São Paulo, segunda-feira, 15 de junho de 2009

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ANÁLISE


Pleito traz indícios sombrios, mais ao Irã que ao Ocidente

No âmbito interno, governo Ahmadinejad oprimiu população e freou desenvolvimento; mas a política nuclear e uma eventual aproximação dos EUA são decididas pelo aiatolá


ADRIAN HAMILTON
DO "INDEPENDENT"

Este não é um bom momento para o Irã. Certamente não é um bom momento para os iranianos que queriam a liberalização de sua sociedade. E não é um bom momento para aqueles que esperavam por um dia em que um presidente americano de mentalidade mais aberta pudesse encorajar o país a sair do isolamento e suspender suas atividades nucleares.
Mas este tampouco é o momento de impormos ao Irã os desejos de um mundo externo que gostaria que a eleição tivesse sido diferente.
A última vez em que um candidato presidencial vencera por margem tão grande numa eleição iraniana foi em 1997, quando um reformista, Mohammad Khatami, foi eleito por mais de 70% dos votos. Como Mahmoud Ahmadinejad desta vez, Khatami foi reeleito quatro anos mais tarde por uma margem ainda maior, apenas para se tornar inoperante em seus últimos anos no cargo pela autoridade dos clérigos conservadores e do líder supremo, o aiatolá Ali Khamenei.
Será que essa última eleição, então, faz parte do padrão pelo qual progressistas ocasionalmente são autorizados a ter voz, mas nunca a ameaçar o sistema? É o que pensam reformistas e observadores ocidentais, após um pleito em que os resultados parecem uniformes demais para serem dignos de crédito.
Quer a contagem dos votos tenha sido fraudada ou não -e vale recordar que Ahmadinejad tem considerável base de apoio entre os pobres e a linha dura-, o fato de que os reformistas obtiveram uma parcela tão pequena dos votos deixa seus partidários gravemente insatisfeitos. Houve energia demais na campanha para que o aiatolá Khamenei agora diga que os partidos reformistas devem recuar e aceitar "o veredicto da maioria".
Isso não quer dizer que o mundo em geral esteja diante de um país mais hostil ou mais implacável do que antes. A política em relação ao desenvolvimento nuclear e as respostas à mão estendida por Obama não são decididas pelo presidente do Irã, mas pelo aiatolá.
A eleição traz maus agouros ao próprio Irã. Sob Ahmadinejad, o país se tornou mais opressor e mais incompetente na administração da economia. O custo de uma política que bloqueou investimentos, freou o desenvolvimento e restringiu os mercados é pesado e ficará mais ainda, a não ser que acorram mudanças reais.
Uma década atrás, os reformistas pensaram que tinham inaugurado um novo começo com Khatami, apenas para sofrerem uma desilusão e se introverterem. O Irã está mudando, por conta de fatores demográficos, educacionais e de comunicações. Talvez desta vez seja diferente. Uma vez deslanchado, o ímpeto por transformações pode ser irrefreável.
Assim, mais uma vez, o Ocidente se vê diante de um dilema que opõe seus princípios a seus interesses. Seus princípios podem exigir que conteste o pleito no Irã. Seus interesses o aconselham a tratar com quem quer que esteja no poder. Seria conveniente fazê-lo. Todas as esperanças e expressões de apoio do mundo externo não ajudaram os reformistas nesta ocasião. E é pouco provável que o façam depois dela.


Tradução de CLARA ALLAIN


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