São Paulo, terça-feira, 15 de maio de 2007

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Sarkozy convida líder da rebelião de 1968

Médico, socialista e ex-líder grevista Bernard Kouchner pode assumir Ministério das Relações Exteriores

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A PARIS

Nicolas Sarkozy, eleito presidente da França prometendo enterrar o que resta, se é que resta, do espírito rebelde de Maio de 1968, está para incluir em cargo estratégico de seu governo um líder estudantil desse período turbulento. Trata-se do hoje médico Bernard Kouchner, que há 40 anos chefiou o comitê de greve da Faculdade de Medicina de Paris.
O convite a Kouchner para ser chanceler vazou de fontes não-identificadas do círculo do presidente eleito, por intermédio da agência France Presse, e tornou-se o assunto principal do noticiário, na antevéspera da posse de Sarkozy, amanhã.
Ocorre que Kouchner é muito mais que ex-líder estudantil. Foi inicialmente do Partido Comunista, passou para o Partido Socialista, fundou a ONG Médicos sem Fronteiras e participou ativamente da campanha presidencial da também socialista Ségolène Royal.
Se for de fato convidado -e aceitar-, quebrará a marca de direitista empedernido com que Sarkozy era visto em quase todos os comentários, antes e durante o período eleitoral.
Convém de todo modo ser cuidadoso com a informação. Fora as habituais "fontes" não identificadas, ninguém a confirmou nem no QG de Sarkozy nem do lado de Kouchner. Além disso, no fim de semana já havia vazado a informação de que outro esquerdista, Hubert Védrine, havia sido sondado para o mesmo ministério.
Tanto Védrine como Kouchner foram ministros no governo do socialista Lionel Jospin.
Mais segura é a informação de que um terceiro socialista, Claude Allègre, ministro da Educação com Jospin, estaria "pronto a aceitar uma missão, limitada no tempo, para ajudar a universidade francesa", segundo o jornal "Le Parisien".
Se de fato Kouchner for para a chancelaria, é pouco provável que Sarkozy se torne aliado incondicional de Washington, ao contrário do que diz, até agora, a maioria dos comentários.
Não que Kouchner seja antiamericano. Mas ele, durante o período prévio à invasão do Iraque, usava como lema "nem Saddam nem guerra", ao contrário do que acabou sendo a política de Washington. Mais: Kouchner é conhecido pela defesa da tese de que ditaduras, em qualquer parte do mundo, não devem ser protegidas pelo princípio da não-intervenção em assuntos de outros países.
O suposto ou real convite a socialistas está causando na França o inverso do que o então presidente brasileiro Fernando Collor disse que provocaria, ou seja, "indignação na direita e perplexidade na esquerda".
De fato, a esquerda está tão indignada que todos os seus integrantes que conversam com Sarkozy já são preventivamente rotulados como traidores. A direita não esconde sua perplexidade, embrulhada em ironia. Patrick Devedjian, braço direito de Sarkozy e ministeriável, aplaudiu a abertura a outros grupos políticos, mas pediu que ela fosse "longe, bem longe, para incluir até os sarkozystas".


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