São Paulo, domingo, 15 de março de 2009

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Pequim quer criar "CNN chinesa"

Governo chinês investe US$ 7 bilhões em canal internacional em inglês para divulgar ao mundo sua visão das notícias

Estatal CCTV já tem canais em espanhol e em francês e prepara canais em árabe e em russo; consultor admite déficit em imparcialidade

RAUL JUSTE LORES
DE PEQUIM

O governo chinês quer lançar até o final deste ano um canal de televisão com 24 horas de notícias para apresentar "a voz chinesa ao mundo".
Tratada como segredo de Estado, a chamada "CNN chinesa" faz parte de um plano de US$ 7 bilhões que prevê, além do canal, o dobro de escritórios internacionais para a agência estatal Xinhua (chegará a 200) e um novo diário em inglês.
Nas últimas três semanas, jornais americanos têm publicado anúncios da futura "CNN chinesa" buscando candidatos a vagas. "Inglês nativo, habilidade de repórter, boa saúde, disponibilidade para viajar muito e trabalhar longas jornadas, salário competitivo", diz um dos anúncios.
Estima-se que pelo menos cem jornalistas americanos, britânicos e australianos participem da empreitada, principalmente frente às câmeras, junto a jornalistas chineses que tenham vivido muitos anos no exterior.
O projeto bilionário faz parte de uma política do presidente chinês, Hu Jintao, que disse há dois anos que "a voz da China deve ser mais bem ouvida em assuntos internacionais". A rede estatal CCTV lançou em 2008 canais em espanhol e francês e lançará no segundo semestre de 2009 canais em árabe e russo.
A primeira ação internacional da CCTV foi com seu canal em inglês, criado em 2000.
"A força da nossa voz não se compara com nossa posição no mundo", diz Yu Guoming, vice-diretor da Faculdade de Jornalismo da Universidade Popular de Pequim, um dos consultores da "CNN chinesa".
"Até agora tivemos resultados ruins, admito, pois nossos canais não alcançam o desejo de equilíbrio que é demandado pela audiência ocidental."
Com 10 mil funcionários e uma nova sede orçada em US$ 1 bilhão, a CCTV tem sido criticada em público por manipular as notícias e pela baixa qualidade de sua produção.
"É natural que uma potência global em alta aspire a aumentar seu "soft power" [poder de influência] com maior voz na arena internacional", diz o pesquisador francês Nicholas Bequelin, de Hong Kong.
"A diferença é que o governo chinês e o Partido Comunista ainda exercem forte controle das notícias e informação. Será que o canal pode competir com CNN e BBC? Ou sua busca pela audiência internacional pode levar as regras de censura a começarem a ser mais relaxadas?", pergunta.

Censura e credibilidade
Em tempos de crise na mídia comercial em diversos países ocidentais, TVs e jornais em inglês mantidos por ditaduras com ambições globais vivem um inesperado auge.
O Irã lançou nos últimos dois anos três diferentes canais de televisão, dois em árabe e um em inglês, a PressTV, com noticiário seguindo os pontos de vista de Teerã, mas com a linguagem televisiva da CNN.
A agência estatal chinesa de notícias, Xinhua, que já conta com cem escritórios internacionais, tem planos de expansão para chegar até 186 representações no exterior até 2010.
O jornal "Global Times", mantido pelo Partido Comunista chinês e que se especializa em política internacional, vai lançar sua edição em inglês no mês que vem.
Com 1,1 milhão de exemplares diários, a versão original chinesa é a mais agressiva e nacionalista voz da imprensa chinesa. O que pode mudar na versão para o inglês para atrair uma audiência internacional?
A Folha conversou com dois jornalistas envolvidos nos projetos. Eles ainda não sabem se a liberdade editorial será maior. Um deles compara com a célebre emissora do Catar.
"Apesar do ponto de vista muçulmano, a Al Jazeera, por exemplo, sempre entrevista israelenses, mesmo que os apresentadores sejam duros com eles. Não dá para imaginar que aqui se permita entrevistar quem defenda a independência do Tibete."


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