São Paulo, segunda-feira, 15 de agosto de 2011

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ANÁLISE

Crise representa golpe mais intenso aos EUA em uma geração

MATIAS SPEKTOR
ESPECIAL PARA A FOLHA

Se um líder sempre precisa de seguidores, então os Estados Unidos enfrentam um enorme desafio. A crise das contas públicas, a economia abalada e o fiasco das intervenções no Iraque e no Afeganistão representam o golpe mais intenso à reputação americana em uma geração.
A grande perdedora é a concepção de ordem global criada há 30 anos: a revolução de Ronald Reagan e Margareth Thatcher. É a crença na superioridade moral da democracia liberal e da economia de mercado. Na autorregulação do setor privado.
É a substituição da política de poder entre as grandes potências, típica da Guerra Fria, por novas formas de governança: União Europeia, Protocolo de Kyoto, Nafta, Corte Penal Internacional ou Liga das Democracias.
A responsabilidade de proteger cidadãos contra governos brutais em Ruanda ou na Líbia. A criação de neo-protetorados para governar Kosovo, Haiti ou Timor Leste.
Os EUA eram a nação "indispensável". Quem resistisse estaria "do lado errado da história" (Reagan), "fora da lei" (Clinton) ou num "eixo do mal" (Bush).
O sistema agora mostra rachaduras. Nos últimos 30 anos, não resolveu problemas de clima, proliferação nuclear, desigualdade e violência.
Sem uma narrativa convincente, é difícil resolver problemas que demandam cooperação. Um retorno à política do clube das grandes potências, agora dos países emergentes, não é garantia de sucesso. Outra implicação geopolítica é o fim do consenso sobre a organização interna das sociedades nacionais.
As erupções espontâneas em Cairo, Tel Aviv, Damasco, Atenas, Madri, Londres e Santiago do Chile ilustram o ponto. A onda de manifestações é positiva. Mas pode produzir reações conservadoras e limitar o estreito espaço de cooperação entre as nações.
Existe também a tentação de subestimar o papel dos EUA no mundo que virá. Seria um erro. Depois da grande crise de 1930, os americanos ganharam a Segunda Guerra e produziram a IBM.
Depois da crise de 1970, venceram a Guerra Fria e inventaram Apple e Microsoft.
Na ausência de um projeto convincente, eficaz e compartilhado, há limites muito estreitos para a produção de um sistema internacional estável, justo e afluente.

MATIAS SPEKTOR é doutor pela Universidade de Oxford e coordenador de Relações Internacionais da FGV


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