São Paulo, domingo, 14 de novembro de 2004

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ORIENTE MÉDIO

Caso não seja possível pleito em 60 dias, ANP terá um presidente provisório; Mazen é o mais cotado para o posto

Cúpula palestina tem plano B para eleição

Ammar Awad/Reuters
Na Muqata (QG) de Ramallah, na Cisjordânia, palestinos oram ao redor da tumba onde, anteontem, foi interrado Iasser Arafat


IGOR GIELOW
ENVIADO ESPECIAL A RAMALLAH

Os principais líderes da ANP (Autoridade Nacional Palestina) fizeram ontem a defesa das eleições presidenciais para a escolha do sucessor de Iasser Arafat, morto aos 75 anos na quinta-feira, e pediram que os Estados Unidos intercedam pela realização do pleito. Longe dos microfones, porém, a liderança palestina já prepara um plano B para o caso de o prazo de 60 dias para a realização da eleição não ser exeqüível.
Segundo a Folha apurou com a cúpula palestina, se a eleição não for realizável até o começo de janeiro, um presidente temporário será escolhido pela instância decisória máxima da OLP (Organização para a Libertação da Palestina), o Comitê Central do Conselho Nacional Palestino.
Em qualquer um dos casos, porém, o futuro presidente palestino dificilmente deixará de ser Mahmoud Abbas, o Abu Mazen. A disputa sucessória ainda está em curso, mas todas as apostas ontem davam seu nome como certo ou como líder temporário ou como candidato a presidente pelo Fatah -o principal partido palestino, quase hegemônico.
A ANP é presidida interinamente desde a morte de Arafat por Rawhi Fattouh, um personagem secundário.
Enquanto isso, o premiê Ahmed Korei, o Abu Ala, disse ontem que conta com a pressão dos EUA para que Israel facilite a realização do pleito. "Esta é a hora de ser sério, e é isso que peço ao presidente [George W.] Bush", disse Korei após visitar a tumba de Arafat na Muqata, o QG palestino em Ramallah. Ele previu a realização das eleições antes de 9 de janeiro.
Assim como Korei, outros líderes visitaram ontem o túmulo -já que ontem a população impediu formalidades. O discurso estava afinado, para consumo externo. "Agora é nossa vez de pedir. Quero saber se o sr. [o secretário de Estado dos EUA Colin] Powell poderá ouvir do premiê [israelense Ariel] Sharon que Israel vai permitir nossa eleição. Até agora, não ouvimos nada. Se madre Tereza fosse presidente palestina, Mahatma Gandhi o negociador-chefe e Nelson Mandela o líder do Parlamento, parece que não adiantaria. Seríamos chamados de terroristas", disse o negociador Saeb Erekat, citando símbolos universais de paz.
O problema alegado pelos palestinos é a ocupação militar israelense da Cisjordânia e Faixa de Gaza. São 730 bloqueios impedindo a livre circulação de pessoas, o que inviabilizaria a campanha eleitoral. Israel ainda não se posicionou sobre a questão, embora contatos entre palestinos e israelenses já tenham começado por canais secretos que nunca foram totalmente fechados.
Questionado pela Folha se a fala de Bush de anteontem -se dizendo disposto a gastar seu capital político até 2009 para a criação do Estado palestino- tinha sido interpretada como sincera, Erekat disse: "Por que não agora?"

Saída alternativa
Ainda que estejam oficialmente, e até extra-oficialmente, otimistas com a idéia de anunciar a data das eleições em 10 de dezembro, oficiais palestinos estão trabalhando ativamente no plano B.
O Conselho Nacional Palestino é o parlamento máximo da OLP, com 620 integrantes -nos territórios palestinos e no exterior. O Comitê Central, de 150 membros, é sua instância decisória. Como disse uma autoridade palestina que pediu para não se identificar, agora que Arafat morreu, todos têm direito igual a voz e ao contraditório, mas poucos não obedeceriam uma decisão do órgão.
O comitê poderia votar, segundo o plano B, uma cláusula constitucional dando mandato indeterminado a um presidente provisório até que o pleito seja realizável.
A disputa interna palestina parece estar razoavelmente encaminhada, agora que a poeira da morte de Arafat baixou. A indicação de Farouk Kaddumi, um antigo líder contrário aos acordos que criaram a ANP, para a chefia do Fatah pode ter, na verdade, o retirado da disputa imediata pela Presidência palestina. Ele nem sequer deve sair de Túnis, onde está exilado desde 1982, por ora.
Na versão corrente em Ramallah, Kaddumi teria sido contemplado com o controle sobre o principal movimento político e militar palestino sabendo que isso inicialmente o alijaria da corrida. Com um discurso de confronto, ele é visto como inadequado para inserir as demandas da ANP na comunidade internacional. Resta saber se ele concordará.
E há a questão dos mais radicais, como o grupo Hamas. Por ora, eles parecem sob controle, alimentando até a tradicional alegação israelense de que eles obedeciam a Arafat.


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