São Paulo, quinta-feira, 15 de julho de 2010

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Após euforia, cubanos enfrentam limbo

Ex-presos políticos enviados à Espanha ainda não têm destino definido; outros dois chegaram ontem ao país

Eles dormem em albergue afastado da cidade e ainda não têm documentação legal para residir na Europa


LUISA BELCHIOR
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE MADRI

Depois de sorrisos, discursos contidos e poucas críticas a Havana, os ex-presos políticos de Cuba enviados à Espanha despertaram ontem sob uma espécie de limbo: sem documentação, sem casa e quase sem pertences.
Hospedados em um albergue na beira de uma autoestrada, onde ficarão até pelo menos o fim da semana, os dissidentes reclamaram de uma liberdade cerceada que vivem em Madri e criticaram a forma "autoritária" com que deixaram o país.
"Foi uma saída autoritária. Saí da prisão direto para o aeroporto. Não passei em casa e só encontrei minha família dentro do avião. Não nos deram nenhum documento, não temos telefone e não sabemos nem se vamos ficar em Madri", declarou o jornalista Omar Rodríguez, que chegou ontem à Espanha com o também ex-preso Normando Hernández, acompanhados de mulher e filhos.
Foram levados para o mesmo albergue onde já estava a primeira leva de sete dissidentes, no meio de um polígono industrial no subúrbio de Madri, a 15 km do centro. Lá, eles passaram o dia à espera de uma posição da Espanha e das ONGs encarregadas de sua inserção social.
O governo espanhol enfrenta um desafio jurídico para regularizar a situação dos cubanos. Isso por a lei exigir ao menos três anos para conceder a imigrantes visto de residência permanente, a não ser em casos de reagrupamento familiar, asilo, refúgio ou imigração laboral.

INTERESSE NACIONAL
O Ministério dos Assuntos Exteriores espanhol decidiu ontem carimbar o passaporte dos cubanos com a condição de "interesse nacional", que consta na lei de estrangeiros, até conceder-lhes vistos.
"Não concordo. Sou refugiado político, fui sequestrado pelo meu governo em casa. Agradecemos ao [presidente de governo espanhol, José Luis Rodríguez] Zapatero, mas quero que ele nos dê esse status", disse o jornalista Normando Hernández.
Já Rodríguez disse que, apesar de haver optado por migrar, se sente "expulso". "Minha preferência é ir a Cuba. Nos forçaram a sair", diz.
Ele disse que foi levado da prisão para o avião, onde encontrou a família. "Não deu tempo nem de fazer malas", disse o filho dele, Osmani Rodríguez, 21. "Não deixaram que nos despedíssemos de outros familiares, amigos e vizinhos", disse Hernández.
Ontem, Guillermo Fariñas, recém-saído de quatro meses de greve de fome, chamou a medida de "jogada feita com o consentimento de Fidel Castro, que está lúcido". Mas disse que a libertação é uma "janela que se abriu".
Os cubanos também percebem entraves na nova vida, como a busca por trabalho em um país que fechou 2009 com mais de 20% da população desempregada.
Além disso, alguns se disseram surpreendidos com a hospedagem. "Comparados à prisão em Cuba, são um palácio, mas os quartos são quentes e sem ventilação", disse Omar Hernández.


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