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Papa encontra Igreja Católica em crise na 1ª visita aos EUA
Fechamento de paróquias e escolas, indenizações milionárias por escândalos e mudanças no perfil do fiel esperam Bento 16
Líder religioso chega hoje para viagem de cinco dias, em que se encontra com Bush, fala na ONU e celebra missas em dois estádios
SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON
Quando pisar na base aérea
Andrews, em Maryland, Estado
vizinho a Washington, às 16h
locais de hoje, e avistar os protestantes George W. e Laura
Bush esperando-o na pista,
Bento 16 encontrará também
um número recorde de igrejas
católicas sendo fechadas por
falta de dinheiro e fiéis e escolas religiosas deixando de funcionar por falta de alunos.
Terá de enfrentar a questão
das indenizações causadas pelo
escândalo de abusos sexuais de
menores por padres, que já custam aos cofres do Vaticano entre US$ 1,5 bilhão e US$ 2 bilhões. E será obrigado a lidar
com a mudança drástica no
perfil do católico local, após a
ascensão dos latinos, fatia da
população que é a maior vítima
do sentimento de xenofobia
que toma parte do país.
Nunca na história deste país
-no caso, os EUA- a Igreja Católica passou por crise tão pronunciada e duradoura quanto a
que recebe Bento 16 em sua primeira visita como papa. Talvez
por isso o líder religioso tenha
definido a viagem como "missionária": ele terá a missão de
reagregar a igreja e redefinir os
rumos da terceira maior população católica do mundo.
A começar pela evasão de
fiéis. Segundo levantamento do
Pew Research Center, 31,4%
dos americanos dizem ter sido
criados como católicos, mas
apenas 23,9% continuam sendo na vida adulta. "Nenhuma
outra grande religião nos EUA
teve perda maior nas últimas
décadas", conclui o estudo, feito por ocasião da visita do papa.
A média só prossegue inalterada por conta do aumento da
porcentagem de latinos (principalmente mexicanos), que
hoje respondem por um terço
dos católicos do país. Isso mudou o perfil socioeconômico do
católico local, tornando-o mais
conservador e com menos
afluência financeira, e deslocou
o centro de gravidade do nordeste do país para o sudoeste.
"O papa está atento ao fato de
que parte de sua audiência é de
católicos hispânicos muito
preocupados com o crescente
sentimento de hostilidade em
relação à imigração", disse Timothy Samuel Shah, especialista em religião do instituto de
política externa Council on Foreign Relations, de Washington. "Estou certo de que ele tocará no assunto."
Portas fechadas
Com as mudanças, muitas
igrejas e escolas católicas tradicionais fecharam as portas em
cidades como Nova York e Boston. Mais de 800 paróquias encerraram as atividades desde
1995. Duas em cada dez das que
estão abertas hoje não contam
com padres residentes. E o número de padres ordenados hoje
é metade do de 1965.
Com menos igrejas, há menos doações -o que afeta também as escolas, que têm 30% de
seus custos bancados pelas
ofertas dos fiéis. Desde 2000,
mais de 1.200 delas deixaram
de funcionar, segundo a Associação Nacional de Educação
Católica, o que derrubou o número de estudantes (2,3 milhões) e colégios (7.500) à metade dos totais da década de 60.
Apesar de as doações dos fiéis
estarem estacionadas em US$ 9
bilhões por ano nos EUA, a
igreja sofreu um grande baque
financeiro e moral por conta da
sucessão de denúncias de abuso sexual de menores por padres, detonada em 2002, em
Boston. Segundo relatório de
2004, foram pelo menos 10,7
mil casos contra 4.400 dos 110
mil padres então em atividade.
O papa deve falar do assunto
em missa na sexta e, segundo
rumores não negados pelo embaixador do Vaticano em Washington, Pietro Sambi, poderia
haver até um encontro de Bento 16 com vítimas. Será grande
a reação, dentro e fora da igreja,
se o líder evitar a questão.
"A Igreja Romana é impregnada de simbolismo", escreveu
o padre Emmett Coyne, da progressista Cross International
Catholic Outreach, sobre o assunto. "A visita de Bento 16 aos
EUA deveria acontecer em vestes púrpuras, vermelhas ou
pretas, cores de penitência -e
não nas triunfais amarelas ou
douradas."
Nos cinco dias que passa no
país, Bento 16 é recebido por
Bush, celebra missa em estádios em Washington e Nova
York, visita o Ponto Zero, encontra-se com representantes
de outras religiões e, na sexta-feira, fala à ONU.
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