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Para salvar multicúpula, Brasil tenta conter Correa
Diplomacia quer evitar cenas de desacordo em reuniões sobre a integração regional
Encontros de líderes da América Latina e do Caribe mostram prioridade da política externa brasileira, mas a expõem a riscos
Mauricio Lima-30.set.08/France Presse
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Lula com Chávez (esq.), Morales e Correa em Manaus, em setembro; gestos espetaculares dos vizinhos roubam a atenção
CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA
A diplomacia brasileira enviou ao presidente equatoriano
Rafael Correa todos os recados
possíveis para que evite tratar
de forma polêmica o contencioso com o Brasil em torno do débito com o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social) durante as
multicúpulas latino-americanas que se realizam de amanhã
a quarta-feira na Costa do Sauípe (Bahia).
Passando a linguagem diplomática para português franco:
o governo brasileiro não quer
que Correa azede, com cenas
explícitas de desacordo, um
conjunto de reuniões cujo tema
geral é o inverso, ou seja, "Integração e Desenvolvimento".
O receio se explica: Correa já
obteve de outros presidentes
que também estarão na Bahia
(Hugo Chávez, da Venezuela,
Evo Morales, da Bolívia, e Daniel Ortega, da Nicarágua) a solidariedade que buscava para
sua decisão de submeter à arbitragem internacional os US$
243 milhões que o BNDES emprestou para a construção de
uma hidrelétrica que apresentou problemas.
O Brasil considerou inamistosa a iniciativa equatoriana.
Logo, só pode entender como
inamistosa também a solidariedade. Seria, portanto, arruinar
os esforços integracionistas
que estão na base das cúpulas
uma sessão pública em que
Correa levantasse o tema e obtivesse o apoio de alguns de
seus colegas, geralmente os
mais loquazes.
Por isso, o Itamaraty gostaria
que o contencioso fosse discutido, sim, mas apenas numa
eventual reunião bilateral entre Correa e Luiz Inácio Lula da
Silva, que, no entanto, não estava marcada até a sexta-feira.
"Espero que esse assunto [o
diferendo] não contamine a cúpula e não há nenhuma razão
para que isso aconteça", torce o
embaixador Ênio Cordeiro, o
principal negociador brasileiro
dos textos para as multicúpulas
da Bahia (ver quadro com reuniões e seus principais temas).
Se a torcida da diplomacia
brasileira der certo, as cúpulas
tomarão o formato usual, assim
definido pelo analista argentino Félix Peña: "Como em geral
acontece com cúpulas, estas estão muito centradas na agenda
do país anfitrião, tanto externa
como interna. A pergunta é, então, o que busca a diplomacia
brasileira com estas cúpulas?".
A resposta é fácil: reforçar todos os mecanismos de integração regional, prioridade um da
diplomacia brasileira.
Tanto é assim que, às cúpulas
habituais (Mercosul, Unasul,
Grupo do Rio), soma-se uma
mais ampla, entre todos os países latino-americanos e caribenhos, "para aglutinar países
que nunca tiveram encontros
autônomos", como diz o embaixador argentino Alfredo
Chiaradia, seu principal negociador. A Argentina, como o
Brasil, "é uma defensora muito
firme da integração regional",
acrescenta Chiaradia.
Competição
Um eventual foco no diferendo com o Equador tenderia a
ofuscar alguns avanços no processo de integração, mas que
não são espetaculares o suficiente para competir, na mídia,
com cenas explícitas de desintegração como seria uma polêmica entre Lula e Correa, ainda
mais se este for apoiado por
Chávez e Evo Morales.
A Unasul (União de Nações
Sul-Americanas), criada por
iniciativa brasileira em maio
deste ano, aprovou na quinta-feira, por exemplo, os estatutos
do Conselho de Defesa Sul-Americano, que serão levados
aos presidentes na Bahia. Um
mecanismo comum de defesa é
obviamente ponto fundamental para a integração.
Na cúpula do Mercosul, por
sua vez, deve ser aprovada a eliminação da dupla cobrança da
TEC (Tarifa Externa Comum).
Hoje, um produto que seja exportado para o Brasil, por
exemplo, paga a TEC do Mercosul. Mas, se processado e enviado para qualquer dos outros
países do bloco, paga de novo.
Esse sistema "desfigura a
união aduaneira e dificulta negociações internacionais do
Mercosul", diz o embaixador
Ênio Cordeiro.
União aduaneira é um passo
além de zona de livre-comércio
porque, além de zerar as tarifas
para importações entre os países do bloco, estabelece uma tarifa única para importações de
países externos a ele, mas com
uma única cobrança. A União
Européia, por exemplo, vive cobrando do Mercosul a eliminação da dupla cobrança como
condição para avançar nas negociações com vistas a criar
uma zona de livre comércio entre os dois blocos.
Por importantes que sejam
esses passos, é difícil que palavras como TEC ou Conselho de
Defesa consigam competir, na
agenda informativa, com "calote" (como ameaça não só o
Equador mas também o Paraguai) e, por extensão, com a
reação brasileira.
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