São Paulo, sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

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EUA praticam "lixo da política", diz Cristina

Presidente nega acusação de que dólares vinham de Chávez para sua campanha

Denúncia foi feita em Miami por procuradores federais que investigam caso da mala apreendida com venezuelano na Argentina

Martín Zabala/Associated Press
Cristina na Casa Rosada; ela tomou posse na segunda-feira


RODRIGO RÖTZSCH
DE BUENOS AIRES

A presidente da Argentina, Cristina Fernández de Kirchner, e seus ministros reagiram com ataques aos EUA à acusação, feita pela Procuradoria Federal americana, de que o governo venezuelano enviou dinheiro ilegalmente para sua campanha eleitoral. Cristina qualificou a acusação de "lixo da política internacional" e disse que ela faz parte de uma operação para abalar sua relação com o colega Hugo Chávez.
"Com personagens que parecem saídos de filmes ou séries americanas, montam as próprias realidades de operações-lixo. Assim se percebe como alguns concebem a política internacional. Mais do que países amigos, querem países subordinados", afirmou.
Cristina fez seu discurso em um ato em que anunciava a remoção de 26 depósitos de lixo ao céu aberto na Província de Buenos Aires.
Os "personagens" a quem ela se refere são os venezuelanos residentes em Miami Carlos Kaufman, Franklin Durán e Moises Maionica e o uruguaio Rodolfo Wanseele, presos na terça-feira pelo FBI (polícia federal americana) sob a acusação de trabalharem como agentes do governo venezuelano nos Estados Unidos.
Segundo denúncia criminal apresentada na quarta-feira a uma corte federal de Miami, os quatro pressionaram o empresário venezuelano-americano Guido Antonini Wilson a não revelar a origem dos US$ 800 mil com os quais tentou entrar na Argentina em agosto.
Embora a queixa não mencione o nome de Cristina, apenas "um candidato à eleição presidencial da Argentina", o procurador federal que acompanha o caso disse que o candidato em questão era a presidente, eleita em 28 de outubro.
Ontem, porta-voz do escritório em Miami da Procuradoria dos EUA afirmou que Wilson fez gravações em que um acusado cita o nome de Cristina.

Farc
Cristina viu nas prisões, ocorridas um dia após a sua posse, uma operação dos EUA em represália à sua relação com Chávez e aos diálogos que manteve com autoridades colombianas e francesas sobre a necessidade de liberar os reféns das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia).
"Nesta forma de operar na política regional, quero lhes dizer que não terão resultados. Essa presidente pode ser mulher, mas não vai se deixar pressionar. Vou seguir afirmando a necessidade de que o governo da Colômbia e as Farc celebrem um acordo humanitário para pôr fim ao calvário de homens e mulheres presos nessa selva."
Os ministros de Cristina foram ainda mais duros. Aníbal Fernández (Justiça) afirmou que a denúncia era uma "canalhice". "É uma canalhice que pretende enlamear a presidente. E pouco me importa que quem faça a denúncia seja o FBI ou um procurador americano. O que estão apresentando é uma estupidez, uma canalhice que é uma espécie de represália dos EUA à Venezuela. Mas que os EUA resolvam [o caso] com a Venezuela ou com o presidente Chávez, que não se metam com a Argentina", disse.

Extradição
Já o chefe-de-gabinete, Alberto Fernández, falou em uma "operação de inteligência" dos EUA e cobrou que o país aceite o pedido de extradição de Wilson por tentativa de contrabando, feito pela Argentina logo depois da apreensão da mala.
"A única coisa clara é que os EUA não autorizaram Antonini Wilson a vir à Argentina explicar o que aconteceu. Não foi uma boa conduta", disse. "Tudo isso atenta contra a inteligência. Se o governo da Venezuela quisesse trazer recursos à Argentina, o presidente Hugo Chávez ia chegar à Argentina um dia depois da viagem de Antonini Wilson, em aviões presidenciais, com todas as vantagens da diplomacia internacional."
Em um comunicado, a Embaixada dos EUA em Buenos Aires afirmou que a prisão dos venezuelanos "faz parte de uma causa legal que implica supostas violações das leis dos EUA por agentes estrangeiros; não tem nada a ver com as relações bilaterais entre os EUA e a Argentina". Porta-voz do Departamento de Estado americano usou o mesmo argumento, embora tenha atacado Chávez por se "imiscuir" em eleições nos países vizinhos.

Relação bilateral
Se no governo de Carlos Menem [1989-1999] a Argentina chegou a definir como "carnais" suas relações com os EUA, com Néstor Kirchner na Casa Rosada e George W. Bush na Casa Branca os dois países se distanciaram muito, com grande contribuição de Chávez.
Buenos Aires e Caracas reforçaram suas relações na base de uma permuta. Chávez deu apoio econômico à Argentina quando todas as fontes tradicionais de financiamento haviam secado depois da moratória da dívida externa, em 2001 -em dois anos, emprestou mais de US$ 5 bilhões. Kirchner se transformou em principal defensor da integração da Venezuela ao Mercosul.
Com os EUA, as relações foram condicionadas pela pressão de detentores de títulos da dívida argentina para que Bush punisse a Argentina e pioraram de vez com o enterro da Alca (Área de Livre Comércio das Américas) na cúpula hemisférica de Mar del Plata, em 2005.


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