banco
pertence a bengaleses que pedem empréstimos -depositam
e confiam no banco.
A idéia foi copiada e adotada
em mais de 50 países. Estima-se que 100 milhões de pessoas
em todo o planeta já tenham sido beneficiadas por algum microcrédito. Vários especialistas
ouvidos pela Folha chamam o
sistema de "revolucionário".
"Esse novo sistema alterou
radicalmente o tipo de serviços
financeiros disponíveis aos pobres da Ásia, da África e da
América Latina", diz o professor Craig McIntosh, da Universidade da Califórnia em San
Diego, que passou um ano estudando o impacto dos microcréditos em Uganda. "Inquestionavelmente, demostrou que
é possível fornecer empréstimos e até planos de previdência e poupança, com alguma
margem de lucro."
Poder às mulheres
Quase a totalidade dos empréstimos -96% - é concedida
a mulheres na zona rural do
país, um dos mais pobres do
mundo, com 146 milhões de habitantes.
"Além de ajudar os mais pobres entre os pobres, o Grameen inovou ao priorizar as
mulheres, as mais necessitadas
na sociedade bengalesa", conta
o professor Kabir Hassan, do
Instituto Americano de Estudos sobre Bangladesh e professor convidado da Universidade
de Dacca. "Em Bangladesh,
uma sociedade islâmica ortodoxa, as mulheres se casam
muito cedo, têm muitos filhos e
sofrem com o analfabetismo e
machismo. O banco está provocando uma mudança gradual
ao dar poder a elas."
América Latina pioneira
Na América Latina, os microcréditos já foram concedidos a
6 milhões de pessoas e a 500
mil microempresas em mais de
20 países. O Banco Interamericano de Desenvolvimento
(BID) começou o programa em
1978, quando a economista
Beatriz Harretche concedeu
um empréstimo de US$ 100 a
uma cooperativa têxtil uruguaia. "Ambas as experiências
inovam ao atender pessoas que
não tinham como empreender", diz o gerente sênior do
Departamento de Desenvolvimento Sustentável do BID, Antonio Vives.
Os empréstimos atuais do
BID em microcréditos chegam
a US$ 6 bilhões. "Nos países
mais pobres, onde há pouco
crédito, esses empréstimos
ajudam até na compra de ferramentas para o artesanato", diz.
Com agências internacionais
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